O Estado de S. Paulo |
26/10/2006 |
Enquanto em Alexandria dois príncipes da casa dos Ptolomeus disputavam o poder, embaixadores das duas partes acorriam a Delfos carregados de presentes para o templo de Apolo, para consultar o oráculo sobre o desfecho da crise. Quando os sacerdotes os procuraram para apresentar o veredicto, os embaixadores tinham partido. Qual terá sido a causa de súbito desinteresse pelo destino traçado pelo Olimpo? É que graves notícias tinham chegado na véspera aos embaixadores: o imperador romano já havia decidido a sorte dos Ptolomeus. Esta é a história narrada no poema (Enviados de Alexandria) de Constantinos Kavafis, uma das grandes antenas do humanismo no início do século 20. Ontem foi um pouco assim. O Federal Reserve (Fed, o banco central americano) manteve os juros básicos (veja gráfico) e passou um comunicado em que ficou dito, para contrariedade dos catastrofistas, que a inflação por ora não preocupa e que a expansão da economia seguirá seu curso, "a passo moderado". À decisão de César, os profetas do apocalipse ficaram reduzidos ao silêncio, à espera de novos augúrios sobre os quais se basearem para continuar faturando sobre o medo das pessoas. Dois desses pessimistas são os analistas Nouriel Roubini, que escreve em seu weblog http://www.rgemonitor.com/blog/roubini, e o colunista do New York Times Paul Krugman. Suas predições não se têm confirmado. Há anos, ouve-se sobre os sempre iminentes "estouro da bolha", "hard landing" e início de prolongado e doloroso período de ajuste que sempre poderá transformar-se em depressão. Mas esses desastres têm sido sucessivamente adiados. O máximo de retranca monetária ativada pelo Fed são esses juros anuais de 5,25 pontos porcentuais. Talvez tenham de ser elevados em mais um quarto de ponto, mas desistam de mais dureza. Os tempos são de fartura de recursos e de crédito e nesse ambiente não há lugar para desastres. O diretor-executivo do Banco Mundial, Otaviano Canuto, observa que, em parte, essas expectativas ruins são alimentadas pelo achatamento dos salários nos Estados Unidos. Isso ajuda a disseminar a idéia de que o progresso econômico está ameaçado. A novidade são os efeitos da globalização; são as mercadorias asiáticas invadindo as prateleiras a preços de pechincha, cada uma delas dispensando produtos feitos nas fábricas locais; e é a inflação sendo derrubada pelos preços cada vez mais baixos. Assim, o Fed não precisa reapertar torniquetes, como no passado. Na medida em que se contentam com salários muito mais baixos quando comparados aos do mundo rico, os chineses ajudam as autoridades monetárias a derrotar a inflação. No entanto, o retorno das aplicações de capital está aumentando. Com as exceções de praxe, os lucros das corporações americanas estão engordando, a valorização dos imóveis é impressionante e os fundos de investimento vêm apresentando resultados satisfatórios. Como mais da metade das famílias americanas mantém carteiras de títulos ou cotas de fundo de pensão, o cidadão médio consegue compensar com aumento patrimonial o que perde em salário. Mas, na prática, não percebe essa compensação. Sente que as coisas pioram a cada dia. E isso preocupa os estrategistas da Casa Branca porque a sensação de que a economia não anda - ainda que falsa - contraria seus planos eleitorais. Por enquanto, o diagnóstico é o de que há falha no diálogo com a população. E foi por ter sido apontado como mau comunicador que o secretário do Tesouro John Snow foi demitido. O próximo presidente brasileiro poderá começar seu mandato sob os auspícios de uma enorme trégua nos mercados. Se bem aproveitada, a economia brasileira terá muito a lucrar com isso. |
Entrevista:O Estado inteligente
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quinta-feira, outubro 26, 2006
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