Paralelo a isso, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) propõe, as centrais sindicais apóiam e a sociedade se convocada em plebiscito aprovaria a redução da jornada de trabalho sem redução de salários. No lugar de 44, 40 horas semanais. Afinal, o Brasil está pronto e ninguém é de ferro.
Todo mundo quer o seu, não se aceitam sacrifícios. É o império da lei do esforço mínimo e da benesse máxima. Foi assim que, finda a ditadura, os constituintes de 1988 e os grupos de interesse criaram um Estado benfeitor que não cabia nos limites da realidade.
Países desenvolvidos não cresceram à sombra da lassidão nem a poder de água fresca.
Num cenário em que prevalece a cultura da facilidade, onde prepondera a mentalidade segundo a qual é possível aprender inglês dormindo e emagrecer comendo, a crença na reforma tributária pode ser incluída no plantel das ilusões do gênero.
Não vai acontecer tão cedo pelo mesmo motivo por que não aconteceu até agora: União, Estados e municípios não aceitam repartição de perdas, só distribuição de ganhos. Como o governo federal se recusa à tarefa de arbitrar o jogo, fica-se na mesma.
Ainda mais em ano eleitoral, em que o forte da cena não é o consenso, mas o contraditório. Em ambiente de disputa de poder não há concordância possível, ainda mais sobre tributos.
Contrariar os prefeitos, candidatos a prefeito, quem haverá de? Enervar governadores?
Ainda está para ser construída a mesa onde seria firmado esse acordo, bem como ainda não se apresentou ao País o líder capaz de gerenciá-lo e tirá-lo do papel.
Para mudar qualquer situação, a preliminar básica é que todos os jogadores estejam dispostos a ceder alguma coisa. Mas por aqui ninguém quer perder coisa alguma nunca. Daí a razão de tanta dificuldade para fazer reformas de verdade: a cultura da facilidade.
Quando se avançou no Brasil - para citar exemplos recentes, fiquemos na abertura da economia, na quebra de monopólios e na mais bem-sucedida das privatizações, a das telecomunicações -, o governo firmou uma ampla aliança congressual e arbitrou.
Quando se tentou criar grandes consensos sem eixo, o resultado foi a paralisia resultante do puxa-estica dos interesses localizados. Aí estão a complementação da reforma da Previdência (setor público), a reforma trabalhista, a reestruturação sindical, a reforma política, a tributária como exemplos de pendências que não se resolvem porque o governo não tem tutano para enfrentar a briga nem para administrar as contrariedades.
Os contrariados, por sua vez, o máximo que admitem para negociar é a segurança do direito adquirido. Ora, se todo mundo parte desse ponto, da garantia do que já lhe é assegurado, surpreendente seria se se conseguisse fazer qualquer coisa.
Não há história de ganhos sem perdas. Não há registro de pactos no mundo sem que os pactuantes deixem de lado uma parte do que lhes interessa. Não por outro motivo o conceito de pacto é desmoralizado entre nós.
Os poucos que se fizeram na cena recente - pela redemocratização, pela estabilidade da moeda - foram sempre contestados por alguma força que, dessa contestação, buscava tirar proveito.
O PT, com sua lógica sindicalista da reivindicação, evidentemente não é o melhor condutor de acordos que podem render ganhos no futuro, mas que no presente apenas socializam o prejuízo.
Não só por isso, mas também por causa disso, essa conversa toda no noticiário sobre medidas e negociações não passa de uma mímica por meio da qual se busca ganhar tempo para acomodar as contrariedades e achar uma forma de tirar o dinheiro do setor menos organizado da sociedade - ela própria, descontadas as corporações organizadas, sejam públicas, privadas, representantes do capital ou do trabalho.
Socorro à força
A Igreja Católica sempre foi muito próxima do PT, que teve dois embriões: os sindicatos e as pastorais. O discreto distanciamento entre os dois - visível depois da eleição de Lula - chega agora a um ponto bastante acentuado por causa da greve de fome de d. Luiz Cappio contra a obra de transposição das águas do Rio São Francisco.
O jejum completa 23 dias, há mais de 10 o Planalto acionou o secretário-geral da Presidência, Luiz Dulci, e o secretário particular do presidente, Gilberto Carvalho, para tentar convencer a CNBB a fazer o frei desistir. Esforço inútil.
Posto o impasse e convencido de que a Igreja faz do frei um símbolo em tempos de carências de causas, o governo estuda intervir na prestação de socorro ao religioso baseado na Constituição, que atribui ao Estado o dever de zelar pela inviolabilidade da vida dos cidadãos.