O Estado de S. Paulo |
2/4/2008 |
O Dia da Mentira lembrado ontem passou a impressão de ter-se transformado em Dia da Virada. Talvez tenha sido o dia em que, depois de nove meses de braba crise financeira, surgiu a primeira sensação global de que o fundo do poço pode ter sido ultrapassado. Se foi isso ou não ainda há de se ver. O importante é que corações e mentes amarrados à sina do mercado financeiro estiveram predispostos a ver assim. Enfim, ontem pode ter sido dia de recuperação da confiança, a alma do mercado financeiro. Dois grandes bancos globais, cujas sedes não estão nos Estados Unidos, mas na Europa, acusaram fortes perdas em conseqüência da crise e das opções feitas por seus administradores. O Deutsche Bank, maior banco da Europa, anunciou o segundo rombo trimestral, de US$ 3,9 bilhões (o do trimestre anterior havia sido de US$ 3,6 bilhões). O União de Bancos Suíços, outro gigante global que há semanas teve de se submeter à forte injeção de capital de US$ 11,5 bilhões, reconheceu que foi obrigado a extirpar do seu balanço outros US$ 19 bilhões em ativos podres (o corte do trimestre anterior havia sido de US$ 19 bilhões). Além disso, anunciou nova subscrição de capital por fundos soberanos da Ásia e a retirada do atual presidente, Marcel Ospel. Uma terceira instituição financeira, o Lehman Brothers, banco de investimento dos Estados Unidos que na semana passada era tido como sério candidato à bancarrota, avisou que está preenchendo seu rombo com uma bolada de US$ 4 bilhões em capital novo, obtida por meio de lançamento de ações preferenciais. Mais do que isso, a oferta foi disputada com avidez e sobraram interessados. O mercado olhou mais para a recapitalização dos bancos do que para as perdas reconhecidas. E comemorou com alta nas bolsas. Por trás desse entusiasmo parece estar a percepção do investidor de que desta vez há chão mais firme sob os pés. Já não é mais a queda livre no desconhecido que perpassava o mercado até há algumas semanas. Não há nenhum elemento seguro que garanta o fim próximo da crise, mas o investidor parece propenso a acreditar nisso. Dois fatos contribuem para isso. O primeiro deles foi o resgate do Bear Stearns no último dia 17 pelo banco central americano (Fed) e sua entrega ao JP Morgan para que seus contratos fossem honrados. Até então, o pesadelo eram as iminentes quebras dos bancos. Mas ficou claro que os bancos passaram a ser importantes demais para naufragar. Uma enorme incerteza começou a ser eliminada. Houve também o anúncio do pacote de controles do sistema financeiro americano, ainda a ser decidido pelo Congresso. O volume de críticas mostra que as discussões estão apenas começando e que o processo de aprovação de novas exigências será demorado. Mas a iniciativa parece ter vendido à sociedade a idéia de que afinal cabresto e freio vão controlar a montaria. Verdade ou coisa de 1º de abril ? Início do fim da crise ou só uma safrinha de ilusões? Depende da qualidade da nova confiança, ainda a ser testada.
Confira Estreitou - A tabela mostra como o superávit comercial (exportações menos importações) está sendo achatado. Nos três primeiros meses de 2008, as exportações cresceram 15,6% e as importações, 44,1%. |