quinta-feira, setembro 01, 2005

JANIO DE FREITAS Garfo e faca

FOLHA DE S PAULO

Se pretendeu mais do que atender a conveniências internas e aparências externas da Câmara, o relatório apresentado à Comissão de Ética pelo pefelista baiano Jairo Carneiro, pedindo a cassação do deputado Roberto Jefferson, deveria ser recolhido depressa. No seu trânsito de ida e volta entre a inépcia dos argumentos e a pobreza da formulação, o relatório incorre na acusação mais contundente que faz a Jefferson: "atingiu gravemente (...) a imagem pública da Casa como instituição". A Câmara ainda é capaz de produções bem mais qualificadas.
O deputado Jairo Carneiro não reconhece o mensalão denunciado, como um pagamento repetido a deputados governistas. Adota a explicação de que a fartura de dinheiro distribuído serviu a gastos de campanhas eleitorais. Mas está provado que a finalidade foi essa? Não. Nenhum dos deputados presentes nas listas de recebimento ofereceu, até agora, comprovação de que tenha aplicado em quitação de débito eleitoral o dinheiro ilegal que recebeu. Quem mais se aproximou disso o fez com uns quantos papéis, a título de recibos, não submetidos ao exame de adequação cronológica, em relação aos recebimentos, nem à verificação nos documentos dos fornecedores apontados.
Os parlamentares citados por Roberto Jefferson, como recebedores, segundo o relator, tiveram, todos, atingida "gravemente a honra pessoal" pela "forma leviana e irresponsável" de acusações "sem provas". Para buscar provas é que existem CPIs e outras modalidades de investigação que, sem denúncias carentes de provas, não ocorreriam e, portanto, deixariam intocadas as ilegalidades.
Mas, nesse ponto do relatório, o que mais chama atenção é o descaso pela sabida ausência de conclusão das investigações, nelas incluídos o papel e a responsabilidade de muitos dos citados nas denúncias.
Por mais ressalvas e cautelas que se adotem, as reputações questionadas não autorizam, muito menos a um relatório de Comissão de Ética, a generalização de que as denúncias atingiram as honras pessoais dos citados. Já está demonstrado que muitas dessas honras foram "gravemente atingidas" pelos atos e bolsos de vários dos citados, e não pelas denúncias que os incluíram. A ninguém surpreenderá, muito ao contrário, que mais honras desabem na continuidade das investigações, agravando a ânsia protetora do relatório de Jairo Carneiro.
O próprio Roberto Jefferson, logo no primeiro depoimento formal, deu o seu mandato como "sublimado". O que não diminuiu o furioso apetite de tantos dos seus colegas para serem eles a "sublimá-lo". Não estão desobrigados, no entanto, a "sublimar" alguma categoria no uso do garfo e faca.