Em sua mais recente aparição pública desde que caiu doente, Fidel Castro usou um terço de um artigo publicado no jornal oficial Granma para bombardear o programa brasileiro do etanol. Tomando por base documentário de dois cineastas brasileiros (Maria Luisa Mendonça e Tiago Thorlby) sobre as condições de produção e trabalho nos canaviais, Fidel Castro sentenciou: 'É preciso desmistificar a propaganda sobre os supostos benefícios dos agrocombustíveis. No caso do etanol, a cultura e o processamento da cana-de-açúcar contaminam os solos e as fontes de água potável, porque utilizam uma grande quantidade de produtos químicos.' O bombardeio é estendido às condições de trabalho na colheita da cana: 'Trabalham sem registro formal, sem equipamento de proteção, sem água ou alimentação adequada, sem acesso aos banheiros...' Estranhamente Fidel não citou as queimadas de canaviais, fenômeno que propaga poluição e causa danos ao meio ambiente. Seria porque Cuba também faz uso das queimadas? Fidel Castro imita o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, que se tem dedicado à missão de condenar o Brasil e o presidente Lula por ter aqui recebido o presidente dos EUA, George Bush, e com ele acertado um acordo para desenvolver o mercado de etanol no mundo. Quando governantes são movidos pelo ódio político-ideológico em decisões que requerem pragmatismo e inteligência, quem sofre é a população. Como dirigente de um país que cultiva a cana-de-açúcar há mais de um século, Fidel Castro sabe muito bem que os efeitos poluentes da produção do álcool, além de serem quase nada, comparados aos combustíveis fósseis, são facilmente superados pela ação preventiva do homem. O mesmo princípio vale para as condições de trabalho dos cortadores de cana: no Brasil são duras, mas têm tudo para melhorar com a mecanização e a expansão do mercado de etanol. A União Européia, por exemplo, já anunciou que vai criar uma lei exigindo de exportadores de biocombustíveis certificados de sustentabilidade ambiental e de condições dignas de trabalho para o produto entrar nos 27 países do bloco. É uma iniciativa a que o Brasil se deveria antecipar e assumir a liderança. Se, em vez de se ocupar em 'desmistificar a propaganda sobre os benefícios dos agrocombustíveis', cuidasse de aumentar o plantio de cana e construir novas usinas de etanol em Cuba, Fidel Castro trabalharia mais em favor de seu povo, gerando empregos, renda, riqueza e divisas e levando aos cubanos os benefícios do progresso da expansão do mercado de agrocombustíveis no mundo. Mas, não, ele prefere ficar contra seu país e desqualificar os agrocombustíveis só porque os EUA anunciaram um programa ousado de substituição de gasolina pelo álcool. A China aprendeu com o passado a não usar de forma errada a ideologia e há anos sua economia cresce continuamente à taxa de 10%. No final dos anos 70, quando o país era governado pela viúva de Mao Tsé-tung, a produção agrícola era achatada, reprimida por motivações ideológicas burras: o camponês tinha sua produção limitada à cota que entregava ao Estado e era impedido de possuir mais de três galinhas, um galo e um porco, 'para não despertar a ambição de riqueza'. Pois bem, com a abertura econômica iniciada por Deng Xiaoping, o governo destravou as amarras ideológicas, criou um mercado livre para agricultores que ultrapassassem a cota do Estado e a produção agrícola explodiu, cresceu 60% em cinco anos, gerou renda, emprego, riqueza e comida. Na segunda-feira, o governador de São Paulo, José Serra, assinou acordo com a União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica) que representa um passo à frente para modernizar o setor de açúcar e álcool e lhe tirar a pecha de usar métodos feudais nas relações de trabalho e no que diz respeito ao meio ambiente: as indústrias comprometem-se a expandir as áreas mecanizáveis e eliminar as queimadas até 2014. O efeito negativo é que a substituição do homem por máquinas colheitadeiras vai produzir desemprego. Mas ali o emprego é de má qualidade, o trabalhador precisa cortar, no mínimo, 6 mil toneladas/dia e trabalhar 12 horas para garantir remuneração de R$ 1 mil/mês. A tendência é ele migrar para outra lavoura.