O novo presidente do Congresso assume o cargo com
a missão de reverter a imagem negativa do Senado
Diego Escosteguy
Fotos álbum de família |
Garibaldi Alves em três tempos |
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O senador Garibaldi Alves Filho é um homem encantadoramente desajeitado. Natural do Rio Grande do Norte, ele já foi deputado estadual e governador do estado, antes de se eleger senador. É um tipo comum, sem cerimônia, que come pipoca no trabalho e usa caneta Bic. Até a tarde da última quarta-feira, Garibaldi se movia pelos corredores do Congresso no piloto automático, rumo ao fim de uma carreira política sem nenhum brilho especial. Na semana passada, contudo, essa figura improvável foi eleita com 68 votos a favor e apenas 8 contrários para suceder a Renan Calheiros na presidência do Senado Federal. Da noite para o dia, numa dessas conjurações que só a política pode proporcionar, o discreto Garibaldi tornou-se presidente do Congresso Nacional e o terceiro homem na linha sucessória da Presidência da República. De parlamentar inexpressivo, que desfrutou seus quinze minutos de fama quando relatou a CPI dos Bingos, em 2005, Garibaldi transformou-se num dos homens mais poderosos do país – pelo menos até o começo de 2009, quando se encerra seu mandato como presidente-tampão do Senado. Passa a ser dele parte da responsabilidade pela recuperação da imagem do Parlamento, destroçada após meses de sangria com o caso Renan Calheiros.
Recém-instalado no novo gabinete, Garibaldi Alves – Gary, para os íntimos (pronuncia-se "Guéri") – recebeu VEJA para uma entrevista na última quinta-feira. "Estou nervoso", confidenciou de pronto, olhando para o chão, numa simplicidade que chega a provocar desconfiança. Seguido por assessores, ele se pôs a caminhar pela ampla sala da presidência do Senado. Caminhar, não – arrastar-se. Gary tem um jeito próprio de se locomover: sempre devagar, deslizando com os pés apontados para dentro. Para cá e para lá. Para lá e para cá. Lentamente. Bem lentamente. "Estou nervoso", repete ele mais uma vez, agora se acomodando numa poltrona de couro preto no canto do gabinete. Como que intimidado pela imponência do cargo, Gary não se senta na cadeira de presidente do Senado. Parece não estar ainda à vontade. Aliás, ao comandar a sessão de votação da CPMF, ele mesmo se traiu ao fazer uma intervenção: "Senhor presidente, queira por gentileza... Ops!". Esqueceu que era ele o presidente. Apesar do ato falho, Gary conduziu com firmeza e tranqüilidade a nervosa sessão que enterrou a CPMF. Passou com louvor no batismo. "Mas o peso dessa cadeira é grande demais", admite, num tom de voz esticado que faz a frase parecer interminável.
Gary fala como anda. É lento. Sem pressa. Todo esse vagar produz frases notáveis. O que Gary pensa da reforma tributária, a grande discussão que deve ser travada de agora em diante? Ele pára, baixa os olhos, esfrega as mãos. Mira o chão. Parece pensar. Pensa mais um pouco. Responde: "A reforma tributária é um oásis, um sonho encantador, mas que, quando chega perto, não tem casamento". Como ele se define politicamente? Gary sorri e diz, espaçadamente: "I-xe, que per-gun-ta!". Pára. Hora de pensar de novo. Fita as mãos. Diz ele, finalmente, abrindo um sorriso triunfal: "Sempre fui muito ligado à Igreja". Gary sorri até mesmo quando está de cara fechada. Talvez daí decorram parte do ar desengonçado que lhe é peculiar e a raiz da simpatia que cultiva entre todos os parlamentares. Quando resolveu concorrer à presidência do Senado, Gary, que nunca primou pelo cuidado com a aparência – "Sou conhecido como deselegante"–, percebeu, aos 60 anos, que chegara o momento de dar uma repaginada no visual. Ao lado da mulher, Denise, correu a um shopping de Brasília e comprou cinco ternos. Passou a andar de unhas feitas e gel no cabelo. Rendeu-se à etiqueta do marketing político. Gary está tão disciplinado que entrou numa academia. Agora, depois de caminhar diariamente por quarenta minutos, ele estica a malhação e vai para a aula de pilates, espécie de alongamento reforçado. "Mas não está adiantando muito", reconhece, dando palmadinhas na barriga saliente.
Garibaldi Alves virou presidente do Senado por exclusão, já que não havia ninguém com um perfil melhor para ocupar o cargo no momento. Como o PMDB detém a maior bancada da Casa, por tradição a presidência cabe ao partido. Com medo de desgastar ainda mais o Congresso, a oposição preferiu ratificar o nome indicado pelo PMDB. O problema é que, dos vinte senadores do partido, quase todos têm ficha corrida. Garibaldi Alves, que é desajeitado mas não é bobo, foi buscar o apoio de um velho e influente conhecido, o senador José Sarney. Devagar, bem ao seu estilo, sobreviveu às duas últimas semanas na berlinda. As únicas acusações que surgiram contra ele envolvem suspeitas de desvio de recursos num programa de distribuição de leite, na época em que governava o Rio Grande do Norte. Se comparado à fúria do antecessor, o senador Garibaldi, felizmente, é bem mais devagar.