Entrevista:O Estado inteligente

sábado, junho 24, 2006

DORA KRAMER Uma CPI reportagem Comissão das sanguessugas quer distância do teatro e das exibições de civismo ...

Uma CPI reportagem Comissão das sanguessugas quer distância do teatro
e das exibições de civismo ético

À primeira vista, a chamada CPI das Sanguessugas, criada para
investigar compras superfaturadas de ambulâncias com dinheiro de
emendas parlamentares, nasce sem chance de sobreviver, em meio a toda
sorte de adversidades.

Foi instalada a ferro e fogo contra a opinião do comando do
Congresso, acontece em plena campanha eleitoral, com Congresso vazio
e o público um tanto exausto de denúncias e, por envolver
parlamentares, alguns dos quais integrantes da Mesa Diretora da
Câmara e outros ligados ao partido do presidente do Senado (PMDB), é
certo que sofrerá boicote constante.

O seu mais insistente defensor, o deputado Fernando Gabeira,
reconhece que o ambiente é hostil, se prepara para enfrentar
sabotagens cotidianas, mas não vê outra maneira de lançar luz a uma
investigação que segue em segredo de Justiça e tentar, com isso, não
apenas desvendar a atuação de quadrilhas especializadas em manipular
verbas do Orçamento da União, como também recuperar um pouco da tão
combalida imagem do Congresso.

O presidente da CPI, deputado Antônio Carlos Biscaia, integrante
daquela ala do PT interessada em repor o partido nos antigos eixos,
já avisou que os trabalhos não terão a teatralidade das comissões de
inquérito polêmicas, como as três últimas de grande visibilidade - a
dos Correios, a dos Bingos e a do Mensalão -, nem vão se concentrar
em cassações de mandato como objetivo final.

"A diferença é que esta não será uma telenovela, será uma reportagem
sobre os negócios feitos no Parlamento e nos ministérios com recursos
liberados por meio de emendas e seus nexos político-partidários. Não
são necessárias exibições de civismo ético, porque a condenação a
essas práticas já é a razão de ser da CPI", define Gabeira.

Em consonância com a filosofia de Biscaia, para quem os depoimentos
longos e dramáticos são dispensáveis, Gabeira tem um plano de
trabalho que vai submeter aos colegas de comissão já no início da
semana. A proposta dele é dividir os 60 dias de investigações em duas
fases de um mês cada uma.

Na primeira, será examinado o que foi produzido pela Polícia Federal
e pelo Ministério Público para recuperar a seqüência e a substância
dos fatos.

Esse material está protegido por sigilo de Justiça, mas a partir da
requisição da CPI é inevitável que se torne público. "Na verdade, é
um segredo de polichinelo", diz Gabeira, lembrando que quando surgiu
a notícia da Operação Sanguessuga o depoimento da funcionária que
liberava as verbas no Ministério da Saúde, Maria da Penha Lino,
revelou muito sobre os métodos e os nomes.

Gabeira acha indispensável chamar o procurador Mário Lúcio Avelar,
responsável pelas investigações da compra das ambulâncias
superfaturadas em Mato Grosso do Sul, para que ele conte em detalhes
no que consistiu o seu trabalho. Essa conversa servirá para dar
subsídios ao restante da CPI, a fim de que os integrantes possam
questionar o procurador num dos poucos depoimentos a serem feitos.

A segunda fase, pela proposta de Gabeira, seria a mais complicada,
sensível e polêmica. Nela, a CPI buscaria estabelecer os "nexos"
políticos. Ou seja, a relação entre os negócios de compras
superfaturadas e os políticos, tanto os que fizeram emendas quanto os
que tinham influência no ministério. Nesse ponto, um dos partidos
mais atingidos seria o PMDB.

O ministro da época, Saraiva Felipe, é deputado do partido e foi quem
contratou a funcionária Maria Penha, por solicitação do líder do
partido na Câmara, Wilson Santiago. Além disso, há o fato de dois
assessores do senador Ney Suassuna, líder do PMDB no Senado, terem
sido presos na operação da PF.

Suassuna indicou os quatro senadores pemedebistas que fazem parte da
CPI.

A participação deles, a depender do desenrolar dos trabalhos, pode
vir a ser contestada, como de resto há reservas a respeito da entrega
da relatoria ao senador do PMDB Amir Lando. Fernando Gabeira acha que
não há razão para vetos de antemão. "Se o trabalho final favorecer
alguém ou não refletir com exatidão os fatos, faremos um relatório
alternativo."

A opção pelo trabalho mais discreto e, digamos, técnico, não
significa que a CPI não produzirá fatos de impacto durante o seu
transcurso.

Um deles poderá ser o pedido de afastamento de dois integrantes da
Mesa Diretora da Câmara, caso o exame das provas já colhidas pela PF
e pelo Ministério Público confirme o envolvimento dos deputados
Nilton Capixaba (PTB-RO) e João Caldas (PL-AL), respectivamente
segundo e quarto secretários da Câmara, acusados pela funcionária
Maria da Penha.

Outras quadrilhas

O foco principal da CPI das Sanguessugas é o Ministério da Saúde, mas
há indícios de que as quadrilhas das compras superfaturadas a partir
das emendas de parlamentares atuavam também nos Ministérios dos
Transportes e de Ciência e Tecnologia. Neste, a corrupção estaria na
compra dos "ônibus de inclusão digital", para os quais só no Rio de
Janeiro foram liberados R$ 4 milhões.

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