O Estado de S.Paulo
Quando ouço falar em reforma política, financiamento público de campanhas, voto em lista e fortalecimento dos partidos, me lembro de 1983, nos estertores da ditadura brasileira, quando fui morar na Itália. E me maravilhei com o que me pareceu um quadro partidário ideal em uma democracia plena, que para nós ainda era um sonho distante.
Os partidos pareciam representar fielmente todo o espectro político da sociedade, com a conservadora Democracia Cristã, o Partido Socialista, de centro-esquerda, o respeitado Partido Comunista, de Enrico Berlinguer, e nos extremos, a direita nacionalista do Movimento Social Italiano, e o Partido Radical, de Marco Panella, pelo "liberou geral".
Funcionava tão bem, com alternância no poder, eleições democráticas e respeito às minorias, que o país havia se tornado uma "partitocracia", reclamava um amigo romano. O mastodôntico Estado italiano, com sua vasta burocracia e inúmeras estatais, era totalmente aparelhado pelos partidos, de acordo com sua representação no governo. O melhor, ou pior exemplo, eram as três redes da TV estatal: a RAI 1, a mais rica e importante, era entregue de porteira fechada ao partido no poder. A RAI 2 se tornava um feudo dos aliados, e a RAI 3, com orçamento menor, era dada à oposição. Cada uma tinha seus telejornais, com as suas versões e opiniões, e sua programação privilegiando companheiros, afilhados e aliados. Todos ficavam felizes, menos os italianos, que pagavam a conta.
Anos depois, a Operação Mãos Limpas tirava da cena política e botava nas páginas de policia muita gente de todos os partidos. E o quadro partidário se decompôs e foi se deteriorando até chegar a Berlusconi, que tem o seu próprio partido, sua própria rede de televisão e seu próprio time de futebol. E pior: não há alternativas à vista para ele.
É o que me diz, desalentado, um amigo italiano, confessando a sua inveja da nossa democracia, de nossa estabilidade política e crescimento econômico.
Se ele soubesse quantos são e o que são os nossos partidos, de quem são e que interesses representam, teria saudades da "partitocracia" italiana dos anos 80.
Entrevista:O Estado inteligente
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