Celso Ming - Beleza de plantação! |
O Estado de S. Paulo |
25/11/2006 |
Há apenas dois meses, os prejuízos no agronegócio eram responsabilizados pela irritação com que a candidatura Lula era tratada no Centro-Sul. De lá para cá, muita coisa mudou e aparentemente falta pouco para a euforia voltar. Tudo começou em setembro, com a virada dos preços internacionais. O trigo puxou a disparada. As quebras de safra na Austrália e na Argentina serviram como senha para uma espetada nas cotações. Ao final de agosto, estavam a US$ 3,80 por bushel (27,2 kg). Ontem, fecharam a US$ 5,00 por bushel, alta de 31,6%. Como o trigo forma com o milho e a soja a base da produção de rações animais, os preços dos três grãos se influenciam. O Departamento de Agricultura dos Estados Unidos passou a alertar que o comércio de carnes deve crescer - em boa parte por causa do fim do embargo a mercados que há meses apresentaram focos de doenças, como febre aftosa e gripe aviária. É o que tem puxado a procura por rações. Além disso, o milho passou a ter um mercado novo. Nos Estados Unidos, é cada vez mais usado como matéria-prima para a produção de etanol (álcool) para mistura com gasolina, o que ajuda a explicar o salto ainda maior dos preços. Ao final de agosto, era negociado a US$ 2,35 por bushel (25,4 kg) e passou para US$ 3,69 ontem, avanço de 57%. As cotações da soja (veja gráfico) pegaram carona nas do trigo e do milho. Em setembro, era negociada a US$ 5,52 por bushel (27,2 kg). Agora está nos US$ 6,84 por bushel (alta de 23,9%). Como uma coisa puxa a outra, o efeito etanol deverá levar os agricultores americanos a reduzir a área plantada de soja e a aumentar a de milho. O principal resultado disso pode ser certa queda da produção americana a ser colhida em meados de 2007. Esse novo astral passou como um arrepio pela agricultura brasileira. O mercado de fertilizantes reflete a virada. Apenas em outubro, foram entregues ao produtor 3,4 milhões de toneladas de fertilizantes, um recorde para o mês. Eduardo Daher, presidente da Associação Nacional para Difusão de Adubos (Anda), avisa que o setor não está dando conta das entregas. Isso demonstra que o produtor está correndo para plantar mais ou para investir em mais resultados, com reforços nas aplicações de adubos. Em princípio, prognósticos melhores deveriam impulsionar também as vendas de cultivadores e colheitadeiras. Mas, nesses segmentos, as vendas continuam em queda - diminuíram 40,9% e 19,2% em outubro, respectivamente, em relação ao mesmo mês do ano passado. Essas notícias chegam em bom momento. As últimas projeções para a próxima safra nacional de grãos não foram muito animadoras. Segundo a Conab, a área cultivada deve diminuir 4% em relação à anterior e a produção deve ser 0,1% maior. O IBGE prevê redução de área de 5,49% e alta na produção de 5,34%. Mesmo com a diminuição da área plantada, a safra pode ser maior graças a outro fator. A previsão é de que não haverá tantos problemas climáticos como os que aconteceram nos últimos anos. Ao contrário, o regime de chuvas está bastante favorável. A economista da Tendências Consultoria Amarylles Romano observa que a maior vantagem para o produtor brasileiro agora é a de que o câmbio está estabilizado. Quando o dólar começou a cair no câmbio interno, o agronegócio brasileiro não conseguia obter ganhos com a alta dos preços lá fora - eles aumentavam, mas o rendimento em reais diminuía. O câmbio estabilizado garante que o agricultor venda sua produção com o dólar no mesmo nível de quando semeou a plantação. O cenário dos preços nos próximos meses dependerá da evolução da oferta e da demanda mundial por grãos. Mas, caso nenhuma surpresa mude a atual trajetória, os resultados vão aparecer. Como nada é perfeito, a alta das commodities agrícolas cobra contrapartida na inflação. Na terça-feira, a Fundação Getúlio Vargas divulgou o IGP-10 de novembro. Lá já apareceram efeitos sobre o custo da alimentação. O avanço foi de 1,02%, ante 0,81% em outubro e as maiores pressões vieram dos cereais e grãos (alta sobre novembro de 13,04% e 9,16%, respectivamente). Quem sabe, a melhora do poder aquisitivo do homem do campo seja capaz de irrigar com mais dinheiro o interior do País e, dessa forma, a indústria consiga destravar suas linhas de produção. |