Entrevista:O Estado inteligente

domingo, dezembro 16, 2007

Alberto Tamer

Inflação, desafio que ressurge


Um fantasma ressurge e começa a rondar a economia mundial: é a inflação, que inesperadamente ganhou impulso nesta semana. Não assusta ainda, mas já preocupa, pois dificulta uma redução dos juros para estimular o crescimento e limita a ação dos bancos centrais para debelar a crise imobiliária.

Esse retorno da inflação não parece um fenômeno local, mas generalizado. Na sexta-feira, o Departamento do Comércio surpreendeu a todos anunciando uma inflação de 4,3% anualizada em novembro, no mesmo dia em que a zona do euro confirmava 3,1% - o índice mais alto dos últimos seis anos. Era de 2,6% no mês anterior.

Poucos dias antes, era a vez da China anunciar uma inflação de 6,9%, apesar do congelamento dos preços de alguns produtos essenciais. No Brasil, a inflação já chega 3,69% neste ano, até novembro, e fica em 4,19%, nos últimos 12 meses. É um sinal de risco para o qual o Banco Central já alertou.

PETRÓLEO, ELE DE NOVO

No caso dos EUA e da China, a inflação veio associada a um aumento da demanda interna, na zona do euro, não. Nos três casos, a causa principal apontada, sem dúvida, é o preço do petróleo, que, mesmo tendo recuado dos US$ 100, continua acima de US$ 90 (pela primeira vez os alimentos ficam em segundo lugar). Ontem, ele teve um ligeiro recuo com a Opep alertando para redução da demanda, provocada pela desaceleração econômica. Mas, mesmo assim, o preço continua pressionado pelo inverno vigoroso no hemisfério norte e pelo consumo crescente da China, com uma economia ainda superaquecida.

Mesmo a US$ 94, o preço do petróleo já aumentou nada menos que 21,4% em 12 meses. É muito, e agora os indicadores de inflação confirmam o que esta coluna havia alertado há dois meses, quando se iniciou a explosão dos preços do petróleo. Nenhum aumento de produtividade pode compensar um petróleo a mais de US$ 90.

E é só o começo. Vamos ter petróleo muito caro ainda por muito tempo e pressões inflacionarias também.

No Brasil, temos petróleo, mas a Petrobrás pratica o preço internacional - daí a curiosa alegria do seu presidente... -, isto é, mesmo produzindo em média a US$ 7,50 o barril, cobra e repassa em reais para a maioria dos derivados o preço médio de US$ 90.

Temos petróleo, sim, mas vamos pagar o mesmo altíssimo preço que o mundo paga. A nossa inflação não vai poder escapar, principalmente agora com o uso mais intensivo de óleo nas termoelétricas.

BANCOS CENTRAIS DESAFIADOS

O ressurgimento da inflação representa um sério desafio aos bancos centrais, principalmente europeu e americano - e o nosso também. Eles ficam com as mãos amarradas quanto a uma redução da taxa básica de juros para acalmar o mercado financeiro e promover o crescimento; isso representaria um estímulo à demanda, já aquecida, apesar da crise. Nos EUA, a ocupação das indústrias já passa de 81% e a demanda interna, que gera mais de 70% do PIB, simplesmente dobrou. O preço da gasolina aumentou em nada menos que 9,3%, mas não conteve a expansão do consumo. Ou seja, americanos e europeus - e nós, brasileiros, também - estão tendo dinheiro para gastar mais com seus carros e comprar mais; alimento é combustível fácil para a inflação, que já está aqui, agora, entre nós.

E pensar que no início do ano o próprio Ben Bernanke, a OCDE e até o FMI persistiam em afirmar que a crise imobiliária teria repercussões limitadas sobre o mercado financeiro...

Felizmente, até agora, no decorrer de todos esses meses turbulentos, a economia mundial continua suportando bem o impacto da restrição de crédito e nenhuma tragédia financeira se arma no horizonte.

NO BRASIL É MAIS COMPLICADO

O nosso Banco Central enfrenta o mesmo desafio do americano e europeu, com agravantes. Já deixou claro que vai interromper - se é que já não interrompeu - o ciclo de redução de juros para evitar mais pressão inflacionária. E seremos felizes se não tivermos de voltar a aumentá-los num futuro que pode estar não muito distante.

O caso do Brasil é mais sério do que nos EUA e na Europa, por vários motivos:

1 - Aqui o mercado consumidor interno é novo e, na falta de expansão maior para os mercados externos - mais exportações -, é ele que está sustentando esse magnífico crescimento de 5,7% no último trimestre.

2 - Um juro elevado atrai mais investimentos financeiros - ações, títulos, etc. -, internando mais dinheiro em busca do maior rendimento que estamos oferecendo.

3 - Com mais oferta de dólares no mercado, maior é sua desvalorização e maior a valorização do real.

4 - Um real forte diante do dólar ou mesmo de uma cesta de moedas (apesar da valorização do euro) prejudica as exportações industriais; as de commodities agrícolas e minerais são em parte compensadas pelo aumento das cotações externas. Ao mesmo tempo, estimula importações e desestimula exportações.

Mas o Banco Central reafirma que seu papel é combater a inflação e suas causas, não especificamente prover crescimento num cenário tenso (o que descrevemos), que está gerando forte pressões sobre os preços.

A conseqüência é juro alto e dólar valorizado, que, somados à brutal carga tributária - mesmo sem a CPMF! - e à infra-estrutura deficiente, podem desestimular a produção.Mas tudo isso se projeta para um cenário mais distante, nada dramático, que preocupa, sim, e para o qual devemos nos preparar.

Em resumo, é isso o que os acontecimentos desta semana projetam sobre um Brasil feliz com seu extraordinário aumento do PIB, do emprego formal e do consumo interno estimulado principalmente por um crédito caro, mas fácil de obter.

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