Artigo - José Rodrigo Rodriguez |
Gazeta Mercantil |
31/8/2006 |
O problema não é criar exceções, é saber qual a aceitável. Em 29 de junho deste ano a Suprema Corte dos EUA decidiu que Salim Ahmed Hamdan, prisioneiro de Guantânamo, tem direito a habeas corpus e à proteção da Convenção de Genebra, negados por uma lei aprovada durante o governo Bush. Também afirmou que o governo agiu ilicitamente ao submetê-lo a uma comissão militar criada especialmente para tratar dos prisioneiros de Guantânamo. Afinal, seus crimes tiveram lugar antes de ela existir. Além disso, considerou ilícita a criação da comissão. Dentre seus poderes, estava a possibilidade de aceitar qualquer prova, inclusive depoimentos obtidos sob tortura, e manter sob sigilo fatos e provas reunidas para incriminar os acusados. |
quinta-feira, agosto 31, 2006
PCC e licença para matar
Palavras ao vento
EDITORIAL |
Folha de S. Paulo |
31/8/2006 |
Programa de governo do PT nada diz; discurso que muda conforme a platéia costuma preceder estelionato eleitoral FICOU CELEBRIZADA a reação do então ministro da Fazenda Mário Henrique Simonsen ao ser indagado sobre o 2º Plano Nacional de Desenvolvimento, que acabara de ser lançado pelo governo de Ernesto Geisel: "Não leio ficção". Qualificar de ficção o autodenominado programa de governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, divulgado na terça-feira, seria elogioso. As 30 páginas poderiam ser resumidas a uma só, em branco, tamanho o grau de generalidade do que expressam. |
O FGTS e os fundos de Lula 2006 vinícius Torres Freire
O FGTS e os fundos de Lula 2006 |
Artigo - |
Folha de S. Paulo |
31/8/2006 |
Governo planeja aumentar investimento com dinheiro do Fundo; problema é quem controla o risco do negócio |
Lula e a mídia
Editorial |
O Estado de S. Paulo |
31/8/2006 |
Sem dúvida beneficiado por ter feito um discurso lido, sem acréscimos improvisados, o pronunciamento do presidente Lula na abertura do 6º Congresso Brasileiro de Jornais, terça-feira, em São Paulo, teve uma precisão conceitual irretocável, ao estabelecer o valor da liberdade de expressão e a conexão profunda entre a livre imprensa e a democracia. Mas, como quase sempre acontece, as palavras do presidente não corresponderam - infelizmente - à realidade dos fatos, no que diz respeito a seu próprio governo. |
Barrado na festa Rolf Kuntz
artigo - |
O Estado de S. Paulo |
31/8/2006 |
O Brasil está fora da próxima redistribuição de cotas - e do correspondente poder de voto - anunciada pelo diretor-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI), o espanhol Rodrigo de Rato. China, Coréia do Sul, México e Turquia serão os premiados nessa rodada, primeiro passo de uma reforma da instituição. O governo brasileiro esperneou nos últimos dois anos para ser incluído na lista, mas o esforço, até agora, não deu certo. Desde os anos 90 a reputação brasileira melhorou muito, entre os dirigentes e os grupos de maior influência nas principais instituições financeiras internacionais. Mas durante 20 anos o País cresceu muito menos que outros emergentes e isso tem um preço político. |
A reação irracional da Bolívia à EBX Raphael de Almeida Magalhães
Artigo - |
Gazeta Mercantil |
31/8/2006 |
O projeto siderúrgico da empresa brasileira interessa à economia boliviana. A polêmica em torno do projeto siderúrgico da EBX na Bolívia oferece um campo de observação sedutor para a projetada integração econômica da América do Sul, que o imbróglio da Petrobras, muito mais complexo, não deve obscurecer. Mesmo porque, do ponto de vista estrutural, sob a ótica dos interesses da Bolívia, o projeto da EBX talvez atenda melhor a economia boliviana que o da Petrobras. |
A marca deles é a crise Plínio Fraga
Artigo - |
Folha de S. Paulo |
31/8/2006 |
O excelente documentário da americana Rachel Boyton "Bolívia: História de uma Crise", ainda em cartaz no Rio e em São Paulo, tem um título original mais cifrado, mas mais criativo e provocador do que o da versão brasileira. "Our Brand is Crisis" deve ser traduzido para algo como "crise é nossa marca". O documentário acompanha o passo a passo da campanha à Presidência da Bolívia de Gonzalo Sánchez de Lozada, o Goni. Na década de 90, marcou sua gestão administrativa por privatizações e abertura ao capital estrangeiro. Em 2002, mal nas pesquisas e com alta rejeição, Goni tentava voltar à Presidência. Como saída, contratou o marqueteiro James Carville, que já deu palpites aqui em campanhas de Paulo Maluf e FHC. Na Bolívia, Carville e sua equipe conseguiram virar uma disputa que parecia perdida, prometendo suprir os anseios do eleitor mais do que atender as necessidades do país. Goni foi reeleito, mas ficou sete meses no poder, sendo obrigado a renunciar em meio a uma crise social e política conturbada, com mais de cem mortos em protestos. O filme termina com o ex-presidente exilado em Washington, de onde assistiu à vitória de Evo Morales, no pleito de sua sucessão. O problema dos marqueteiros é que não poupam nem a mãe para vencer. Não resolvem problemas, como abordá-los na campanha. Depois passam o pepino adiante. Um dos mais badalados marqueteiros brasileiros respondeu certa vez a uma questão prosaica. Um homem de 40 anos ainda vivia com a mãe e tinha sua imagem no universo feminino prejudicada cada vez que tocava no tema. "Pare de dizer que você mora com sua mãe. Diga que sua mãe mora com você." Antes dependente, agora provedor. A situação da mãe não mudou, mas o discurso ficou muito melhor. |
A conta não fecha
EDITORIAL |
O Globo |
31/8/2006 |
