editorial |
O Estado de S. Paulo |
24/5/2006 |
Estado-cliente da Venezuela de Hugo Chávez, a Bolívia de Evo Morales se comporta com desenvoltura de grande potência no seu contencioso com o Brasil - e não perde oportunidade de carregar nas tintas desse quadro surrealista. Anteontem, em Brasília, numa reunião com uma centena de líderes evangélicos, o presidente Lula pediu orações para a Bolívia, "um país muito pobre, que precisa de ajuda" - quando são as relações do Brasil com o país vizinho que precisam urgentemente de intervenção divina para voltar aos eixos. A falência dos recursos diplomáticos convencionais, no caso, ficou de novo patente nesse mesmo dia em La Paz, onde o chanceler Celso Amorim se reuniu, na presença do seu homólogo boliviano David Choquehuanca, com o presidente Morales. O titular do Itamaraty fez o que pôde para que os seus interlocutores entendessem que o Brasil não considera águas passadas a forma como Morales nacionalizou o gás e o petróleo bolivianos - sem avisar o "irmão mais velho" Lula da Silva e com a ocupação militar de uma instalação da Petrobrás, para esfregar sal na ferida alheia e se mostrar muy macho perante os seus. "O presidente Evo Morales sabe o que pensamos", afirmou Amorim numa entrevista, "e (conhece) a sensibilidade desse assunto para o Brasil." Ainda assim, o diplomata viajou a La Paz não para externar indignação, mas para restabelecer a "racionalidade", como tem dito, no relacionamento bilateral. Para isso, moveu duas peças: recusou-se a discutir a questão técnica do preço de gás ("o importante é o enquadramento político") e deixou consignado que Brasília demanda que a Petrobrás seja indenizada. No entanto, ouviu publicamente de Choquehuanca que o seu governo não arreda pé do argumento de que a Petrobrás já obteve o retorno dos seus investimentos, não havendo assim por que indenizá-la caso as negociações com os seus interlocutores bolivianos levem a nada até a data fatal de 1º de outubro, obrigando a empresa a sair do país. As contas da estatal passarão por uma auditoria boliviana - e não de especialistas independentes, como quer Amorim -, cujos resultados não são difíceis de prever. Além disso, o chanceler saiu de mãos abanando também da discussão sobre o futuro dos 2 mil agricultores e extrativistas brasileiros sem titulação comprovada das áreas que ocupam na região fronteiriça de Pando, do outro lado do Acre. Enquanto Amorim fala em resolver essa outra questão "de forma construtiva" - nem sequer precisando lembrar que muitos dos 80 mil bolivianos em território brasileiro são "indocumentados", como se diz eufemisticamente nos Estados Unidos -, Choquehuanca foi curto e grosso. "Os ilegais, sejam brasileiros ou bolivianos, terão de ser desalojados", avisou na entrevista à imprensa, ao lado de Amorim. O governo de La Paz se comporta como o do imaginário país da clássica comédia de Hollywood, O rato que ruge, por ter tomado gosto pelos petrodólares do coronel Hugo Chávez, convertendo a Bolívia em satélite venezuelano. A estatal Petroleos de Venezuela (PDVSA) se prepara para participar de quase toda a cadeia do setor boliviano de hidrocarbonetos. A empresa poderá investir no país até US$ 1,5 bilhão - ironicamente, o mesmo valor que a Petrobrás aportou ali. Além de servir para desalojar a Petrobrás, o dinheiro venezuelano irrigará outras atividades e programas sociais na Bolívia, como será anunciado esta semana em La Paz, na terceira visita de Chávez ao país desde a posse de Morales, em janeiro. Tamanho o pouco-caso do coronel com o que possa achar o presidente Lula que ele convidou representantes de grandes empresas brasileiras a acompanhá-lo nessa viagem, noticiou ontem o jornal Valor. Numa reunião reservada, no Itamaraty, os empresários foram informados de que a iniciativa causou profunda irritação no Planalto. Trata-se, de fato, de um acinte: caso as empresas invistam na Bolívia, Chávez - e não Lula - é quem ficará com a paternidade de uma iniciativa favorável ao desenvolvimento boliviano. Não por acaso, as grandes firmas abordadas têm interesses na Venezuela ou pretendem fazer negócios no país. Tivesse o governo brasileiro reagido com a devida firmeza quando Morales o deixou com a cara no chão ao assinar em 1º de maio o seu "decreto supremo", a crônica das relações do Brasil com a Bolívia e a Venezuela não seria a da humilhação dessas três semanas - do que a ida do chanceler Amorim a La Paz foi apenas mais um capítulo. |
Entrevista:O Estado inteligente
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quarta-feira, maio 24, 2006
Humilhação continuada
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