Hoje, com exceção das tarefas mais rudimentares, a escassez se espraia - e não poderia ser diferente. Com uma agilidade reconhecida por todos aqueles familiarizados com a questão, no País e no exterior, a empresa brasileira incorporou, em muito menos tempo do que se imaginaria, as transformações tecnológicas, de métodos e procedimentos, que revolucionaram o mundo do trabalho desde as últimas décadas do século passado. Além disso, a abertura dos mercados foi decisiva para estimular a iniciativa privada a buscar os ganhos de produtividade sem os quais estaria fadada a submergir na atual ordem global.
Mas, num cruel paradoxo, a cada passo esboçado para a modernização dos processos, mais a inadequação do fator humano, por falta de preparo, fazia sentir o seu peso, travando a caminhada. Agora, o que se espera sejam os primeiros anos de um círculo virtuoso de desenvolvimento dá proporções de crise ao hiato entre demanda e oferta de profissionais habilitados.
O problema é duplo: pouca escola e má escola. Dos 96 milhões de brasileiros que formam a população economicamente ativa (PEA), a metade só tem o primeiro grau completo. E avaliação depois de avaliação demonstram que isso e nada é praticamente a mesma coisa. Nos níveis subseqüentes, como também se sabe, a expansão da matrícula contrasta violentamente com o retrocesso da qualidade do ensino em relação aos tempos em que era pequeno o acesso aos colégios e faculdades. Somem-se a isso as distorções da composição do contingente com curso superior completo (7% da PEA). No total de trabalhadores, a proporção de engenheiros é de 0,5%, uma insignificância perto da média mundial.
No Leste Europeu, um dos alvos da Vale para suprir suas deficiências de pessoal, "há mão-de-obra educada, fluente em duas, três línguas", observa Cíntia Magno, da diretoria de Recursos Humanos da empresa. De quantos brasileiros diplomados por faculdades se pode dizer o mesmo?
"A economia está demandando gente com mais escolaridade e há um déficit nessa questão", constata o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Armando Monteiro Neto. "Estamos diante de um quadro difícil." É mais grave do que isso. Para o crescimento econômico, a tragédia de há muito anunciada da educação brasileira é um obstáculo pior do que, por exemplo, a obsolescência da infra-estrutura física do País. Esta poderia ser superada com relativa rapidez se os governos fizessem as coisas certas.
Mas os resultados dos sucessivos testes de conhecimentos a que é submetida a população escolar indicam que a atual geração de alunos, em todos os níveis, não será melhor do que essas que estão aquém, de longe, dos requisitos da empresa nacional, a começar das suas áreas de ponta. Se não se tivesse permitido que essa barreira chegasse aonde chegou, sabe-se lá a que patamares se alçaria a capacidade de inovação da iniciativa privada brasileira.
Segundo um estudo do Fórum Econômico Mundial, citado pelo ex-ministro Delfim Netto em sua coluna no Valor, a produtividade do setor privado supera com folga a dos seus equivalentes russos e chineses, perdendo apenas, entre os Brics, para os indianos. Já na produtividade do Estado, o que inclui, evidentemente, a qualidade da educação pública, o Brasil oscila entre a 112ª e a 125ª posição - de uma lista de 125 países analisados.