O documento apresentado pelo PT com as diretrizes de um eventual segundo governo Lula não escapa à síndrome da onipotência, muito comum aos textos desse tipo divulgados em campanhas eleitorais. O mundo visto pelas lentes desses documentos encharcados de ideologia, mas disfarçados de exercícios acadêmicos, é um mundo previsível, sob controle e prestes a distribuir bondades sem qualquer custo ----, a não ser o de ir às urnas e votar no candidato certo. O próprio presidente-candidato, ao separar o que são as "bravatas" oposicionistas dos imperativos do mais importante cargo executivo da República, já demonstrou saber que na vida real não é bem assim. Isso não impediu que o PT listasse um rosário de intenções - nem todas boas -, cuja execução se assemelha a um cavalo que parte a galope em todas as direções. Em 30 páginas, o partido, com os aliados PCdoB e PRB, expõe um projeto de governo que não fica de pé, por desafiar leis como a da gravidade. Quer o PT, ao mesmo tempo, expandir os gastos públicos, e por diversas formas - pelo custeio (salário mínimo, Bolsa Família etc.) e pelos investimentos -, reduzir a carga tributária e ainda cortar os juros. Assim como a adversária Heloísa Helena, os petistas confiam na redução da taxa básica do Banco Central (Selic) como fonte de financiamento da multiplicação milagrosa dos gastos. Impossível, pois, como os juros não obedecem a ordens de qualquer burocracia, o resultado da expansão dos gastos será a manutenção das taxas em níveis altos. É isso ou a volta com força da inflação, além do risco de fuga de divisas. No plano político, o programa parece investir contra a cláusula de barreira quando propõe "(...) assegurar a pluralidade de partidos". Mas, ao mesmo tempo, defende a "( ...) construção de maiorias necessárias à governabilidade". Se de fato for intenção do PT trabalhar para reduzir a cláusula de barreira, o partido terá produzido outra incongruência. Afinal, "maiorias necessárias à governabilidade" não rimam com pulverização partidária. PT e Lula têm protagonizado uma crônica de desencontros. Pode ser que este seja mais um, e o programa venha a ter a importância num segundo mandato proporcional ao tamanho com que a estrela do partido aparece na campanha da reeleição. |
Míriam Leitão - 'Bate, doutor'
Panorama Econômico |
O Globo |
31/8/2006 |
O candidato Geraldo Alckmin tem números e fatos na cabeça e recorre com freqüência à sua bem-sucedida experiência administrativa, mas ainda não tem programa. No calor da reta final, ainda não demonstra paixão. Quando alguém pergunta por um motivo para voltar para o Brasil, ele fala em política econômica. Quando tem os dez minutos finais para encerrar seu pensamento, ele conta uma história de Pindamonhangaba, que nem o favorece. E Alckmin mesmo conta que tem ouvido nas ruas um pedido: "Bate, doutor". É incompreensível um candidato de oposição não ter ainda alinhavado idéias do que propõe como alternativa ao povo ao qual pede votos. Por isso eu quis saber do candidato do PSDB-PFL por que alguém que lutou tanto para ser candidato não tem, a esta altura, um conjunto de idéias e propostas em nome das quais se candidatou. Ele disse que o programa será divulgado nos próximos dias em capítulos. Ao responder a Cora Rónai, Alckmin deu um escorregão: disse que José Serra perdeu a eleição em 2002 porque o povo queria crescimento e emprego. Jorge Bastos Moreno quis saber se era isso mesmo que ele tinha dito e ele confirmou: "É verdade." O candidato contou que tem ouvido de eleitores o mesmo pedido: - Bate, doutor. Ele acha que isso é prova de que a rua está virando; não vê como sinal de que deva mudar de estratégia de campanha por um tom mais agressivo. Disse que não é assim e prefere fazer propostas. Mas quais são elas, afinal? Alckmin promete um ajuste fiscal como fez em São Paulo, dizendo que isso permitirá a redução da carga tributária e da taxa de juros. Com o aumento do investimento, o país vai crescer num ritmo maior e isso criará um círculo virtuoso. Na entrevista do "Jornal da Globo", na segunda-feira, quando confrontado com a pergunta sobre de onde tiraria o dinheiro para ampliar programas como o Bolsa Família, ele respondeu que cada ponto de queda da taxa de juros significa R$8 bilhões não gastos. Essa é a mesma proposta da candidata Heloísa Helena: a queda dos juros produz dinheiro para todos os projetos. Perguntei se ele era contra a autonomia do Banco Central. - Eu sou a favor da independência do Banco Central - disse, e explicou que a queda dos juros será conseqüência de uma política fiscal mais austera que ele colocará em prática. - O programa do Lula é um engodo, e ele está avisando lá que vai aumentar os gastos - alertou e, nesse ponto, está coberto de razão. Derruba-se a taxa de juros como conseqüência de uma política fiscal mais dura, e o PT está avisando que sua proposta é de aumentar os gastos. Alckmin tem boas histórias de corte de gastos e de combate ao desvio de recursos públicos. - O que é o sanguessuga? É superfaturar o preço da ambulância comprada pelo poder público. Como se resolve isso? Com leilão eletrônico. Economizamos R$4 bilhões em três anos e meio. O governo queria comprar carros, avisava as montadoras, elas davam lances num leilão reverso e conseguimos uma redução de 25% no preço. Numa das histórias que contou do seu tempo de candidato a prefeito, Alckmin revelou que seu pai o criticou pelos ataques aos adversários: - Ele me disse que os possíveis equívocos dos meus adversários não aumentariam em nada as minhas qualidades. E eu guardei isso. Uma lição paternal sábia para várias ocasiões da vida, mas o momento - que ele mesmo define como sendo de desencanto com a política - exige mostrar os erros do governo para se reconstruir a confiança na política. Em um bom momento, Alckmin falou com desenvoltura e simpatia de um livro médico, recomendando a luz do sol da manhã como saudável e estabilizadora. Durante toda a entrevista citou, como contou o Ancelmo Gois, seis vezes Mário Covas, e o PSDB quase não recebeu referências. Ele é um candidato de uma ala do partido, ainda não reuniu o partido inteiro. A Flávia Oliveira, disse que fará a reforma tributária e contou, de novo, decisões que tomou em São Paulo, onde reduziu impostos e aumentou a arrecadação. A Tereza Cruvinel, avisou que não aceita a proposta de união com Lula. - Numa eleição, o vencedor governa e o perdedor fiscaliza. Gosto das coisas bem separadas. Na questão da segurança, ele tem, de fato, bons números. Conta que fez sete presídios de segurança máxima; enquanto o governo federal fez um. Abriu, junto com Mário Covas, 70 mil vagas no sistema prisional; e o governo federal, apenas 30. Os números são bons, mas não apagam a sensação de piora da questão da segurança que vem do cotidiano de medo da população de São Paulo após os ataques do PCC. Alckmin demonstra conhecimento administrativo, afinal governar bem São Paulo é uma experiência como a de governar um país, mas lhe falta paixão e senso de oportunidade como candidato. Quando um leitor perguntou, pela internet, que razão o candidato lhe daria para voltar a morar no Brasil, era a hora ideal para o discurso apaixonado pelo país que todo candidato que se propõe a ser presidente tem de ter. Ele deu uma resposta burocrática, repetindo receitas de política econômica. Quando o assunto é corrupção, às vezes, constrói frases sem sujeito. Faz tudo para fechar seus ouvidos ao conselho que ouve na rua: "Bate, doutor." |
