terça-feira, fevereiro 27, 2007

Os novos senhores do universo

Os novos senhores do universo

Artigo - Vinícius Torres Freire
Folha de S. Paulo
27/2/2007

Gestoras de "private equity" relançam onda de aquisições bilionárias e são acusadas de "rapinar" empresas

"SENHORES DO universo" é uma caricatura conhecida da cúpula da finança americana. Houve a "charge" mais refinada de Tom Wolfe, que cunhou o termo "the masters of the universe" em "A Fogueira das Vaidades". Uma versão ainda mais pop é a do folhetim filmado de Oliver Stone, "Wall Street". Vinte anos depois desses retratos do dinheiro grosso e das grossuras do dinheiro, a figura do capitalista malvado e rapinador de empresas reencarnou nos donos das empresas gestoras de fundos de "private equity". Elas batem recordes sobre recordes em aquisições bilionárias de empresas, em parte devido à grande oferta de dinheiro barato no planeta, também conhecida como "abundância de liqüidez".
Há o rumor de que empresas de "private equity" preparam-se para comprar a Dow Chemical, a maior fabricante de produtos químicos dos EUA, por US$ 54 bilhões. Ainda ontem estava para ser fechado o negócio recorde das "private", a compra da TXU, empresa de energia do Texas, por US$ 45 bilhões (incluindo a dívida), levantados pela KKR e pela Texas Pacific.
O recorde anterior era de fevereiro, quando a Blackstone comprou a Equity Office Properties, do setor imobiliário, por US$ 39 bilhões. Simon Schwarzman, da Blackstone, foi chamado de "novo rei de Wall Street" pela revista "Fortune". Dias depois da aquisição, fez aniversário com festa animada por Rod Stewart.
O que fazem as megaempresas de "private equity"? Levantam fundos, emprestam dinheiro e arrebanham investidores como fundos de pensão ou seguradoras a fim de adquirir e controlar o capital de uma empresa (que deixa de ser "pública", com ações negociadas em Bolsa, para ser "private", "privada", de capital fechado, grosso modo). E daí?
Sindicalistas e políticos na França, Alemanha e Reino Unido começaram a chiar contra as empresas de "private equity". Argumentam que se trata de "capitalistas abutres".
Isto é, compram as empresas a fim de demitir em massa e de obter incrementos de produtividade de maneira duvidosa (por vezes por meio de endividamento excessivo e do enfraquecimento das perspectivas de crescimento de longo prazo da companhia). O objetivo das "private equity" é obter retornos muito maiores que os do mercado e cobrar taxas de administração tidas como altas no mundo rico (1,5% a 2%) -ganham mais quanto maior o negócio. Depois de uns cinco anos de vampirização, segundo os críticos, as empresas são vendidas.
Quem pinta retratos malévolos das empresas de "private equity" gosta de associá-las aos "hedge funds". Tais fundos financiam direta e indiretamente operações das "private equity". Ou reduzem custos da transação, criando, por exemplo, instrumentos financeiros que pulverizam o risco de crédito dos bancos que emprestam dinheiro para as aquisições de empresas.
Os "fundos de hedge", fundos de investimento que lidam com mais de US$ 1,5 trilhão, trabalham com instrumentos financeiros obscuros e tidos como de alto risco. Nicolas Sarkozy, candidato da direita à Presidência da França, outro dia lançou a proposta de "taxar esses capitais especulativos", os dinheiros dos "hedge funds". "Sarkô" foi ignorado por governos europeus e dos EUA, que recentemente descartaram a hipótese de regular de modo mais rígido tais fundos.
Risco real? Ainda obscuro. Firmas de "private" e "hedge funds" armam enormes operações financeiras em cadeia, as quais poderiam desmoronar de modo abrupto caso as empresas adquiridas não venham a alcançar o retorno e o preço de venda esperados -como ocorreria numa recessão. O tsunami bateria em vários mercados financeiros, ora interconectados pelos "hedge funds".

vinit@uol.com.br