Os arautos do apocalipse buscam argumentos para
sua causa no antigo calendário dos maias. O cinema
e a literatura agradecem e faturam com o filão
Renata Moraes e Roberta de Abreu Lima
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Previsões sobre o fim do mundo fazem parte das doutrinas das grandes religiões. São também fonte de inspiração para seitas de toda espécie. Nos últimos anos, como ocorreu na virada do milênio a partir de uma suposta profecia de Nostradamus, o fim dos tempos vem sendo anunciado de forma mais insistente. A explicação para isso talvez seja a busca por tábuas de salvação espirituais que deem alívio às atribulações e angústias do mundo moderno. Agora, a nova data para o apocalipse é 2012. Nesse ano se encerraria um dos ciclos do calendário usado pelos maias – população indígena que ainda hoje habita regiões do México e da América Central – quando estavam no auge de sua civilização, mais de 1 000 anos atrás. Os maias acreditavam que o mundo já havia passado por várias eras e que cada uma tinha a duração de 5.126 anos. Pelos cálculos de alguns pesquisadores, a era atual teria começado em 3.114 a.C. e se encerraria, portanto, em 2012.
Nos últimos três anos, Hollywood lançou três grandes produções que discorrem sobre a data enigmática: Apocalypto, dirigido por Mel Gibson, Eu Sou a Lenda e 2012 – O Dia do Juízo Final. Outro filme de orçamento gordo será visto nos próximos meses – 2012, de Roland Emmerich, o mesmo diretor de Independence Day. O calendário maia e o fim do mundo são o tema central de seis livros vendidos atualmente no Brasil. No site de relacionamentos Orkut, comunidades de até 15 000 pessoas se dedicam ao assunto. A complexidade do calendário maia (veja o quadro), combinada à mística ancestral do apocalipse, resulta num belo pacote esotérico, capaz de mobilizar as atenções de quem lê Paulo Coelho ou cultua o feng shui. A combinação, porém, é espúria. "Os maias não falavam em fim do mundo. As referências ao ano de 2012 encontradas em suas escrituras falam de um período gradual de transformações", disse a VEJA o historiador Robert Sitler, da Universidade Stetson, na Flórida, especialista em culturas latino-americanas.
A associação entre o calendário maia e o fim do mundo começou em 1987, quando o americano José Argüelles publicou O Fator Maia. No livro, ele fazia a própria interpretação das previsões contidas nas antigas escrituras dos maias. A obra se tornou best-seller e, no mesmo ano, Argüelles reuniu dezenas de milhares de pessoas numa série de encontros batizados de Convergência Harmônica. Neles, anunciou a iminência de uma nova era. Argüelles deu-se até o direito de criar uma versão pop do calendário maia, que chamou de Dreamspell. Também inspirou a criação do "horóscopo maia", que promete aproximar o homem de sua essência, seja lá o que isso signifique. No Brasil, o Dreamspell foi traduzido como Calendário da Paz e virou tema de cursos e palestras – pagas – que garantem "acesso à quarta dimensão". Diz o professor Eduardo Natalino dos Santos, do Centro de Estudos Mesoamericanos e Andinos da Universidade de São Paulo: "Muita gente tende a idealizar as civilizações antigas. Os maias viviam em guerra. Essa interpretação idílica de sua sociedade foi criada por grupos místicos que não têm compromisso com a história". Entre os que esperam o apocalipse para 2012, há divergências quanto à forma como ele se dará. Alguns acreditam que o mundo será atacado por alienígenas. Outros, que o enfraquecimento do campo magnético do planeta levará à extinção da vida. Uma terceira corrente afirma que um corpo celeste colidirá com a Terra. Enquanto o fim dos tempos não chega, Hollywood e a indústria do misticismo faturam com ele.
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