Começando o ajuste
O governo Temer precisa demonstrar logo de cara que está empenhado na busca do equilíbrio das contas públicas. Não basta anunciar um programa de reformas de médio e longo prazo, incluindo a da Previdência, embora isto seja necessário. A nova administração tem de mostrar ação praticamente imediata no combate ao déficit que vai herdar do governo Dilma.
Tem como fazer. Aliás, há uma semana, o economista-chefe do Itaú, Ilan Goldfajn, divulgou um relatório com propostas e cálculos interessantes e viáveis. Como Goldfajn está indicado para a presidência do Banco Central, convém dar uma olhada.
Para não aborrecer o leitor com contas, fiquemos com os conceitos.
A primeira coisa a fazer é um esforço de corte de gastos do governo federal. Dá para fazer em três áreas: pessoal, custeio e investimentos.
Não há como demitir funcionários concursados, mas, desde o governo Lula, a administração federal vem sendo aparelhada com militantes e apaniguados. São os cargos comissionados, os cargos de livre provimento, as assessorias que incharam a máquina federal em todos os níveis.
Aí tem margem de corte. Segundo as contas de Goldfajn, pode-se chegar a uma economia de até R$ 9 bilhões no Orçamento de 2017. É algum dinheiro e, sobretudo, uma boa demonstração de austeridade.
A turma que está no governo sempre diz que não é possível cortar no custeio — gastos que vão desde manutenção de hospitais e escolas até o cafezinho do pessoal. É o contrário. Sempre dá para cortar. Mas é preciso cuidado. O setor público costuma ser inchado onde não precisa e magrinho ali na ponta de atendimento ao público.
Também será preciso cortar investimentos, mesmo porque a gestão Lula-Dilma deixa um inventário de obras inacabadas, mais caras do que o previsto e travadas de algum modo, quer pela Lava-Jato, quer por má gestão. Convém dar uma parada, avaliar tudo e destravar aos poucos.
Daí a importância crucial das concessões e privatizações de obras de infraestrutura — onde está o segundo conjunto de medidas que podem dar dinheiro já em 2017. A venda de concessões de aeroportos, estradas, portos etc. pode render em torno de R$ 50 bilhões para os cofres federais. Além disso, o investimento privado nas obras substituiria o público com muito mais eficiência.
Também aqui há muita coisa travada. Para falar a verdade, parece que todas as concessões — as já feitas e aquelas em andamento — têm algum tipo de rolo. Ora falta o prometido financiamento do BNDES, ora o governo não faz sua parte na obra, ora simplesmente não paga.
É preciso um novo modelo de concessões e privatizações, que estimule a competição, tenha menos verba pública e permita que as empresas vencedoras tenham lucro de verdade. Em resumo, acabar com as privatizações envergonhadas da era petista.
Tem como fazer isso. Há experiência brasileira e internacional no setor. E tem bastante coisa já encaminhada, como a privatização de mais quatro aeroportos, programa que pode sair com um pouco mais de gestão.
A terceira medida que pode dar resultado imediato é o cancelamento das desonerações de impostos sobre a folha de pagamentos. A ideia, baratear a contratação de pessoal, até era boa, mas foi mal aplicada. Além disso, a reforma tributária de que o país precisa é para aliviar a carga de impostos para todos e não para alguns setores e empresas amigas do poder.
Eis um bom cardápio inicial. A nova administração precisa mostrar austeridade e eficiência. Não é fácil, sobretudo quando se vê que vão para os ministérios políticos que já lá estiveram por mais de uma vez.
De todo modo, a parte principal do jogo estará com a área econômica. E aqui começa com uma aparente contradição. Tendo anunciado compromisso com o equilíbrio das contas, o novo governo tem que aprovar até o final deste mês uma mudança no orçamento, para prever... um déficit enorme.
É herança, porém. Herança das pedaladas, inevitável. Ou seja, o déficit deixado por Dilma não pode ser pago em um ou dois anos. Mas o novo governo pode, e precisa, mostrar e praticar uma política que inverta a curva atual e indique uma redução do déficit futuro.
Além daquele cardápio inicial, isso exige também o anúncio das reformas de longo prazo, especialmente a da Previdência.
De novo, não tem nada fácil. Mas é tudo possível. São políticas já aplicadas aqui mesmo e que já deram certo em diversos países.
Carlos Alberto Sardenberg é jornalista
Enviado do meu iPhone