sábado, fevereiro 24, 2007

CLÓVIS ROSSI O risco-país, o de verdade


SÃO PAULO - O risco-país caiu anteontem a seu nível mais baixo de todos os tempos, certo? Certo apenas para a pátria financeira. No Brasil real, transfiro a análise de risco-país para o pungente grito d'alma da cantora Joyce, lançado há uma semana em seu blog.
"Eu deveria estar falando aqui das alegrias que a gravação de um novo disco tem-me dado. Da música, dos músicos, do som, tudo de bom. Mas hoje não dá, hoje não posso.
Até aqui cheguei. Esta não é mais a minha cidade, este não é mais o meu país. Este não é mais o meu lugar no mundo, como eu pensava que fosse. O Rio de Janeiro que amamos, e pelo qual trocamos as mais tentadoras ofertas de vida em outras paragens, não é mais a cidade onde eu pretendia envelhecer e morrer. O Rio era do Tom (...). O Rio era meu também, não é mais.
Hoje, pela primeira vez em muitos anos, pensamos seriamente em ir embora. P'ra onde, não sabemos, mas dentro do Brasil não será. Pois o Rio é a vanguarda de tudo, e o que acontece aqui hoje vai acontecer amanhã ali mais adiante. Minha casa está em perigo. Minha família também. Tom tem 14 anos e meio e começou a sair sozinho na rua há um ano.
Já foi assaltado duas vezes, felizmente sem maiores conseqüências -mas não posso achar que isso seja normal. Um adolescente tem de ter o direito de ter uma cidade para chamar de sua, conhecer suas ruas e seus caminhos, ir p'ra escola e voltar p'ra casa sem que nenhum mal lhe aconteça. Tenho visto adultos fazendo o sinal-da-cruz ao sair de casa, como antigamente eu só via as pessoas fazendo ao entrar no mar ou no palco, que são sabidamente lugares de risco.
Não se trata mais apenas de violência e crime. Atravessamos a fronteira da humanidade, da civilização, do inominável. A treva tomou conta da luminosa e inútil paisagem. Minha alma chora."