sexta-feira, dezembro 21, 2007

Cesar Maia vai responder por crescimento de favela

Salvem o cartão-postal

O Morro Dois Irmãos, no Rio, está ameaçado por
uma favela. É preciso derrubá-la imediatamente


Silvia Rogar

Hipólito Pereira/Ag. Globo
A encosta do Dois Irmãos hoje, com a favela de 950 casas (no círculo vermelho)...
Montagem com foto Hipólito Pereira/Ag. Globo
...e como poderá ficar daqui a alguns anos, na montagem de O Globo, se a monstruosidade continuar a crescer no ritmo atual

A favelização do Rio de Janeiro avançou de maneira desenfreada por uma série de fatores sobejamente conhecidos. Mas a maior causa dessa tragédia urbana é a demagogia dos políticos. Em troca de uma avalanche de votos, eles foram deixando os morros da cidade ser tomados pelos barracos. Essa irresponsabilidade, que já atravessa décadas, está estampada agora num dos principais cartões-postais da cidade: o Morro Dois Irmãos, no Leblon. Além de ser um dos mais belos cenários do Rio, ele abriga uma grande área de preservação ambiental e é patrimônio paisagístico tombado pela União desde 1973. Nele, a favela Chácara do Céu cresce a olhos vistos. De qualquer ponto da orla, pode-se enxergar a massa de construções irregulares. A novidade é que o Ministério Público estadual decidiu entrar em campo e responsabilizar não só o município como o prefeito Cesar Maia, por não ter barrado a degradação do Dois Irmãos. O MP instaurou inquérito, há um ano, para apurar o caso e entrará com uma ação civil pública, em janeiro, citando nominalmente o prefeito. Desde meados do ano passado, será a terceira acusação de improbidade administrativa sofrida por Maia num processo que tem como objeto a favelização da cidade e o descaso com o meio ambiente. As duas anteriores ainda não foram julgadas.

A Chácara do Céu ainda está longe de exibir o tamanho da favela do Vidigal, que domina o lado esquerdo das imagens que ilustram esta reportagem. Mas, se continuar crescendo no ritmo atual, ocupará toda a encosta verde do Dois Irmãos, como se vê na montagem (foto de baixo) feita pelo jornal O Globo. Estima-se que a favela tenha triplicado desde 1998, até chegar aos atuais 950 barracos. Por lei, o prefeito deve pôr abaixo obras irregulares durante a construção. Ou seja, se tivesse agido a tempo, poderia ter interrompido o crescimento da ocupação. Remover as casas depois que a população já se estabeleceu, como a história já provou, é um processo mais complicado. "Embargar uma obra irregular, multar e demolir, nessa situação, não deveria levar mais que um mês", diz o promotor Carlos Frederico Saturnino, responsável pela ação. O MP também constatou que caminhões com material de construção circulam com desenvoltura no Parque do Penhasco, uma área de 400 000 metros quadrados com trilhas e mirantes. Confrontado com o absurdo, Cesar Maia, como bom político brasileiro, esquivou-se. "Uma extensa bibliografia demonstra que o processo de ocupação irregular dos morros do Rio tem três causas básicas: a ausência histórica de transporte de massa, a inexistência de casa subsidiada para baixa renda e os baixos salários", escreveu ele, na terça-feira passada, em seu Ex-Blog – uma espécie de newsletter remetida aos cadastrados no seu site. Em seguida, conclui: "Somente a esfera federal tem instrumentos para enfrentar as três causas".

É preciso que a favelização do Morro Dois Irmãos seja interrompida imediatamente. E que os barracos já erguidos sejam demolidos quanto antes. A prefeitura tem, sim, meios legais para fazê-lo. Entre eles, aqueles que regulam o uso do solo, a fiscalização de construções e a conservação de reservas ambientais. "Ou Cesar Maia desconhece a legislação que tem em mãos, o que é grave, ou tem razões populistas para não usá-la", diz Cezar Honorato, professor e coordenador do Observatório Urbano da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Permitir que os barracos dominem a paisagem do Leblon é um crime monstruoso. Mexam-se, cariocas, salvem o que é seu.