Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, fevereiro 09, 2005

PRIMEIRA LEITURA :A lógica da impunidade Por Reinaldo Azevedo

A lógica da impunidade
Dom Tomás Balduíno, presidente da Comissão Pastoral da Terra, vai ou não rezar uma missa para encomendar a alma do soldado morto?

Por Reinaldo Azevedo

Sou tentado a endossar as palavras desse inacreditável Jaime Amorim, o chefão do MST em Pernambuco. Também acho que o MST não tem nada a ver com a morte de um soldado e a tortura de outro. De fato. A verdadeira responsável pelos crimes é a impunidade. Quem comanda a impunidade é o governo federal. Quem comanda o governo federal é Lula. O resto é silogismo, leitor amigo. Os sem-terra desrespeitam a lei de forma sistemática, continuada e pública. Nada acontece. Ao contrário.

O governo prevarica e não aplica a lei antiinvasão. Márcio Thomaz Bastos, ministro da Justiça, já pregou a acomodação tática da Constituição na relação com o MST. Há dias, Lula foi abraçar os invasores da Veracel. Miguel Rossetto, o ministro do Desenvolvimento Agrário, foi à inauguração de uma Escola Superior de Invasões e aplaudiu líderes que defendiam a ocupação de “latifúndio produtivo”, não atentando para a contradição dos termos. O MST impõe leis próprias nos territórios que domina. Ali, não vigem as leis do Brasil. São terras descontínuas de um outro país.

Duvido, de fato, que o comando do movimento ache que já chegou a hora de matar policiais. Ainda não. Os assassinos o fizeram porque o ambiente em torno lhes disse que podiam, já que eles podem qualquer coisa e nada acontece. A propósito, quem aparece negando vínculos com as mortes é justamente Jaime Amorim. Se a gente souber quem é Amorim, todo o resto fica claro.

Culpar quem?
Para começo de conversa, ainda que se quisesse acionar judicialmente o MST por, agora, um homicídio ocorrido em território controlado pelo movimento, seria impossível. Ele não tem existência legal. É uma sigla de agitação política. Ninguém conhece nem mesmo a sua estrutura de funcionamento e toda a sua direção. Alguns, como Amorim, aparecem mais; outros ficam nas sombras. Se a polícia conseguir chegar aos assassinos e torturadores, serão individualmente responsabilizados pelo caso, mas o Estado paralelo do MST não vai sofrer um arranhão. Para todos os efeitos, ele não existe, embora, como se vê, tenha seus soldados, defenda o seu território contra invasões “estrangeiras” e, à revelia do comando, é claro, os mais exaltados possam torturar e matar.

São inúmeras as histórias, e o jornalismo não se interessa muito por elas, de ajustes de contas que os sem-terra promovem entre si, ora em guerras internas, ora envolvendo grileiros e até proprietários. E todos se mostram interessados em manter longe a lei e a polícia. É um Estado paralelo, onde o MST exerce as funções de Executivo, Legislativo e Judiciário, tendo João Pedro Stedile como juiz supremo, chefe do Parlamento e líder da, literalmente, oligarquia a que pertencem ele próprio, Gilmar Mauro e Jaime Amorim, dentre outros.

Raul Jungmann, ex-ministro do Desenvolvimento Agrário, vai ao ponto quando vê aí o que pode ser uma antecipação do Abril Vermelho prometido pelo MST. Ora, dirão, isso é crime comum; não tem nada a ver com a ação em favor da reforma agrária. Não importa o que motivou a ida dos policiais ao assentamento nem saber se os que mataram um soldado e torturaram outro estavam ou não numa disputa por terra. A questão a ser abordada é o ambiente que lhes disse ser isso possível.

O sr. Jaime Amorim, como sói acontecer quando o MST ultrapassa toda e qualquer linha do razoável na disputa política — afinal, o movimento, mesmo sem ser legal, é político, certo? —, se apressa em dizer que nada tem com isso, que sua própria gente deu queixa à polícia contra os perseguidos. Faz de conta que se trata de um confronto entre PMs e um assentado convertido ao banditismo puro e simples. Amorim, que integra um movimento que não respeita a lei, também não respeita a inteligência do próximo: um policial foi morto e outro foi torturado num território controlado pelo Estado paralelo chamado Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra.

Quem é ele?
Não estranha que assim se comporte. Amorim, um catarinense enviado pelo comando do MST para cuidar das invasões em Pernambuco, é um portento de eficiência. O Estado lidera o ranking das invasões, e seus liderados estão entre os mais violentos do Brasil. O MST local, já sob o seu comando, incendiou carros do Incra em Recife, jogou cocô (sim, isso mesmo!) na caixa d’água da instituição e ocupou e depredou, em 2000, um navio de bandeira liberiana que continha milho transgênico. O homem sabe mesmo das coisas. Amorim também é o comandante de um aparelho do MST em Caruaru, onde revela a “agricultores” brasileiros os mistérios de Marx, Che Guevara e Lênin.

E, se me permitem uma indagação, lá vai: dom Tomás Balduíno, presidente da Comissão Pastoral da Terra, vai ou não rezar uma missa para encomendar a alma do soldado morto? Pois é: me dou conta de que nem mesmo sei se, para dom Tomás, policial também tem alma.

*

NOTA — A propósito: essa gente civilizada está para eleger Luiz Eduardo Greenhalgh (PT-SP), seu braço político, para a Presidência da Câmara. Também essa culpa não é do MST, mas de quem assiste a tudo de forma impassível. Alguns méritos o movimento tem: não engana ninguém, não esconde o que quer, não omite seus métodos nem onde estão seus aliados no que resta de Brasil legal.

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