FERNANDO RODRIGUES
A democracia avança SÃO PAULO - É bom sinal quando 122 milhões de eleitores podem ir às urnas para responder se concordam ou não com o trecho de uma lei aprovada pelo Congresso.
OK, a pergunta é indigente e foi mal formulada. Há assuntos mais relevantes no país do que proibir a venda de armas. Será mínima a diferença na segurança pública pós-referendo, não importa o resultado. Muitos políticos oportunistas usaram a consulta para lavar suas imagens e se posicionarem, vá lá, do lado do bem.
Tudo isso é verdade. O contraponto é que a simples realização do referendo ajuda a educar ainda mais os eleitores a respeito de sua responsabilidade. Poucos se dão conta, mas é só a segunda vez no atual período democrático de meros 20 anos (de 1985 para cá) que os brasileiros são consultados diretamente. A outra vez foi sobre forma e sistema de governo.
Ontem de manhã, no bairro paulistano de Higienópolis, as pessoas a caminho dos locais de votação discutiam de maneira entusiasmada as razões de votar "sim""ou "não". Por mais superficial que tenha sido, e foi, houve um debate.
Condenado a viver exilado em Brasília, ao ouvir ontem de manhã as conversas informais entre os eleitores paulistanos, enxerguei ali o maior valor do referendo: quando as pessoas votam, sempre há algum debate e a tendência é o voto ficar mais depurado nas próximas eleições.
Como escreveu Fábio Konder Comparato, na Folha, as consultas populares abrem a possibilidade de "instituir uma verdadeira República entre nós". Se nos perguntam sobre as armas, por que não criar o mecanismo de destituição do mandato de deputados e senadores corruptos? Vota-se para eleger, vota-se para tirar.
A intenção de quem propôs o referendo não era incentivar mais consultas populares. Para sorte da democracia, esse pode ser o melhor resultado do voto de ontem. Basta os eleitores pressionarem os políticos na eleição de 2006. Aí está um dos caminhos para o avanço democrático no país.