Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, julho 25, 2008

A frase de Goebbels e seus seguidores



Gabriel de Salles
Gazeta Mercantil
25/7/2008

Ser descendente de vítimas do holocausto é argumento frágil para justificar a indignação de Susan Schwab, negociadora dos Estados Unidos na Rodada Doha, com o chanceler brasileiro, Celso Amorim, que, ao acusar os países ricos de manipularem informações, repetiu a frase "uma mentira repetida muitas vezes se torna verdade", de Joseph Goebbels, o arquiteto da máquina de propaganda nazista. Embora o nazismo e seus líderes e seguidores sejam abomináveis em todos os aspectos, fica difícil negar a veracidade da máxima do marqueteiro de Hitler. Tanto assim que a frase não sucumbiu junto com seu criador. Ao contrário, se torna cada vez mais real e ganha crescente número de seguidores.
Os próprios chefes de Susan, a começar pelo presidente norte-americano George W. Bush, assimilaram-na com perfeição e sua mais recente e ostensiva demonstração aconteceu com a invasão do Iraque. A mentira repetida com insistência era a existência de armas de extermínio em massa, quando, na realidade, o objetivo era se livrar de um ex-aliado convertido em adversário incômodo e garantir o controle sobre as reservas petrolíferas do país.
Ao assim agir, Bush apenas seguiu estratégia corriqueira na política norte-americana, de mentir tanto para o público interno como para o externo, mas sempre com o enfeite de verdade. Antes do Iraque, o mais escandaloso festival de mentiras dos Estados Unidos aconteceu durante a guerra do Vietnã, vencida pelos combatentes do Vietnã do Sul e seus aliados do Vietnã do Norte.
A começar pelo nunca devidamente esclarecido incidente no Golfo de Tonkin, pretexto para o envolvimento direto dos americanos no conflito, em boa parte dos 14 anos de guerra, o público norte-americano e aqueles que em outras terras acreditavam no noticiário divulgado pelas agências de notícias subservientes aos interesses de Washington, eram levados a supor que a vitória norte-americana era questão de dias.
Todo dia havia centenas de mortos entre guerrilheiros e tropas regulares do Vietnã do Norte, enquanto não se falava de vítimas entre norte-americanos. Se alguém se der ao trabalho de contabilizar esses números nos anos da guerra, ficará sem entender como, pelo noticiário, um povo praticamente exterminado, saiu vitorioso contra um exército que teve pouquíssimas baixas. Pelo noticiário da época, não teria sobrado nenhum vietnamita.
Mesmo após as denúncias feitas por ex-combatentes norte-americanos e jornalistas isentos, era grande o número de crentes na vitória contra os "selvagens comunistas". Até que um dia o mundo todo viu as tropas do país mais poderoso do planeta serem postas, literalmente, para correr.
Repetir mentiras, tentando formular verdades, não é, infelizmente, exclusividade norte-americana, nem dos países ricos, como afirmou o chanceler Amorim. O próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva assimilou muito bem a lição e não perde oportunidade de praticá-la, quando, por exemplo, procura argumentos para defender o etanol brasileiro. Fechando os olhos para os crimes ambientais e sociais praticados pelos produtores de álcool, o presidente bate na tecla de que o cultivo canavieiro no País não prejudica a produção de alimentos, tentando alterar princípios básicos como o de que dois corpos não podem ocupar o mesmo espaço. Contraria também posicionamentos de reconhecidas e insuspeitas autoridades internacionais que culpam os biocombustíveis pela alta mundial dos preços dos alimentos.
Ao ser derrotado junto com o nazismo e suicidar-se com a esposa, após assassinarem os cinco filhos ainda crianças, Goebbels, ao contrário do que afirmara, na verdade comprovou que toda mentira tem perna curta. Mas ainda há quem ignora esse antigo ditado popular e adota a máxima do propagandista do nazismo.
kicker: Muita gente ainda repete mentiras na tentativa de transformá-las em verdade

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