Nenhuma área passou por mudanças tão radicais e profundas, no segundo governo Fernando Henrique, como o setor de telecomunicações. Os empresários do setor se reuniram esta semana em Florianópolis, num megaevento, e admitem não saber o que vai acontecer no futuro. A proposta do PT não é clara e as empresas enfrentam um momento de retração do mercado após o boom.
Tudo o que se sabe das propostas do partido é o que foi divulgado no programa de campanha. Diz que tudo o que está acontecendo no setor de telefonia “prova que o modelo adotado pelo governo FH é equivocado e são necessárias mudanças”.
E o que aconteceu foi a mais extraordinária expansão do serviço no Brasil.
O próprio texto do partido dá o número de 142% de aumento da rede fixa, em três anos, e 421%, em celular.
Em 97, apenas 6% da classe D tinham telefone fixo na região da Telemar. Agora, este número foi para 61%. Da classe C, o número foi de 34% para 82%.
Apesar disso, o programa do PT diz que o modelo é equivocado.
“A proposta do Partido dos Trabalhadores foi contrária ao fatiamento do grupo Telebrás. Deveríamos seguir estratégias semelhantes às adotadas por vários países como França, Alemanha, Espanha. O país deveria, portanto, reorganizar e reestruturar o grupo Telebrás, fundindo todas as teles e a Embratel numa única grande empresa nacional.”
Como é impossível voltar atrás, fica-se sem saber como eles pretendem mudar o modelo.
Houve sim alguns erros e este é um momento de mudanças: os empresários reunidos esta semana em Florianópolis estão prevendo que, assim que a lei permitir, haverá uma consolidação com empresas mais fortes comprando empresas em dificuldades. Mas tudo será evolução do atual modelo.
— Seria maluquice retroceder. Espero que ninguém pense nisto no próximo governo — disse-me um empresário.
Na Futurecom 2002, passaram 5.370 pessoas em painéis e seminários; ela teve, só de convidados internacionais, 200 painelistas e palestrantes nos quatro dias de evento. O organizador do encontro Laudálio Veiga Filho considera que, com todo o discurso de crise, este encontro foi tão concorrido quanto os outros.
Nada são flores no setor, mas não é o caso de rever o eixo central da política. Apenas aperfeiçoamentos.
O setor, no resto do mundo, sofre os efeitos da ressaca do excesso de expectativa sobre o crescimento da demanda.
No Brasil, a partir da privatização, os investimentos anuais cresceram fortemente. O Sistema Telebrás investia, por ano, cerca de R$ 5 bilhões. Em 99, o investimento foi de R$ 12 bilhões; em 2000, 14 bilhões; em 2001, R$ 23 bilhões; para este ano, a previsão é de R$ 9 bilhões.
— Nós estamos falando em crise porque o país voltou aos níveis de investimento mais normais — diz Valerijonas Seivalos, da Qualcomm.
O presidente da Siemens, Aluizio Birro, acha que é mais do que isso:
— Houve um superinvestimento no mundo, mas, no Brasil, isso foi induzido pela antecipação de metas exigida pela Anatel. As empresas encomendaram demais, a demanda não cresceu tanto, e hoje estão estocadas de equipamentos. Resultado: as fabricantes de equipamentos estão com capacidade ociosa.
O boom brasileiro foi tão forte que atraiu um número muito alto de produtores de equipamentos, e a competição, na opinião deles, ficou predatória.
Existem dez fabricantes de equipamentos no Brasil e a previsão que se faz é que alguns acabarão indo embora.
— Eu fui o primeiro a chegar, serei o último a sair, mas acho que nunca sairei — diz Birro. A Siemens instalou no Brasil uma linha de telégrafo entre Rio e Rio Grande do Sul para apoiar o Exército brasileiro em 1867 na guerra da Tríplice Aliança. Em 1905, instalou-se definitivamente no Brasil.
Os fabricantes dividem-se hoje entre pessimistas e otimistas, mas a Siemens não pode estar no primeiro grupo. Sua fábrica de Manaus está trabalhando em três turnos.
— Alguns produtos estão com grande demanda, outros não. A fábrica de Curitiba está com capacidade ociosa — conta Birro.
A indústria está procurando novos nichos e encontrando velhos problemas.
Um painel sobre o mercado de telecomunicações fez uma consulta interativa sobre como era possível aumentar a oferta de telefones se o país crescia pouco. Sessenta por cento disseram que a saída é oferecer telefone para as classes D e E. Fernando Terni, da Nokia, não acredita nisso:
— Eles não têm dinheiro. Este é um país com a renda mal distribuída.
Isso provocou polêmica na mesa. Sérgio Quiroga, da Ericsson, e o consultor José Luís de Souza sustentaram que há caminhos para vender para consumidor de baixa renda.
Luís Carlos Cornetta, da Motorola, diz que está otimista porque há vários nichos de mercado para serem explorados e, além disso, está exportando US$ 700 milhões de celulares.
No fim do debate, todos foram convidados a dar conselhos para o próximo ministro das Comunicações, caso ele estivesse no plenário lotado. Na mesa, estavam a Cisco System, a Embrael, a Qualcomm, a Ericsson, a Promon, a Motorola e a Nokia.
Aconselharam o próximo governo a não reinventar a roda, nem tentar ruptura com o atual modelo, porque o caminho é o do aperfeiçoamento de tudo o que foi feito nos últimos anos.
Um deles lembrou que Lula soube, duas horas depois da eleição, que era o presidente eleito graças ao avanço tecnológico que o Brasil conseguiu nos últimos quatro anos
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