Merval Pereira - Ainda com fé na virada
O Globo |
31/8/2006 |
Para quem está a ponto de perder no primeiro turno, o candidato tucano Geraldo Alckmin demonstra uma estranha fé na capacidade de alterar o quadro e chegar ao segundo turno contra Lula, o que seria um resultado que, por si só, já mudaria o panorama da corrida presidencial. Para um candidato que, como Lula, age como vencedor e já escolhe os ministros para o segundo mandato, seria um baque, até mesmo psicológico, ter que disputar um segundo turno. A certeza de Alckmin está baseada no ambiente das ruas, que já está mudando, disse ele ontem, na entrevista do GLOBO, mas também, e sobretudo, em um aparato tecnológico de pesquisas que indica que ele hoje está mais próximo dos 30% das intenções de voto do que dos 27% apontados no último Datafolha. Pela análise da equipe de campanha, se Alckmin atingir 32%, haverá segundo turno, desde que Heloísa Helena se mantenha na faixa de 10% em que está. O perigo é que ela desabe daqui para a frente. No acompanhamento de pesquisas, Lula teria hoje perto de 45% das intenções de voto, e não 51%, como apontado pelo Datafolha. A explicação para essa diferença seria que o espalhamento das suas pesquisas é menor que o da campanha de Alckmin, que faz pesquisas em 480 cidades em todo o país com duas mil entrevistas, enquanto o Datafolha faz entrevistas em 175 cidades, e o Ibope em cerca de 150. A coordenação da campanha de Alckmin tem um tracking (pesquisa telefônica) de mil entrevistas todo dia, saídas de uma amostra inteira de duas mil entrevistas que vão sendo substituídas. Considerado muito rápido pelos técnicos, o instrumento mede a tendência do eleitorado de um dia para o outro e detecta qualquer mudança de humor, muito mais do que as pesquisas eleitorais dos institutos, que demoram, entre fazer o campo de pesquisa e tabular, cerca de cinco dias. Há um outro tracking de três dias, e outro de quatro dias, para complementar as informações. Além disso, há pesquisas qualitativas em sete estados, sobre o programa de televisão, feitas por um sistema inglês de medição da reação do telespectador. A entrada do locutor no programa de terça-feira relembrando as acusações de corrupção contra o governo Lula "passou tranqüilo", na definição dos técnicos em comunicação da campanha de Alckmin, com um detalhe curioso: dos sete estados, só em São Paulo o locutor foi identificado com a campanha de Alckmin. Mesmo que, com o passar dos programas, esse tipo de intervenção volte a ser usado e identificado imediatamente com o tucano, não haverá problemas porque "a essência da crítica foi bem-recebida", está no limite da aceitação pelo eleitorado, o que é a grande preocupação dos coordenadores de comunicação da campanha. Apesar de ressaltarem que desde o primeiro programa Alckmin faz reparos ao governo Lula, seus comunicadores dosam os ataques para não ferir a suscetibilidade dos eleitores. Um exemplo define bem os cuidados: vou à sua casa pedir um favor (o seu voto), chego lá e começo a falar mal de uma pessoa de quem você gosta. A estratégia até o momento não mudará, como o próprio candidato revelou ontem. A intenção é criar a imagem do candidato junto ao eleitorado, e não simplesmente torná-lo conhecido. O objetivo é torná-lo conhecido pelas qualidades certas para levar o eleitor a mudar seu voto com segurança. Pelos cálculos de Alckmin, Lula hoje tem cerca de dez pontos percentuais que não são dele, são eleitores que estão com ele porque não conhecem o outro candidato, não têm certeza de que ele seja bom. A propaganda pretende criar no eleitor a idéia de que há uma alternativa, que não é arriscada. Convencê-lo, ao menos, de que os dois são bons, para depois, no segundo turno, marcar a diferença. Alckmin insiste em que a campanha ainda mal começou, e contou experiências suas e do ex-governador Mario Covas de virar campanhas eleitorais somente a poucos dias da eleição. Distorções das pesquisas eleitorais foram lembradas por Alckmin, como em 2002, em que, no dia da eleição, os institutos de pesquisa apontavam quase um empate triplo na disputa ao governo de São Paulo. Ao abrirem as urnas, deu 38% para Alckmin, 32% para José Genoino e 21% para Maluf. Pelos grupos qualitativos, há a certeza na campanha de Alckmin de que sua candidatura cresce, sendo mais bem avaliada em todos os sete estados nos últimos dias. Todos os atributos do tucano melhoraram, e ultrapassaram os de Lula, à exceção de dois. Hoje Alckmin já seria visto como o que tem mais capacidade para governar; o mais sincero; com mais condições de melhorar o sistema de saúde e de criar empregos. Lula ainda é visto como o candidato que tem mais visão dos problemas nacionais, e o que entende mais o problema dos pobres. Alckmin e seus marqueteiros esperam uma subida lenta, mas firme, que deverá ser detectada pelas pesquisas por volta do dia 15 de setembro. E especulam sobre qual será a reação de Lula no momento em que sua queda - que eles garantem já ser detectável - for apontada pelas pesquisas. Mas continuam apostando mesmo é nas urnas de 1º de outubro. Só lá saberemos com certeza se essas informações não passam de factóides, caracterizando o "estelionato eleitoral" de que falei ontem ou, ao contrário, retratam uma campanha de marketing tão competente que desbancou o que Alckmin classificou ontem de "uso descarado da máquina pública" em favor da reeleição do presidente Lula. |
Jânio de Freitas - Da boca para fora
Folha de S. Paulo |
31/8/2006 |
O "programa" lançado por Lula retoma com mais agressividade seu escapismo no assunto corrupção O NÍVEL de sinceridade na disputa pela Presidência teve uma pequena melhora, com os ataques desferidos por Lula, Alckmin e Fernando Henrique, como expressão, afinal, de sentimentos pessoais evidentemente reprimidos. Mas os respectivos argumentos em nada atenuaram a mediocridade, que já parece sem remédio, da atual campanha. O acerto da pontaria é feito com desrespeito acintoso aos fatos e ao eleitor. |
