DIAS FINAIS de grande suspense, a desmentir o mantra sobre ter sido esta a mais morna das campanhas eleitorais.
A distância entre Lula e a soma dos demais candidatos continua a se estreitar nas pesquisas. Mantida a tendência em curso, é provável que a diferença se reduza à margem de erro no domingo, sem autorizar palpites sobre segundo turno ou não.
O único "fato novo" previsível até o domingo é o debate de hoje à noite na TV. Os assessores de Lula estão divididos sobre qual o risco menor: o da cautela (não ir para ser crucificado em ausência) e o da audácia (ir, correndo o perigo de algum tropeço ou altercação mais grave).
Algum incidente sempre pode haver, mas essa não tem sido a praxe. Nesses debates, é claro, não se debate nada. Ao longo das sucessivas eleições, marqueteiros dos candidatos foram acrescentando, à regulação intrusiva da Justiça Eleitoral, regras de proteção recíproca que a TV aceitou.
O resultado é que se reduziram muito as possibilidades de um candidato deixar vislumbrar, nesses encontros, algo do que pensa ou é. O suposto "debate" reproduz a mesma xaropada publicitária que já entope todos os programas eleitorais dos candidatos durante o horário obrigatório no rádio e TV.
Nos países onde esses debates existem para valer, a iniciativa de transmiti-los é livre, independente do Estado. As regras são poucas, substituídas pelo discernimento de um mediador respeitado pelas partes. O essencial é submeter os antagonistas a perguntas de jornalistas independentes que podem replicar.
Goste-se ou não, o liberalismo é a ideologia dominante na nossa época. Depois de ser relegado ao museu de velharias por meio século (1930 a 1980), seus escassos apóstolos ridicularizados como passadistas, eis que o liberalismo subitamente voltou, mais triunfante que nunca, nos últimos 20 anos. É no sistema de mercado que a economia funciona melhor. Cabe ao Estado assegurar condições propícias ao mercado, tornando estimulante empreender.
Alternativas à democracia representativa logo se mostram a antecâmara de alguma ditadura em nome das massas. Até os adversários do liberalismo admitem, a contragosto, esses seus tradicionais postulados.
Quando assumem o poder (vide PSDB e PT), praticam uma política liberal temperada por compensações sociais bancadas pelo Estado, ou seja, pelo contribuinte. É o que José Guilherme Merquior chamava, já na época de Collor, de social-liberalismo. Mas ainda não surgiu um candidato que pregue o liberalismo sem meias medidas. Alckmin poderia ter sido esse candidato (não será outro o vetor de seu governo, em caso remoto de vitória), mas que marqueteiro o deixaria correr tamanho risco?
OTAVIO FRIAS FILHO é diretor de Redação da Folha