Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, maio 24, 2006

Miriam Leitão Ainda instável

O Globo

No futebol, velha máxima, o jogo só termina quando acaba. No mercado é pior: depois que o dia termina, ainda assim, ele não acaba. Os indicadores eletrônicos continuam a se mover antecipando como será a abertura no dia seguinte. Ontem, o mercado virou de uma hora para outra e continuou piorando depois de fechado. As apostas são de que hoje abrirá mal, com chance de se recuperar ao longo do dia.

Este sobe-e-desce mostra que o mercado está sem parâmetros. Entre os analistas, alguns acham que isso é passageiro, outros que é o início de uma temporada de crise.

O Brasil enfrenta esta volatilidade com câmbio flutuante, reservas altas e com superávit em transações correntes. Nos anos 90, enfrentamos crises cambiais pelo mundo com câmbio fixo, reservas baixas e déficit em transações correntes. Agora é diferente; e essa é a boa notícia.

A má notícia é que nenhum fundamento é coisa garantida para sempre. A economia - como a política - é nuvem; muda toda hora.

- Se muita gente quiser sair do Brasil, a situação muda. Se o mundo crescer menos, a balança comercial diminui. Se houver troca forte de portfólio, o câmbio sobe e isso bate na inflação e, conseqüentemente, nos juros. O Brasil melhorou na área externa, mas piorou na área fiscal - diz o economista José Alfredo Lamy.

O economista Luís Fernando Lopes, do Banco Pátria, não está tão pessimista, mas lembra que há 11 dias o mercado só piora:

- A Bolsa já esteve em 42 mil pontos e agora, no pregão eletrônico depois do fechamento, já estava indicando 36.900; uma queda de 14%.

Por trás disso aí está uma dúvida sobre a economia americana. O temor é que os dados daqui para a frente mostrem queda do mercado imobiliário, queda do nível de atividade e alta da inflação. Ou seja, os juros, que já estiveram em 1% em 2002, estão em 5% e devem continuar subindo. Se não subir os juros, o Fed estará aceitando uma inflação que já está acima da meta informal que eles têm de 2% ao ano; se subir, pode acabar ajudando a desacelerar ainda mais o mercado imobiliário.

Os ativos estão claramente passando por uma correção de preços. Será ótimo se for só isso. Mas pode ser o início de uma piora lenta e, talvez, nada segura para os países emergentes.

- Acho que, daqui até o fim do ano, principalmente no segundo semestre, a situação econômica vai se deteriorar devagar - comenta Lamy.

Lopes acredita que hoje o mercado abre mal, mas melhora ao longo do dia. Dados da economia americana a serem divulgados amanhã e sexta-feira vão ajudar a definir melhor o rumo do mercado.

Os trabalhos de Alckmin

O ex-governador Geraldo Alckmin disfarça a solidão em que se encontra, sem qualquer apoio visível dos tucanos mestres, com uma voz animada de candidato que quer convencer o interlocutor de que está tudo bem: "Haverá segundo turno e o presidente Lula vai ganhar (o primeiro turno) muito apertado."

Sobre a crise da segurança em São Paulo, ele exibe os números que eram seu grande argumento antes da semana passada. O número de homicídios no estado caiu de 12.700 por ano em 1999 para 7 mil agora. O número de homicídios na cidade de São Paulo caiu de 5.400 para 2.500 neste mesmo período.

- A polícia ficou mais eficiente e isso aumentou o número de presos. Hoje nós temos metade dos presos do país: 140 mil. A crise é localizada, mas o governo Federal se omitiu. Eu vou enfrentar o problema - afirma.

A segurança era o seu cartão de visita, mas a crise da semana passada fez picadinho desse cartão. Por várias razões. Uma delas é que o secretário de Segurança é o mesmo que o serviu. Outra é que a polícia de São Paulo reagiu ao assassinato dos policiais da pior forma e ainda tentou manter os nomes dos mortos em sigilo, como se isso fosse aceitável numa sociedade democrática. Ainda assim, ele acha que vira o jogo:

- Conheço a rua, ela está hoje vivendo um clima de indignação, de ira santa.

Perguntei por que essa ira santa não aparece nas pesquisas eleitorais, todas favoráveis ao presidente Lula e Alckmin argumentou que a campanha ainda não começou:

- Eu estou fazendo reunião fechada enquanto o presidente Lula viaja em Airbus, com um Boeing cheio de assessores atrás. É uma disputa desigual.

É cedo para conclusões sobre campanha eleitoral num país com tanta volatilidade política, mas Alckmin tem que vencer um candidato carismático sem ter especial talento nessa área; tem que unir um partido no qual a maioria dos líderes finge não ter candidato; tem que vencer a crise de confiança sobre a sua candidatura e os boatos de que será substituído e, principalmente, tem que superar os traumas da mais violenta crise de segurança que o Brasil já viveu. Sua linha de campanha é contestada por vários tucanos.

- Não falo mal do Lula, não quero falar mal de ninguém. Não se é o anti-Lula falando mal dele, mas mostrando ao país que há uma alternativa.

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