MARI TORTATO
DA AGÊNCIA FOLHA, EM CURITIBA
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso disse ontem que o governo de Luiz Inácio Lula da Silva deixou de lado "a tradicional cautela" em sua política externa, comete excessos na retórica e que essa é a causa da "irritabilidade" de países vizinhos, como a Argentina, sobre os episódios de crises recentes na América do Sul.
"Há uma situação bem delicada no Equador, na Bolívia, na Colômbia e em outros países, e o Brasil adota uma posição um pouco insistente de que tem a hegemonia [na América do Sul]. Isso não agrada. Liderança não se proclama", disse o ex-presidente.
As declarações foram feitas durante uma entrevista coletiva em Curitiba que precedeu uma palestra de FHC sobre o Brasil no cenário internacional. Segundo ele, em política externa "a retórica é muito perigosa". "Em geral, a política precisa da retórica, mas cuidadosa. A política interna pode até usar palavras mais soltas, mas, na externa, não. Quando a gente faz declarações de intenções que não correspondem aos nossos interesses, só irrita", afirmou.
O ex-presidente fez a análise a partir de uma pergunta sobre como ele analisa o comportamento do governo do Brasil em relação aos conflitos sul-americanos, e sobre a reação da Argentina à antecipação da diplomacia brasileira na negociação da crise do Equador. "Não acho que reações como a da Argentina determinem o rumo das coisas. Temos questões mais objetivas do que as suscetibilidades, e o Brasil tem uma tradição que não foi desfeita ao dar asilo político a Gutiérrez. Eu fiz isso com o Paraguai [deu asilo político a Raul Cubas, vice-presidente deposto nos anos 90]. O que não se pode é transformar isso em um cavalo de batalha."
Para FHC, o assento do Brasil no Conselho de Segurança da ONU é uma aspiração legítima, mas que não pode afastar os vizinhos aliados. "Não pode provocar reações contrárias da Argentina, do México, da Colômbia".
FHC também defendeu a retomada da discussão de um novo sistema de governo para o Brasil. "O ex-presidente José Sarney escreveu um artigo recente na Folha onde dá abertura para uma coisa que ele escreve com cautela -e a minha é maior ainda-, de que, quem sabe, não é chegada a hora de discutir o parlamentarismo. Não sei se é parlamentarismo, já rejeitado em plebiscito, mas chegou a hora de discutir formas de representação mais eficazes. Por que não se pode adotar sistemas [de eleição] distritais [...]?"
FOLHA DE S.PAULO
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