Eliane Cantanhede - No mesmo saco
Folha de S. Paulo |
31/8/2006 |
O senador Antero Paes de Barros está para o escândalo dos sanguessugas assim como o também senador Eduardo Azeredo está para o do mensalão. Eles metem o PSDB no saco de acusados e minam o discurso ético da oposição. |
Dora Kramer - ´Voto aberto protege eleitor´
O Estado de S. Paulo |
31/8/2006 |
Até pouco tempo atrás, o presidente da Câmara, Aldo Rebelo, não era um entusiasta do fim do voto secreto nas sessões do Parlamento. Para os casos de cassações, por exemplo, não tinha certeza de que o voto aberto seria garantia de punição. Ao contrário, poderia inibir suas excelências diante dos colegas acusados. A CPI dos Sanguessugas, entretanto, funcionou assim como a gota d´água que faz transbordar a represa da insatisfação social. Câmara e Senado envolvidos em acusações de roubalheira explícita é, de fato, uma situação insustentável. Uma vez basta |
Clóvis Rossi - Desfazendo a herança Lula
Folha de S. Paulo |
31/8/2006 |
A crise da Volkswagen -ou, mais exatamente, de sua unidade de São Bernardo do Campo, particularmente emblemática- acaba sendo todo um compêndio sobre a evolução da economia global e a involução do sindicalismo e da ação governamental. |
Celso Ming - Parcimônia adiada
O Estado de S. Paulo |
31/8/2006 |
Ocorte de 0,5 ponto porcentual nos juros básicos, que agora estão a 14,25% ao ano, adiou a série da parcimônia que o Banco Central vinha anunciando desde maio. |
Gasto com Bolsa Família cresce 60% em 1 mês
BLOG REINALDO AZEVEDO
PIB ruim do trimestre também assusta o Copom E DADOS S/PIB JUROS
PIB ruim do trimestre também assusta o Copom
BLOG REINALDO AZEVEDO
quarta-feira, agosto 30, 2006
Jefferson Pérez renuncia à vida pública e critica o povo
BLOG NOBLAT
Com mais quatro anos de mandato a cumprir e a eleição para a Presidência República a disputar na condição de vice do candidato Cristovam Buarque, o senador Jefferson Peres (PDT-AM) anunciou há pouco em discurso no plenário do Senado que abandonará a vida pública com a reeleição iminente de Lula.
- Estamos aqui no faz-de-conta. Como disse o Ministro Marco Aurélio (presidente do Tribunal Superior Eleitoral), este é o país do faz-de-conta. Estamos fingindo que fazemos uma sessão do Senado, estamos em casa sem trabalhar. Estou em Manaus há quase um mês recebendo sem fazer nada para o Congresso Nacional.
- Como se ter animação em um país como este com um presidente que, até poucas semanas atrás, até poucos meses atrás, era sabidamente – como o é – um presidente conivente com um dos piores escândalos de corrupção que já aconteceu neste país e este presidente está marchando para ser eleito talvez em primeiro turno?
- É desinformação da população? Não, não é. Se fizermos uma enquete em qualquer lugar deste país, todos concordarão ou a grande maioria que o presidente sabia de tudo; então votam nele sabendo que ele sabia. A crise ética não é só da classe política, não, parece que ela atinge grande parte da sociedade brasileira.
- Ele vai voltar porque o povo quer que ele volte. A democracia é isso. Curvo-me à vontade popular, mas inconformado. Esta será uma das eleições mais decepcionantes da minha vida. É a declaração pública, solene, histórica do povo brasileiro de que desvios éticos por parte de governantes não têm mais importância
- (...) Vou continuar protestando sempre, cumprindo o meu dever. Isso não seria justificativa para dizer que não vou fazer mais nada. Vou cumprir rigorosamente o meu dever neste Senado até o último dia de mandato, mas para cá não quero mais voltar, não.
- Um país que tem um Congresso desse, que tem uma classe política dessa, que tem um povo. Senador Antonio Carlos Magalhães, dizem que político não deve falar mal do povo. Eu falo, eu falo. Parte da população que compactua com isso, é lamentável. E que sabe, não é por desinformação, não. E que não é só o povão, não, é parte da elite, inclusive intelectuais.
- Compactuam com isso é porque são iguais, se não piores. Vou continuar nessa vida pública? Para quê?, Senador Antonio Carlos Magalhães, que é um pouco mais velho do que eu e vai continuar ainda. Mas, para mim, chega.
O adeus de Jefferson Péres (II)
PSDB, PFL, PMDB e PT lamentaram a decisão de Jefferson Péres (PDT-AM) de abandonar a vida pública. Mas se ele esperava alguma demonstração de indignação coletiva, enganou-se. Os governistas não gostaram nadinha do que ele falou sobre reeleger Lula.
Cristovam Buarque (candidato à presidência)
- A que ponto chegou a política em que um homem da estatura do Jefferson Péres foi empurrado a isso. Eu entendo as razões dele. Vou dar alguns exemplos do porquê o Jefferson Péres fez um discurso como esse. Na semana passada estive em João Pessoa e um jornalista fez uma pesquisa na rua sobre em quem as pessoas iam votar. Um entrevistado disse que votaria em quem estivesse solto no dia das eleições. E teve gente que disse que ele estaria solto porque corrompeu o juiz. Depois, o pronunciamento desses artistas sobre a ética é uma das gotas d’água que levaram o senador a isso. E em terceiro: o fato de o presidente estar se colocando como eleito por antecipação. Existem formas de dar o golpe e uma delas é se anunciar vencedor antes das eleições.
Arthur Virgílio (PSDB)
- Vamos fazer de tudo para que ele não largue a vida pública. Eu entendo que não dá para culpar o povo. O povo responde ao seu processo político próprio. A gente faz política com alegria e tristeza. O povo é este, é o meu povo. O que posso fazer?
José Agripino (PFL)
- Tem dois pontos: eu lamento muito se ele insistir nessa tese porque é uma das melhores figuras do Senado. Ele está verbalizando a indignação dos homens de bem deste país. Quem sabe esse gesto venha a acordar a indignação nacional?
Ideli Salvatti (PT-SC)
O Cristovam Buarque (cabeça da chapa de Péres) vira e mexe fala algumas coisas sobre preocupação com uma tendência autoritária do governo, uma tendência chavista. Tem coisa mais autoritária do que não reconhecer a vontade da população? Ou os iluminados acham que têm a idéia mais adequada e límpida e que o povo não vale de nada?
