Veja - 20/08/2012
A Revolução Industrial transformou a Inglaterra na maior potência do século XIX. Por isso, a industrialização passou a ser vista como o meio para alcançar padrões superiores de desenvolvimento. Até hoje, "país industrializado" é sinônimo de país rico. Assim no século XX, a industrialização foi prioridade mundo afora. Ainda hoje, a ideia de que a indústria é o centro dinâmico da economia povoa muitas mentes, para as quais o setor é a base do crescimento. A ele caberia disseminar o progresso técnico, irradiando efeitos para a frente e para trás na cadeia produtiva.
Fala-se em desindustrialização nociva ao Brasil, mas vários estudos descartam a ideia. Regis Bonelli e Samuel Pessôa, em artigo publicado pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (2010), constatam o declínio da participação da indústria no PIB — de 36% em 1985 para 16% em 2009 —, mas mostram que se trata de fenômeno mundial. A nossa participação é que era excessiva, por causa do fechamento da economia. Recentemente, a indústria nacional tem sofrido perdas alarmantes de competitividade, mas a explicação básica é conhecida: salários acima da produtividade e piora do "custo Brasil" (sistema tributário caótico. legislação trabalhista anacrônica, infraestrutura deteriorada e burocracia excessiva).
A perda de participação da indústria em todo o mundo aumenta, naturalmente, a dos serviços, que é de quase 80% do PIB nos países desenvolvidos. No Brasil, os serviços saltaram de 53% do PIB em 1990 para 67% do PIB em 2011. Muitos se preocupam, pois acham que os serviços não geram ganhos relevantes de produtividade, que é a fonte essencial da elevação do potencial de crescimento. Esse raciocínio vale para serviços prestados aos consumidores, como os de cabeleireiro, motorista, empregado doméstico e semelhantes, mas não é sempre assim.
De fato, embora a indústria continue importante, os serviços assumirão a liderança que a ela pertenceu, na geração de empregos e produtividade, da Revolução Industrial até meados do século XX. Já é assim na economia americana, conforme provou Enrico Moretti, da Universidade da Califórnia em Berkeley, no livro The New Geography of Jobs (2012). Para ele, a geografia do emprego tem mudado profunda e irreversivelmente nos Estados Unidos. Os eixos de inovação em serviços são as novas engrenagens da prosperidade. Eles envolvem os setores de alta tecnologia: design e software de produtos como o iPhone e o iPad, tecnologia de informação, ciências médicas, robótica, equipamentos médicos, novos materiais e nanotecnologia. A produtividade cresce nesses setores graças ao avanço tecnológico.
Pesquisas de Moretti mostram que nos Estados Unidos um emprego criado nos setores de alta tecnologia gera outros cinco. Na indústria, essa relação é de apenas um para 1,6. Os centros de alta tecnologia demandam relativamente mais profissionais de nível universitário, de alta qualificação e maiores salários. A renda mais elevada aumenta a procura por serviços de médicos, engenheiros, arquitetos, personal trainers e outros, como os ligados ao lazer e ao turismo. Esses profissionais ganham mais do que seus pares que trabalham em regiões desprovidas desses centros.
Áreas de alta tecnologia — casos de Vale do Silício, Austin, Boston, San Diego, Nova York, Washington e Dallas — são aglomerações (clusters) dotadas de ecossistemas com oferta adequada de crédito, capitais, recursos humanos qualificados e serviços de elevada eficiência em propaganda, assessoria jurídica, consultoria de gestão, engenharia e expedição de produtos. A educação é a base da inovação nesses centros. Para Moretti, os mercados emergentes que investem bem em educação e inovam tenderão a trilhar o mesmo caminho. A China já produz mais patentes do que a Alemanha e a França. É o efeito, entre outros, de sua excelente política educacional.
O Brasil precisa de reformas para aumentar a competitividade da indústria e preparar-se para competir nos promissores segmentos dos serviços. Isso exige uma revolução na educação, nas instituições e, assim, no ambiente de negócios. Preferimos, todavia, reeditar políticas industriais de uma época que passou.