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domingo, janeiro 15, 2012

Coisas de Paris - DANUZA LEÃO




FOLHA DE SP - 15/01/12

Assisti a cena lamentável: grupo de nove chineses entrou no Flore, percorreu todo o café e nem se sentou


Paris anda meio estranha; deve ter sido a invasão dos chineses. Eles são muitos, multidões, e os que mais compram.

Chegam em grandes excursões, e como passam só dois dias na cidade (que não conhecem), vão diretamente para a loja Cartier, na Galerie Lafayette; entram na fila organizada por seguranças, com cordinha e tudo, e compram tudo que encontram; as pulseiras de ouro com pregos estão esgotadas, e essa loja é, de todas as Cartier do mundo -que são muitas-, a que mais vende.

Outro dia assisti a uma cena lamentável: um grupo de nove chineses entrou no Flore, conduzido por um guia turístico, percorreu todo o café, atrapalhando o trânsito dos garçons e a vida dos que lá estavam.

Ninguém se sentou em mesa nenhuma, a visita fazia apenas parte do tour. A direção do Flore também está meio estranha.

Um amigo decidiu ir a Londres ver a expo Leonardo da Vinci. Comprou uma passagem Paris/Londres/Paris; iria de manhã e voltaria à noite, pelo train bleu. Preço: 88 libras -cerca de R$ 160- (uma ponte aérea Rio/SP/Rio pode custar até R$ 1.800,00). Mas as entradas, que custariam 17 libras, estavam esgotadas, e para ver a exposição, teve que recorrer ao cambista, por um preço dez vezes maior: 170 libras.

A mostra tem mapas até da coleção da rainha Elizabeth, mas os organizadores não conseguiram levar a Mona Lisa. Da última vez que o famoso quadro saiu da França foi para Washington, levado pelas mãos de Jacqueline Kennedy (com a ajuda do seu amigo e então ministro da Cultura, André Malraux).

O travesseiro mais caro do mundo custa 335 euros (cerca de R$ 800) e é, segundo a etiqueta, de plumas de ganso branco da Sibéria. O que não é dito é que as plumas são tiradas do gogó do ganso com ele ainda vivo, e viva a ecologia.

Ainda dá tempo de comer trufas brancas; no Café Armani, dois ovos, coroados por trufas brancas raladas na frente do cliente -maravilhosas-, custam 53 euros, e a explicação para o preço vem no menu: um grama custa 6 euros, e o prato leva oito gramas. Em compensação, as trufas negras da Maison de la Truffe parecem de papel.

Andei por lugares conhecidos por serem muito chiques e não vi nenhuma francesa usando as famosas grifes; só as árabes e as brasileiras ricas da av. Montaigne, pois quem já tem dinheiro há mais tempo acha vulgar usar roupas e acessórios de marcas famosas. Até usam, mas herdadas da mãe ou de uma avó, e já bem usadas; novas, jamais.

Na França, não existe o parcelamento, nem mesmo nos cartões, e o pagamento tem que ser “cash”. Quem trabalha, mesmo ganhando bem, não tem dinheiro no fim do mês para comprar uma bolsa do Hermès, “cash”, por 6.000 euros (se for de crocodilo, 20 mil).

Mas sei de uma brasileira que compra sempre duas bolsas iguais: uma fica em Paris, em seu maravilhoso apartamento, e a outra é levada para São Paulo.

E a grande hotelaria francesa, pasme, está nas mãos dos estrangeiros. O Bristol pertence a uma cadeia alemã; o Plaza e o Meurice, administrados pela Dorchester Collection, ao sultão de Brunei; o George V é propriedade do saudita Al Walid; o Ritz, que está fechando para reformas (um perigo), ao milionário Al Fayed; o Lutetia, aos israelenses; o Crillon, em plena Place de la Concorde, foi vendido, com grande grita dos franceses, para um grupo saudita.

E os asiáticos estão chegando com força total: o Royal Monceau, o Mandarin e o Shangri-lá são o paraíso dos olhinhos puxados, e o Peninsula deve abrir no final de 2012. É a crise.

E mais brasileiros do que se imagina estão viajando para a Europa em seus próprios jatinhos. É a crise.

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