Hélio Costa (ministro das Comunicações)
Ele é absolutamente imprescindível, é uma referência política, ética e moral e para nós é sempre a visão da seriedade. Eu espero que esse pronunciamento seja apenas um reflexo de uma candidatura que não emplacou. Mas não pode discutir uma candidatura vitoriosa do presidente Lula.
CARLOS VEREZA Artistas e a ética
Artistas e a ética
Os poucos artistas que foram à casa do ministro da Cultura para manifestar apoio ao presidente da República são cidadãos informados e não ignoram os escândalos e a vergonhosa rapinagem praticada pelo PT nos cofres públicos. Assim sendo, ao votarem pela segunda vez no maior farsante de toda a história política brasileira, passam da condição de eleitores à de cúmplices, conscientes da lamentável desagregação ética e moral que assola o país.
CARLOS VEREZA (por e-mail, 27/8)
Livro mostra Lula xingando Kirchner, após beber três doses de uísque
CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA
O "Lulinha paz e amor", essa hábil construção do marketing político, desaparece entre a terceira e a quarta dose de uísque e se transforma em uma catarata de palavrões e ofensas a presidentes e países supostamente aliados.
É o que contam Eduardo Scolese e Leonencio Nossa, que cobrem o Palácio do Planalto para, respectivamente, a Folha e "O Estado de S. Paulo", no livro "Viagens com o Presidente - Dois Repórteres no Encalço de Lula do Planalto ao Exterior".
Scolese e Nossa relatam jantar na embaixada do Brasil em Tóquio, no final de maio de 2005, presentes cerca de 20 pessoas, todos brasileiros, no qual, após beber três doses de uísque e com a quarta ao meio, o presidente diz coisas como:
"Tem horas, meus caros, que eu tenho vontade de mandar o Kirchner para a puta que o pariu".
"Aquele lá [referindo-se a Jorge Battle, então presidente do Uruguai] não é uruguaio porra nenhuma. Aquele lá foi criado nos Estados Unidos. É filhote dos americanos."
"O Chile é uma merda. O Chile é uma piada. Eles fazem os acordos lá deles com os americanos. Querem mais é que a gente se foda por aqui. Eles estão cagando para nós."
Sobrou também para os fazendeiros: "Tem que acabar com essa porra de fazendeiros que toda hora vem pedir dinheiro ao governo".
O discurso, se é que pode se dizer assim, de Lula em Tóquio se deu no exato momento em que fracassavam os esforços do governo para impedir a CPI dos Correios, aquela que acabou expondo o mensalão e levou o presidente a dizer-se traído, sem no entanto apontar os traidores.
O livro de Scolese e Nossa, que acompanham o dia-a-dia palaciano há dois e três anos, respectivamente, relata uma brincadeira dos repórteres: perguntar, nas poucas vezes em que podiam se aproximar do presidente, quem era o traidor.
"Viagens com o Presidente" tem o grande mérito de tratar Lula -e, de quebra, uma porção de ministros e assessores- como pessoa física, ao contrário do que ocorre, habitualmente, no noticiário a respeito das atividades presidenciais.
O presidente (qualquer que seja) é apresentado apenas como a pessoa que faz discursos, assina atos, inaugura obras, reúne-se com seus pares e assim por diante. Dá a impressão de que não come, não bebe, não faz pipi, sexo ou qualquer outra atividade inerente ao ser humano.
Já na sua segunda página (fora os agradecimentos, o sumário e a apresentação), os dois repórteres contam, por exemplo, o primeiro diálogo entre Lula e Fernando Henrique Cardoso, no dia seguinte à vitória do petista em 2002.
Lula: "Fernando, como você faz para dar uma escapadinha?"
FHC: "É impossível, Lula...impossível...Aqui tem ajudante-de-ordens para todos os lados".
O Lula-pessoa-física que emerge do livro tem pouco ou nada a ver com o "paz e amor" do marketing. Ironiza auxiliares, pode ser bastante ríspido com eles e usa palavrões com uma freqüência fora do comum. Os auxiliares parecem não se incomodar. Ao contrário: "Ouvir um palavrão [do presidente] pode significar status" perante Lula, contam os dois repórteres.
O livro não é nem pretende ser um retrato acabado de Lula. Até porque as conhecidas dificuldades de acesso ao presidente permeiam boa parte das páginas. Mas mostra, sim, bastidores do funcionamento da Presidência que, no cotidiano do jornalismo, acabam sendo, na melhor das hipóteses, pé de página nos jornais.
Zuenir Ventura O Globo Os reforçadores de opinião
crer, ou da desinformação, como às vezes se desconfia? É indiscutível
que jamais as pessoas se informaram tanto quanto agora, em termos de
quantidade, rapidez e qualidade. Mas não sabe ao certo como são
recebidas as mensagens transmitidas sem cessar, a todo momento o que
aceitamos e o que rejeitamos. O debate ganhou atualidade diante de um
enigma que ainda não encontrou resposta: por que, apesar da avalanche
de denúncias da imprensa contra ele e seu governo, Lula continua à
frente das pesquisas, pelo menos até agora? Os jornalistas e
colunistas políticos mal disfarçam uma justa frustração e um certo
(re)sentimento de derrota. É como se todo o seu trabalho tivesse sido
inútil. De que adiantaram tantas críticas acusações? Quase como
consolo, costuma-se atribuir o fenômeno aos segmentos "menos
esclarecidos" da população, os que não lêem jornais.
Será que é isso? Além de ser uma alegação elitista, que lembra a
desculpa dos políticos quando perdem — a culpa é do povo, que não
sabe votar ela não se sustenta. Primeiro, porque Lula não chegou aos
50% das intenções de voto contando só com esses eleitores. Depois,
porque os tais segmentos podem não ter acesso aos jornais e à
internet, mas vêem televisão, e esta teve papel importante na
revelação dos escândalos. Não desconheciam o que a mídia divulgava.
Talvez conhecessem até demais.
Outro dia assisti a um seminário na Academia Brasileira de Letras em
que alguns colegas de profissão se dividiram quanto à questão. Houve
quem contrariasse a opinião predominante e afirmasse que, no fundo,
somos a sociedade da desinformação.
Um exemplo fez sucesso na platéia: "Se fôssemos da informação, Lula
não seria reeleito, seria preso." O debate foi proveitoso, mas não
desfez a dúvida, talvez porque o processo encerre um paradoxo.
