Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, dezembro 12, 2007

Merval Pereira - O grande debate




O Globo
12/12/2007

A discussão sobre a prorrogação da CPMF, colocada pelo governo como matéria prioritária, e não sem freqüência de maneira dramática pelo próprio presidente Lula, que, por várias vezes nos últimos dias, elevou o tom de seu discurso, acusando os que são contrários de sonegadores e contrários aos pobres, teve pelo menos uma vantagem: colocou o tema da alta carga tributária e da incidência dos tributos indiretos no dia-a-dia da população no centro dos debates. Diversos estudos acadêmicos divulgados aqui na coluna e em diversos jornais mostraram que a CPMF, ao contrário do que o governo alardeia, atinge mais, proporcionalmente à renda, os que ganham menos.

A incidência indireta da CPMF no consumo transforma os 0,38% da alíquota em 1,3% para todas as faixas de renda. E, proporcionalmente, chega a 2,19% para os que ganham até dois salários mínimos, ficando em 0,96% para os que ganham mais de 30 salários, demonstrando sua iniqüidade. A posição do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso vem dando a direção da posição do PSDB.

Ontem no Rio, ele admitiu que a perda de R$40 bilhões poderá ser muito prejudicial ao governo, e orienta seu partido para que, caso consiga derrotar a prorrogação, reapresente uma proposta que beneficie mais a saúde e torne as alíquotas regressivas.

Essa controvérsia mexeu claramente com os leitores da coluna, e selecionei hoje alguns comentários sobre o assunto. A leitora Becki Spindel, mestre em matemática pela PUC do Rio de Janeiro, tem a mesma posição. Ela se mostrou "preocupada com a possibilidade de negociação do PSDB em cima de novas promessas para aprovação da CPMF".

Depois de criticar o presidente Lula, ela pergunta: "O que impede o PSDB de fincar o pé na sua posição, acenando em 90 dias com a aprovação de uma outra contribuição provisória, esta sim, vinculada às condições citadas (redução de gastos, desoneração da folha de pagamentos), além da redução progressiva já? O preço que o governo pagaria seria de dez bilhões de reais, pelos motivos acima citados, e tiraria o risco (será?) do uso do dinheiro da CPMF para inchaço da máquina pública (para fins eleitoreiros) com evidente incompetência gerencial. Do jeito que está a nossa democracia está em risco".

Já Pedro Martin, engenheiro, saiu em defesa da posição do governo, criticando o trabalho da economista da Fipe, Maria Helena Zockun publicado na coluna de ontem: "Você está simplesmente se valendo de um sofisma grosseiro nessa sua análise, que qualquer neófito pode perceber: A vida econômica de um país não se baseia apenas no consumo da cesta básica. Na sua análise, parece que a movimentação financeira num país do tamanho do Brasil não tem a menor importância. Se um trabalhador brasileiro compra um quilo de feijão por 3,25 reais, não importa quanto ele paga deste ou daquele tributo".

O que interessa, segundo ele, "é que agora, no governo Lula, ele está comprando mais quilos de feijão, pois o salário mínimo está crescendo, a renda das classes C e D está aumentando, o emprego e a construção de casas populares idem". O leitor atribui à "direita" a "falácia" de que a CPMF atinge mais os pobres.

O leitor Boanerges Aguiar Castro, embora considere "interessante" o estudo da professora Maria Helena Zockun, o chama de "manipulador", e defende que a desoneração de pessoas físicas e jurídicas pode ser feita em outros tributos, "mediante discussão ampla e aprofundada, e não a toque de caixa com a faca no pescoço do governo".

Outro leitor, Carlos Tahin, traz à discussão sobre os impostos indiretos uma visão irônica: "Apóio o movimento contra a CPMF, pois nós brasileiros já pagamos impostos demais e o pior é que a maioria nem tem noção de quanto. Nosso povo não tem idéia de como os mesmos impostos são cobrados inúmeras vezes até formar o preço final de um produto. Se o senhor der R$1,00 para um mendigo e ele for comprar um pãozinho com manteiga, na verdade o pobre homem está pagando por dois pãezinhos, e vai comer um só. Isto porque a diferença está na somatória de todos os impostos incluídos, que dá na prática mais de 50%". Ele está se referindo à tabela de incidência direta e indireta de impostos no consumo, que chega a 51% para os que ganham até dois salários mínimos.

É a mesma preocupação da leitora Vera Perestrello, que pergunta: "Qual seria o imposto que não incidiria no produto final aumentando seu preço para o consumidor? O Imposto de Renda ou o ISS não aumenta o preço dos serviços? O ICM não aumenta o preço das mercadorias? O IPVA não aumenta o preço dos transportes? Etc, etc... E todos esses aumentos não têm um peso muito maior para a classe de menor poder aquisitivo? Se isso é verdadeiro, porque colocar apenas em cima da CPMF a característica da injustiça social? Acho a retirada abrupta da CPMF uma temeridade que pode trazer muitas dificuldades ao desenvolvimento em geral e servirá, não ao povo como um todo, mas aos projetos políticos de alguns".

A preocupação da leitora tem razão de ser, já que a discussão da CPMF demonstrou que, na verdade, o que é preciso é fazer uma reforma tributária que não penalize os que ganham menos. O engenheiro aposentado Ivan Bustamante propõe dar-se "uma destinação justa e nobre para a CPMF, resolvendo, de forma satisfatória, os problemas financeiros do INSS e do SUS".

Ele sugere que a CPMF passe a ser "contribuição previdenciária sobre a movimentação financeira". Dessa maneira, segundo ele, "a CPMF seria redimida pela sua destinação e, mais ainda, deixaria de ser um imposto a mais, pois viria a substituir a atual cobrança de mais de 20% sobre os rendimentos da mão de obra de todos os trabalhadores do país".

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