Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, dezembro 21, 2007

NELSON MOTTA

Nosso mundo animal
SÃO PAULO - Guardo as piores memórias desses filmes sobre o mundo animal que passam para crianças na televisão. Leões perseguindo e estraçalhando um antílope indefeso. Leopardos atacando as zebras, estripando-as e rasgando suas carnes. Hienas disputando carniça com ratos e urubus.
Com as modernas tecnologias de filmagem, o sadismo e a crueldade encontraram no gênero, considerado "educativo", um dos campos mais férteis para toda a sorte de brutalidade, afinal, a natureza é assim, não é?
Nesses mesmos ambientes selvagens, nos filmes de caçadas, são os humanos que dão o show de selvageria, violência e covardia, perseguindo e matando belos animais pelo prazer de matar, de destruir a beleza e transformá-la em obscenidade ao exibir suas cabeças como troféus e cobrir seus corpos com suas peles.
E, no entanto, o corpo de uma mulher ou de um homem nus, dois seres humanos se abraçando e se beijando, são proibidos para as crianças, por obscenos. Afinal, a natureza humana é assim, não é? Melhor para os bichos, que não conhecem a hipocrisia.
Lembrando esses aterrorizantes filmes da vida animal, o que ainda me chama atenção é que na natureza não há o que chamamos de "justiça", uma invenção humana que não existe nem na terra, nem no céu, nem na história, na biologia ou no cosmo. Não há justiça no amor nem na guerra. Em seu nome, todas as atrocidades são aceitas e cometidas. Para reparar injustiças, outras maiores são praticadas. A selvageria humana não tem limites, pela "justiça" nos nivelamos aos animais mais ferozes.
Resta-nos o eco distante do poeta Mário Faustino: "Não conseguiu firmar o nobre pacto / entre o cosmo sangrento e a alma pura / gladiador defunto, mas intacto / (tanta violência, mas tanta ternura)".

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