Ao ser informativo em excesso, acaba desinformando.
A torrente de imagens, sons, palavras, idéias e conceitos emitidos
está chegando ao destino como ruído e não como mensagem. Informação
demais, como tudo, causa indigestão.
É uma hipótese. A outra é que nós, jornalistas, se não somos
irrelevantes, devemos, pelo menos, perder um pouco da nossa mania de
grandeza e da soberba de achar que fazemos a cabeça dos outros.
Em matéria de preferências políticas, há mais livre arbítrio do que
se pensa. Nada mais impróprio do que nos chamarem de "formadores de
opinião" (de minha parte, não formo nem na minha casa), quando não
somos nem "reformadores". No máximo, "reforçadores". Nunca soube de
alguém dizendo: "Penso assim, mas estou querendo mudar de idéia." Com
exceção dos indecisos, os que nos procuram é para confirmar uma
convicção, não para mudá-la.
Merval Pereira Sem alternativa
Os institutos de opinião, sem exceção, defenderam a tese de que Alckmin tinha uma possibilidade de crescimento muito maior que a de Serra, que atingira seu teto nas pesquisas do fim do ano passado, quando chegou a ultrapassar Lula. Ameaçando implicitamente criar uma dissidência dentro do PSDB contra a cúpula partidária e contando com pelo menos a benevolência, se não com o apoio velado dessa mesma cúpula, o ex-governador paulista conseguiu se impor como candidato, prometendo inverter a situação eleitoral “quando a novela mudasse de horário”, se referindo ao programa de propaganda gratuita no rádio e televisão.
Interesses pessoais superaram os partidários, idiossincrasias mais uma vez se impuseram no caminho da solução mais razoável, e o receio de partir para o tudo ou nada e ficar sem São Paulo e o governo federal na mesma tacada fizeram de Alckmin um candidato marcado para perder. Cristianizado já há algum tempo, muito por seus defeitos, mas também pelos defeitos de um partido que perdeu o rumo ao proteger seus membros envolvidos nos escândalos que denunciava, Alckmin está recebendo nas pesquisas eleitorais — e tudo indica que receberá nas urnas — a resposta à sua vaidade política, e corre o risco de se tornar uma figura patética ao repetir, a cada nova pesquisa desalentadora, que está em plena ascensão.
Pois quanto mais conhecido Alckmin se torna, mais rejeitado pelo eleitorado ele é, e mais empacado no mesmo lugar ele fica, sem foco e sem objetivos definidos. Do jeito que anda a coisa, sairá da eleição menor do que entrou, ou, quem sabe, do mesmo tamanho que sempre teve, um político regional que não tem a dimensão do cargo a que aspira.
Nos votos válidos da pesquisa CNT/ Sensus (descontados nulos, brancos e indecisos), Lula teria hoje 62,3%; Alckmin, 23,8%; Heloísa Helena 10,4%; e Cristovam, 1,9%.
Significa dizer que Lula já alcançou o percentual que obteve no segundo turno da eleição de 2002, de 61,3%, e Alckmin não agregou absolutamente nada à votação que Serra teve no primeiro turno de 2002, de 23,2% do eleitorado.
Se a média do PT era 30%, os números atuais significam uma derrota do PSDB como partido, que estacionou na casa dos 20% do eleitorado ou, na melhor das hipóteses, pela pesquisa Datafolha também de ontem, na faixa dos 30%.
O programa de Alckmin está bem avaliado, mas não funciona, seria eficiente para um candidato a governador, que é a experiência que ele tem. Teria que transformar Lula em Maluf, e nem tentou.
O sociólogo Ricardo Guedes, da Sensus, acha que, se os tucanos baterem em Lula com as denúncias já conhecidas, não vão mudar a tendência.
O que é conhecido já teria sido absorvido. O eleitorado que havia desistido de Lula depois dos escândalos voltou para ele porque o mercado eleitoral não ofereceu uma alternativa. Heloísa Helena traduziu esse voto de protesto em determinado momento, tirando inclusive mais votos de Alckmin, mas se perdeu no programa eleitoral, se apresentando de uma forma arcaica.
Ontem, na sabatina no GLOBO, Heloísa Helena foi confrontada com essa maneira arcaica de fazer política, a começar pelo linguajar empolado, até sua defesa do socialismo, mesmo que a longo prazo, e a conseqüente luta quixotesca contra os bancos e grandes corporações, sem compreender que a dívida interna é patrimônio da população de maneira geral, que coloca seu dinheiro em cadernetas de poupança e em fundos de investimentos, que a senadora insiste em classificar de especulação financeira.
Menos mal que deixou claro que não dará o calote, apenas reduzirá drasticamente os juros pagos. Se conseguir fazer isso de uma penada, sem provocar inflação e desequilíbrio fiscal e sem fuga de capitais e desenvestimento, terá dado uma contribuição relevante aos estudos econômicos, e provado na prática que existe uma grande conspiração contra o crescimento do país e a favor dos grandes lucros dos banqueiros.
Guedes acha que o eleitor tende a fazer o segundo turno já no primeiro, e por isso a maioria das eleições para governador vai terminar no primeiro turno, e a maior parte dos governadores será reeleita. Na percepção do eleitor, os ganhos macroeconômicos superam os problemas éticos que foram gerados: estabilidade da economia, geração de empregos, aumento do salário mínimo acima da inflação, queda do preço da cesta básica, programas sociais.
Hoje, apenas 18% acham que Lula pode ser responsabilizado pela corrupção e, desses, apenas 6% acham que ele teve participação direta.
A aparente apatia do eleitorado brasileiro seria, ao contrário, apoio ao governo Lula, não apenas resultado de políticas assistencialistas, como também de um bem-sucedido trabalho de convencimento da população de que não aconteceu nada além do que a corrupção normal da política brasileira.
Essa é uma questão que merece análise mais aprofundada, pois demonstraria que teve sucesso uma operação de dissimulação das atitudes do presidente da República que pode ter graves conseqüências para a democracia brasileira e gerar uma crise institucional num provável segundo governo Lula.
Miriam Leitão Dívida segundo HH
Dívida segundo HH
Publicada em 30/08/2006
A candidata Heloísa Helena se preparou para responder sobre dívida pública. Mas a resposta foi confusa. Ela disse que tem compromisso com a meta de inflação, mas não quis dizer se aceitaria que os juros subissem caso os preços subam. Afirmou que não acredita que a inflação subirá como não acredita em fuga de capitais. Avisou que ela não permitirá que o dinheiro saia.
