Cristina recebe do marido uma Argentina assombrada pela
inflação, mas com boas chances de sucesso econômico
Thomaz Favaro
Juan Mabromata/AFP |
Nestor passa o bastão presidencial para sua mulher, Cristina: herança controversa |
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A Argentina empossou, na semana passada, a segunda presidente de sua história. Cristina Kirchner recebeu de seu marido, Nestor Kirchner, o bastão presidencial, depois de vencer com folga as eleições de outubro. O país que Nestor entregou a Cristina está em muito melhor estado do que aquele que ele recebeu. Eleito na ressaca política causada pelo colapso econômico, financeiro, social e político de 2001-2002, ele assumiu com um quarto da população sem emprego e mais da metade abaixo da linha de pobreza. Hoje, o país goza do menor índice de desemprego dos últimos quinze anos, a população pobre caiu para 27% e a economia cresce num ritmo próximo de 9% ao ano. A herança, no entanto, inclui o populismo econômico de Kirchner, com medidas como congelamento de preços e limitação das exportações para camuflar a segunda maior inflação da América do Sul – atrás apenas da do país de Hugo Chávez.
É pouco provável que uma troca de cargos entre marido e mulher signifique mudanças radicais no rumo da economia argentina – mas já se sente uma lufada de ar fresco na Casa Rosada, a sede oficial da Presidência argentina. O presidente Kirchner fez um favor a sua esposa ao tomar algumas medidas impopulares, mas necessárias. Ele descongelou as tarifas no setor de transportes públicos, que terão aumentos de até 30% no início do ano que vem. Esse setor não sofria reajustes desde 2002. A medida alivia as contas públicas, já que, sem aumentos no preço das passagens, o governo era obrigado a subsidiar o transporte. "Sozinha, essa medida não significa uma ruptura com as políticas anteriores, mas é sem dúvida um passo na direção correta", disse a VEJA o argentino Fausto Spotorno, economista-chefe da consultoria Orlando J. Ferreres e Associados, em Buenos Aires. Para os próximos dois meses estão agendadas renegociações tarifárias de três setores: eletricidade, água e gás domiciliar.
A nova presidente saiu, na semana passada, em busca de uma rápida solução para outro velho problema. Cristina reuniu-se com o FMI para renegociar a dívida de 6 bilhões de dólares que a Argentina tem com o Clube de Paris, grupo de dezenove países ricos que faz empréstimos a nações em desenvolvimento. "Ainda não houve acordo, mas o governo já demonstrou empenho em resolver esse impasse logo", diz Dante Sica, ex-secretário de Indústria. Há boas chances de que 2008 seja um excelente ano para a Argentina. As mudanças políticas (incluindo as conversas com os credores) podem voltar a atrair investidores estrangeiros, afastados pelo populismo de Kirchner. Para ajudar, o preço dos grãos – o principal produto de exportação do país – está em alta, com boas previsões devido ao aumento do consumo na China e na Índia. Cristina assume com céu de brigadeiro.