Digamos, por provável hipótese, que caminha para o lixo a tentativa de criação do Conselho Federal de Jornalismo. O Planalto é a favor do projeto, por ver na autarquia um antídoto ao denuncismo (que, por sinal, não tem defensores na imprensa honesta). Mas é difícil acreditar que um governo que até hoje não moveu uma palha para limpar da legislação brasileira a nódoa humilhante representada pela Lei de Imprensa editada no regime militar (governo Costa e Silva) considere-se no direito (ou dever?) de acrescentar novas correntes às algemas em vigor.
Na verdade, o projeto do CFJ é algo parecido com uma proposta de impor restrições ao comércio honesto como forma de acabar com os camelôs que vendem produtos falsificados. Nada contra o combate aos desonestos: tanto há donos de empresas jornalísticas mal-intencionados quanto profissionais indignos de exercer a profissão. Mas a proposta encampada pelo governo não peca pelas intenções, e sim pela falta de eficácia dos mecanismos. Podem apostar: não vai adiante. Está distante da realidade do jornalismo brasileiro.
Mas é preciso reconhecer: veio à superfície um problema que não desaparecerá com o naufrágio do projeto. Ou seja, o fato de que abusos são cometidos em nome da liberdade de informação. Por profissionais e patrões. Graças a Nossa Senhora da Pena, nossa padroeira, os grandes pecadores não são a maioria. Longe disso, mas o problema existe.
Enfrentar o problema talvez exija começar pela discussão do que é liberdade de imprensa. Proponho que seja um conceito falso. O que deveria existir — e constituir a base de qualquer conceituação do ofício — seria o direito da sociedade à informação. E o dever da imprensa de atender a esse direito. Resumindo: nós, jornalistas, não temos a liberdade, mas o dever de informar.
E a liberdade de ação dos meios de comunicação só se justifica na medida em que funciona como instrumento do indispensável direito da sociedade de ser informada — para com esse insumo decidir seus caminhos.
O jornalista não é Robin Hood. E não precisa de códigos ou regulamentos particulares (que, a propósito, não existem nas chamadas democracias sofisticadas). Nossos excessos podem ser perfeitamente enquadrados nos códigos Civil e Penal. A calúnia, a difamação ou a injúria não são diferentes se cometidas pelo cidadão ou pelo veículo de comunicação. O mesmo vale para a chantagem e para a falsificação, por exagero ou deslavada mentira, do produto vendido à sociedade. De resto, os meios de comunicação têm, independentemente das leis, um controle severo: o da opinião pública. Ela compra, assiste ou ouve o que lhe interessa e lhe serve. E de boba não tem nada: pode ser enganada por algum tempo mas no fim das contas compra, vê ou ouve o que serve aos seus interesses pessoais e ao exercício da cidadania. Não seria má idéia se os meios de comunicação tomassem a iniciativa de botar a boca no trombone contra o denuncismo, a acusação mal fundamentada, a denúncia amparada apenas na rivalidade política, ou na irresponsabilidade (maldosa ou incompetente) da autoridade.
Alguns podem temer que o público ache que somos todos farinha do mesmo saco. É um risco que facilmente se evita: basta que um comportamento ético impecável seja o principal instrumento da campanha.
Publicadoem: Tue, Aug 17 2004 10:30 AM
Entrevista:O Estado inteligente
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