sábado, outubro 15, 2005

VEJA Vavá foi mais longe


Gilberto Carvalho, chefe-de-gabinete
de Lula, também sabia da atividade
de lobista do irmão do presidente. Até
recebeu um empresário a pedido dele


Marcelo Carneiro e Camila Pereira


Antonio Cruz/ABR
NA ANTE-SALA DO PRESIDENTE
Carvalho: enquanto ele recebia Vavá no Palácio, Lula estava fazendo o quê? Abaixo, o lobista da família Silva e Cristina Caçapava no escritório montado para "ajudar" empresários
Marcos Fernandes

VEJA revelou na semana passada que Genival Inácio da Silva, o Vavá, irmão do presidente Lula, havia montado um escritório para "ajudar" empresários com interesses no governo e que conseguira fazer com que pelo menos um deles, o presidente da Federação Brasileira de Hospitais, fosse recebido pelo assessor especial da Presidência, César Alvarez. O Palácio do Planalto respondeu que o presidente Lula não tinha conhecimento (para variar) das atividades do irmão e que Alvarez havia sido surpreendido pelo fato de Vavá comparecer ao Palácio acompanhado por membros de uma entidade que representa os interesses dos hospitais privados do país. Com isso, dava a entender que eles haviam "pego carona" em uma audiência que, na realidade, tinha sido marcada exclusivamente para o irmão do presidente. O Planalto omitiu dois fatos graves. É verdade que a federação tentou "pegar carona" na audiência com Alvarez, mas não é verdade que o encontro havia sido marcado para atender apenas Vavá. O assessor Alvarez estava preparado, naquele dia, para receber um outro empresário, a pedido do irmão do presidente: o português Emídio Mendes, um dos controladores do Riviera Group, conglomerado que atua nos setores imobiliário, turístico e energético, e que, nos últimos tempos, vinha tentando fechar negócios com a Petrobras. O empresário português foi, sim, recebido – e bem recebido – pelo assessor da Presidência. Graças a Vavá. Oito dias depois da audiência, o dono do Riviera Group retornou ao Planalto, no dia 22 de setembro, novamente acompanhado por Vavá. E, dessa vez, encontrou-se com um superior de Alvarez: o chefe-de-gabinete pessoal do presidente Lula, Gilberto Carvalho. Essa segunda informação também foi omitida pelo Palácio do Planalto.

Ana Araujo
LULINHA DA TELEMAR
Fábio Luís da Silva: bolada de 5 milhões de reais. E ficou por isso mesmo. Até quando, presidente?


O encontro do empresário português com o chefe-de-gabinete de Lula não foi inócuo, como sustenta a versão oficial. Quinze dias depois da audiência do dono do Riviera Group com Alvarez, e uma semana após seu encontro com Gilberto Carvalho, o empresário esteve no Rio de Janeiro – mais uma vez acompanhado pelo onipresente Vavá e sua "assessora" Cristina Caçapava – para uma visita à sede da Petrobras. Foi tratar da assinatura de um memorando de entendimento entre a estatal e uma das empresas controladas por seu grupo, a Nacional Gás. Ou seja: tanto a intermediação de Vavá (cujas passagens aéreas foram pagas pelo empresário) quanto as negociações do grupo português com o governo caminham muito bem. A assessoria de imprensa da Petrobras informa que as negociações com a Nacional Gás, que teriam iniciado em julho deste ano, continuam em andamento.

Na manhã de quarta-feira passada, VEJA entrevistou o empresário Emídio Mendes pela primeira vez, para que ele explicasse a razão da sua reunião com César Alvarez. Mendes disse que tinha sido levado por Vavá até o assessor da Presidência para discutir um assunto prosaico: um pedido para que o governo brasileiro "ajudasse países africanos de língua portuguesa" com envio de medicamentos. Na mesma ocasião, VEJA também perguntou por que motivo o irmão do presidente Lula o havia acompanhado à Petrobras, cuja sede fica no Rio. "O Vavá tem um amigo que queria me vender um terreno na cidade e nós fomos lá para avaliar a área", respondeu. Na tarde de quinta-feira, VEJA procurou novamente Emídio Mendes. Confrontado com a informação de que a sua segunda audiência no Planalto, com Gilberto Carvalho, girara em torno não de ajuda a países africanos, mas de negócios que seu grupo quer manter com a Petrobras, Emídio respondeu não ter feito "nada de errado". "Estou apenas contribuindo para aumentar as exportações do Brasil." A Petrobras vem se tornando uma assídua freqüentadora do noticiário de escândalos políticos. Em julho deste ano, o ex-secretário-geral do PT Silvio Pereira admitiu ter recebido um automóvel Land Rover, no valor de 73.500 reais, de presente da empreiteira baiana GDK, que mantém negócios com a petrolífera. No mês passado, um relatório do Tribunal de Contas da União, referente às atividades da estatal no primeiro semestre deste ano, resultou numa quilométrica lista de irregularidades, incluindo contratos suspeitos, concorrências dirigidas, superfaturamento e pagamentos por serviços não realizados.


Wilson Dias/ABR
O ENCONTRO ERA OUTRO
César Alvarez: o assessor da Presidência omitiu audiência com empresa da área de energia

Os fatos mostram que, por trás da maior parte das falcatruas envolvendo dinheiro público, há sempre um personagem obrigatório: o lobista – aquele que "engraxa" as engrenagens do poder público a serviço de causas quase sempre pouco nobres. O fato de o irmão do presidente Lula ser dono de um escritório destinado a intermediar negócios de empresários com o governo – e de ter conseguido trafegar com tamanha desenvoltura nos corredores do Planalto e da Petrobras – é, portanto, alarmante. E evidencia um problema recorrente no governo petista: a dificuldade do presidente Lula, e de sua família, de separar o público do privado. Em julho, VEJA mostrou como a Telemar – companhia que tem, entre seus controladores, o BNDES, um banco estatal – pagou 5 milhões de reais para tornar-se sócia de uma pequena empresa pertencente a Fábio Luís Lula da Silva, filho do presidente. Três meses depois da divulgação da notícia, a sociedade de Lulinha com a Telemar vai muito bem, obrigada. O presidente continua dizendo que o filho não fez nada de errado ao aceitar a bolada da empresa e que ele, Lula, tampouco agiu incorretamente ao fechar os olhos para a sorte grande de seu rebento.

Na semana retrasada, o presidente declarou, por meio de assessores, que não tinha conhecimento das atividades do irmão – ainda que Vavá tenha estado no seu local de trabalho, no mesmo andar em que fica o seu gabinete, e tenha sido recebido pelo seu subsecretário-geral. Agora, a situação é um pouco mais complicada. Gilberto Carvalho atua como fiel escudeiro de Lula desde a primeira campanha presidencial, nos anos 80. Ocupa uma sala a pouquíssimos metros do gabinete de Lula e é seu mais íntimo assessor, além de amigo e freqüentador dos churrascos da Granja do Torto. A pergunta óbvia é: Carvalho não comunicou ao presidente que seu irmão levava empresários para fazer negócios no Palácio do Planalto? E, se comunicou, por que o escritório de Vavá funcionou a pleno vapor até sua existência e finalidade terem sido reveladas por VEJA? Solicitada a responder a essas perguntas na última sexta-feira, a assessoria da Presidência limitou-se a dizer que tanto Carvalho quanto o presidente estavam "incomunicáveis". Para quem, ao longo dos últimos escândalos, sempre se mostrou o último a saber, o termo não deixa de ser apropriado.