Entrevista:O Estado inteligente

domingo, dezembro 02, 2007

Um ano para a paz

Quando menos se espera, brincam os brasileiros, é que nada acontece mesmo. Perdidas as contas de quantas vezes israelenses e palestinos se sentaram uns diante dos outros para aplainar os seus milenares antagonismos, ou meramente para tentarem se entender sobre como fazê-lo, ninguém poderá ser acusado de "fracassomaníaco" se apostar que a chamada Conferência de Annapolis apenas terá servido para manter a escrita desse que carrega a infausta distinção de ser o mais intratável dos conflitos internacionais do mundo contemporâneo - e da história do mundo. Mas também se diz no Brasil que a esperança é a última que morre - e a essa palha se agarram os sobreviventes dos sucessivos naufrágios da busca de uma paz justa e duradoura entre árabes e judeus.

Na sua mais recente versão, o encontro de terça-feira promovido pelos Estados Unidos entre o primeiro-ministro israelense, Ehud Olmert, e o presidente palestino, Mahmud Abbas, naquela cidade vizinha a Washington, diante de representantes de 49 países, a busca da paz tomou a forma da retomada do processo denominado Mapa do Caminho, a iniciativa multilateral de 2003 que parecia arquivada. Atendendo o presidente Bush, a dupla assumiu o compromisso de iniciar negociações imediatas, sob supervisão americana, para um acordo final no prazo não superior a um ano. O estabelecimento, à última hora, de uma data visível no horizonte, a que Israel resistia, foi saudado pelos otimistas como um passo significativo. "O prazo aumenta o custo do malogro", comentou o chanceler Celso Amorim.

Tão ou mais significativa foi a presença, em Annapolis, do chanceler da Arábia Saudita, príncipe Saud al Faiçal, além de um enviado de segundo escalão do governo da Síria, aos quais Olmert se dirigiu diretamente em dado momento de seu discurso - um fato inédito, no caso do saudita. A monarquia de Riad jamais verteu lágrimas autênticas pelos padecimentos palestinos. A sua oposição à existência de Israel sempre foi puramente religiosa - o Estado judeu como profanação do Islã. Em 2002, no entanto, o príncipe regente Abdullah fez a Liga Árabe aprovar um plano de paz a que, previsivelmente, o então líder israelense Ariel Sharon deu as costas. Agora, ressoou a declaração de Faiçal em favor de conversações de paz também entre Israel e a Síria e o Líbano.

Vinda de um ator-chave no cenário do Oriente Médio, trata-se, a rigor, de um desafio aos Estados Unidos. Os sauditas estão longe de ignorar que o sujeito oculto do evento de Annapolis era o Irã. Antes tarde do que nunca, a catástrofe iraquiana alertou os americanos para a quase impossibilidade de se lançarem a um confronto unilateral com o regime xiita de Teerã a fim de impedir que o presidente Mahmoud Ahmadinejad ponha as mãos numa bomba atômica - o que tira o sono dos sunitas da Arábia não menos do que o dos israelenses. Hoje em dia, no entanto, nenhum governo da esfera islâmica ousará dar as suas bênçãos à neutralização da presumível ameaça iraniana enquanto perdurar a ocupação da Palestina. Ainda mais depois que parte dela, a Faixa de Gaza, passou para o controle dos radicais pró-Irã do Hamas.

Para dizer o óbvio, os Estados Unidos são a única força política no mundo capaz de levar israelenses e palestinos à coexistência em dois Estados viáveis, seguros e legitimados - supondo que isso seja possível. Só que, ao se mostrar como quem toma o pião na unha, o presidente Bush está sete anos atrasado. Depois do fracasso da reunião de Camp David entre Ehud Barak e Yasser Arafat, quando o governo Clinton já caminhava para o fim, a Casa Branca fechou de vez as portas à causa palestina. Em seguida ao 11 de Setembro, Bush apoiou Israel mais do que qualquer dos seus antecessores e quaisquer que fossem as violências do governo Sharon nos territórios ocupados. Talvez nem agora tenha caído em Washington a ficha de que a prioridade da política externa da superpotência só poderia ser a paz entre árabes e judeus - porque nada mais essencial do que isso para o combate ao terrorismo.

Em tese, haveria um ponto de partida. Meses depois de Camp David, israelenses e palestinos voltaram a conversar, com menos holofotes e mais resultados, no balneário egípcio de Taba, em fins de 2000. E nunca antes estiveram tão próximos de um acordo.

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