Heloísa Helena está num daqueles momentos em que um político tem que manter seu discurso original, mas precisa não assustar os outros eleitores. Isso a fez dizer coisas que agradam a uns e outros. Disse que manterá as metas de inflação e tem compromissos com ela. Mas não a ponto de permitir a alta dos juros caso os preços subam.
Na verdade, ela não admite essa hipótese. Para a candidata, a inflação simplesmente não vai subir. Afirmou que os investidores não precisam temê-la e explicou que a dívida pública é um instrumento importante para o país, mas, quando eu perguntei se ela aplicava o dinheiro em dívida pública, respondeu de impulso:
— Eu não especulo.
Meu ponto é que Heloísa Helena sempre usa um excesso de adjetivos fortes e eloqüentes contra os banqueiros quando fala do assunto. Mas os grandes carregadores da dívida não são os banqueiros e, sim, os poupadores, pessoas e empresas que têm dinheiro aplicado em fundos garantidos por papéis públicos; metade da dívida pertence a esses poupadores e aos fundos de pensão. Pedi que ela deixasse de lado todos os adjetivos contra os banqueiros que sempre fazem tanto sucesso eleitoral e que me dissesse objetivamente qual era sua proposta para a dívida pública.
Heloísa Helena conseguiu falar alguns segundos sem adjetivos para, logo em seguida, acusar os “moleques de recado do capital financeiro internacional” e os “sabotadores do desenvolvimento brasileiro” pela alta taxa de juros.
Acha que, quando os juros caírem, haverá dinheiro para enfrentar todos os problemas brasileiros: a pobreza, a violência, o baixo nível educacional, o risco de os adolescentes se drogarem, a perversidade do sistema prisional, o risco das fronteiras. Será apenas o caso de baixar os juros e haverá dinheiro para tudo isso.
Claro que os juros precisam cair, mas a questão é como; por um ato de vontade presidencial? Ela disse que poderia ser por decreto, mas que não fará isso. Apenas estabelecerá que o país terá que crescer o dobro do que cresceu e os juros cairão para permitir esse crescimento. O risco de a inflação subir ela simplesmente descarta:
— Não acredito em risco inflacionário. O debate inflacionário é uma farsa técnica.
Ela usa a mesma expressão “eu não acredito” para afastar o risco de fuga de capitais. Garante que dá sua palavra de mulher e a segurança jurídica do país para garantir que não haverá calote. Diz, no entanto, que, se o investidor quiser sacar e levar o dinheiro para fora do país, ela não deixará, as leis do país não permitirão, nem haverá alternativa para o poupador.
Pelo seu raciocínio, o poupador, se sacar o que estiver poupado, não terá o que fazer com ele. Não poderá comprar dólares, porque o dólar ficará caro.
— Não temos outra alternativa; para crescer, precisamos tirar de algum lugar. Tiraremos dos juros e quem quiser receber seu dinheiro aplicado receberá, mas objetivamente vai ser impossível mandar para fora porque eu não vou deixar, nem haverá alternativa de aplicação.
Quando saiu da entrevista, um dos integrantes da sua campanha disse que sabia que essa seria a minha pergunta. De fato, era previsível, porque é o centro do raciocínio dela: a candidata pensa em tirar recursos para todos os seus planos da queda dos juros. De fato, eles precisam e têm chances de continuar caindo, mas não é desta forma que se faz política monetária.
A candidata está convencida de que os poupadores são especuladores, e que eles são apenas 0,005% da população brasileira e, na verdade, os aplicadores em fundos lastreados em título público são cerca de oito milhões de brasileiros pessoas físicas.
Ela explicou bem a diferença entre programa de partido e de governo. O primeiro é o objetivo último de um planejamento estratégico; o segundo é o que é possível fazer num primeiro momento. Exemplo: o PSDB defende o parlamentarismo, mas governou no presidencialismo.
Diz que seu sonho é o socialismo, que define apenas como sendo aquele momento lindo em que uma criança judia e uma criança muçulmana brincam juntas.
Tem razão quando diz que é contra a estatização do movimento social e é impagável quando ataca o governo com humor e se refere ao presidente Lula como “sua majestade barbuda”, ou quando, com mais gestos que com palavras, critica o estilo nada do candidato do PSDB.
Usa e abusa das frases cortantes e acusações e prefere as mais impessoais e genéricas, como esta:
— O Congresso Nacional é bandido quando o chefe do Executivo bandido é.
A cada ponto do discurso, Heloísa Helena invoca a sua condição de mulher e mãe. Ela o faz por estratégia bem pensada: são as mulheres que estão mais indecisas, são elas que fizeram seu crescimento recente, são as mulheres que têm a chance de parecer um fato novo na política brasileira que passa por um momento tão sem graça.
Mas concretamente a situação de Heloísa Helena é que, ao final desta eleição, ela pode estar sem mandato e sem partido. Seu PSOL está tendo uma extraordinária exposição, mas terá que cumprir a cláusula de barreira para sobreviver, o que dificilmente conseguirá. Em vez de renovar seu mandato, ela preferiu correr o risco. Colhe os louros de ter uma exposição que jamais teria se não fosse candidata.
AUGUSTO NUNES A noite dos velhacos
No Brasil, sabe-se há tempos, de onde menos se espera é que não vem nada mesmo. Neste começo de século, descobriu-se que, em temporadas eleitorais, o país se torna a cada semana mais cafajeste. A conjugação desses dois fenômenos rascunhou a comédia de maus costumes encenada neste agosto por figuras do, como direi?, mundo artístico.
O espetáculo foi apresentado na sala de visitas da residência carioca de Gilberto Gil, compositor, cantor, showman, pensador e, nos minutos que sobram, ministro da Cultura. Para que o elenco atacasse o enredo com segurança, o produtor de cinema Luiz Carlos Barreto resumiu o argumento para a platéia: "A política é um terreno pantanoso, a ética é de conveniência. Se o fim é nobre, os fins justificam os meios".
Animado com os sorrisos indulgentes, Barretão engatou uma quinta: "O que eu acho inaceitável é roubar. Mentir é do jogo político. Não é roubo". Muito simpático. Convidado de honra da noitada, o presidente-candidato Lula sentiu-se, desde logo, entre companheiros. Sentiu-se entre cúmplices ao ouvir a fala inicial do ator Paulo Betti: "Não vamos ser hipócritas: política se faz com mãos sujas".
(Convém reproduzir com precisão as bobagens que Betti diz. No esplêndido artigo Os bobos da Corte, a jornalista Dora Kramer, por exemplo, acrescentou um "só" às palavras de Betti, entre "política" e "se". Amuado, nosso galã de meia idade reivindicou a correção: a consoante e a vogal, alegou, conspiravam para alterar o sentido do que dissera. Pois releiam a frase. Com ou sem "só", é exemplarmente torpe).
A ousadia de Betti foi a senha para estréia do músico mineiro Wagner Tiso como coadjuvante em montagens teatrais obscenas. "Não estou preocupado com a ética do PT", solfejou o menos famoso de qualquer parceria. "Acho que o PT fez um jogo que tem que fazer para governar o país".
Tradução da partitura: roubalheiras no Executivo, gatunagens no Congresso, a patifaria promovida a forma de arte política - nada disso agora tem relevância para o compositor que se esvaía em lágrimas com clubes de esquina e corações de estudantes.
Estabelecido o império da pouca-vergonha, o ator José de Abreu cuidou do epílogo: homenageou explicitamente os companheiros José Dirceu, José Mentor e José Genoino. Todos Josés - tanto o autor quanto os alvos da homenagem. É um quarteto e tanto.
O Dirceu foi acusado pelo procurador-geral da República de chefiar a "organização criminosa sofisticada" forjada no Planalto. O Mentor ampliou notavelmente o prontuário como relator da CPI do Banestado e comparsa de Marcos Valério. O Genoino, uma das estrelas do maior escândalo da história da República, evadiu-se da presidência do PT depois que o assessor do irmão foi capturado com dólares na cueca. Abreu, o quarto José, mereceria ser boicotado pelos critérios da decência se já não tivesse sido condenado à obscuridade por insuficiência de talento.
Como José de Abreu, também Paulo Betti e Wagner Tiso não sabem o que é sucesso desde os tempos em que o basquete brasileiro ganhava títulos internacionais. Sobrevivem com patrocínios extorquidos de empresas estatais e favores concedidos pelos governos. Nenhum deles é mais o garotão dos bons tempos. Na pátria da juventude a qualquer preço, é compreensível que estejam preocupados com o envelhecimento.
Homens assim envelhecem mal. Às vezes, nem envelhecem: sem escalas, passam de moços a velhacos.
CELSO MING O Programa de Lula
celso.ming@grupoestado.com.br
Na área econômica, o Programa de Governo do presidente Lula é um encadeamento de omissões, de simples declarações de intenção e de generalidades destituídas de metas claras.
Uma dessas omissões está logo na página 7, quando acusa o governo anterior de “privataria” porque “entregou grande parte das empresas estatais em processos marcados por graves denúncias de irregularidades”. Se as denúncias são tão graves, por que o governo Lula não as investigou? E, se as investigou o suficiente para concluir que produziram “privataria” - seja lá o que isso signifique -, por que não a denunciou à Justiça e ao povo brasileiro? E se foi tão nefasta para o País, por que não a reverteu?
O discurso do presidente Lula pronunciado quinta-feira por ocasião da última reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social tem mais projeto e mais conteúdo econômico do que esta lengalenga. No pronunciamento, pelo menos está a promessa reafirmada pelo presidente de seguir combatendo a inflação: “Meu compromisso com a inflação baixa é definitivo, eu vou repetir, o meu compromisso com a inflação baixa é definitivo.” Por que esses termos não foram incorporados ao novo documento?
Fala de desoneração tributária, mas não de reforma tributária. Não reconhece que a carga tributária ficou insuportável nem como atacar a gastança do governo federal, que vem aumentando substancialmente acima do crescimento do PIB.
Menciona, sim, a necessidade de reforma sindical, mas não diz em que direção. Fala em melhorar a gestão da Previdência, mas no texto não há nem sombra da necessidade de aprofundamento da reforma. Em nenhum momento assume que é preciso aumentar a contribuição e reduzir o benefício para o aposentado.
Sustenta que “o País está ingressando em um novo ciclo de desenvolvimento”, mas não deixa claro como isso se fará. Promete políticas industriais, as mesmas de sempre: “ênfase nos setores difusores de tecnologia, tais como software, semicondutores, fármacos, medicamentos e bens de capital, assim como em áreas estratégicas como nanotecnologia, biotecnologia e biomassa”. A maioria dessas políticas foi anunciada já em 2003, mas ficou por aí, quase inteiramente emperrada. Se haverá a retomada dos projetos, faltou dizer por que não avançaram até agora.
Em abril, o PT divulgou suas “Diretrizes para a elaboração do programa do governo do Partido dos Trabalhadores - eleição presidencial de 2006”, o ensaio para o documento ontem divulgado.Lá foram feitas fortes críticas à política econômica desta administração: “A obra do governo Lula é parcial, desigual e incompleta”. E o PT pediu mudança de rumo na economia. Para o Banco Central, exigiu um duplo mandato: “Além de ser o guardião da moeda, deve igualmente preocupar-se com o crescimento, o emprego e o bem-estar social” - ficou registrado no documento. Mas o Programa do Presidente Lula não reconhece erros da política econômica. Aparentemente, o presidente desautorizou as críticas. Sobre a proposta de dar autonomia operacional ao Banco Central, não há uma única palavra. Nem contra nem a favor.
Promete o fortalecimento da política de exportações, mas em nenhum momento indica como pretende enfrentar a firme tendência à valorização do real. Enfim, a atual política cambial, objeto unânime das críticas dos economistas de esquerda, não é tema que mereceu consideração.
Para multiplicar as exportações, todos sabemos, é preciso acesso aos mercados e isso não acontecerá sem novos acordos comerciais. O Programa insiste em “privilegiar a integração sul-americana - o Mercosul e a Comunidade Sul-americana de Nações” - e ignora a necessidade de buscar novos mercados onde eles realmente existem. Nem mesmo se menciona a necessidade de dar urgência às negociações comerciais entre o Mercosul e a União Européia.
A maioria dos objetivos na área energética já está definida ou é conseqüência de decisões já tomadas. Mas o documento os enuncia como novidade.
Finalmente, o Programa de Governo se compromete com o projeto de “democratização dos meios de comunicação”, sem explicar o que pretende com isso. Pelo cheiro da brilhantina, trata-se de produzir bovina subserviência dos meios de comunicação ao futuro governo Lula.
E isso não consegue esconder o projeto autoritário de amolecimento de corações e mentes.