quarta-feira, abril 27, 2005

FERNANDO RODRIGUES:Os traseiros de cada um

 BRASÍLIA - Para usar a mesma terminologia presidencial, há quanto tempo Lula não levanta o traseiro da cadeira para negociar um empréstimo bancário? A julgar pelo que tem dito, há muito tempo.
Para começar, é difícil um banco emprestar dinheiro para quem não tem conta na instituição. O passo inicial é sempre abrir uma conta. Se o empréstimo fica caro, pela cartilha de Lula, muda-se para outro banco. Não é uma tarefa simples.
Tivessem Lula e seus 36 ministros e secretários com status de ministro um contato maior com a realidade, o presidente não apontaria a abulia crônica do brasileiro como um dos fatores mais relevantes para o ciclo perverso de juros altos. Não que os cidadãos deste país sejam um exemplo de persistência e obstinação -apesar de a propaganda paraestatal de estilo sub-Zefirelli martelar o slogan "sou brasileiro e não desisto nunca".
O consumidor é apenas a parte mais frágil do processo. Milhões de brasileiros recebem seus salários por meio de depósito em um banco que não escolheram. A lei até garante a possibilidade de mudança. Mas vá lá o peão causar esse infortúnio ao patrão para ver o que acontece.
Há anos também repousa no STF uma ação que determinará se os bancos devem ou não se submeter ao Código de Defesa do Consumidor. Ninguém no governo se habilita a resolver esse vazio jurídico.
Nos talões de cheques vem anotada a data de criação da conta. Mudar de banco é um risco. Ao entrar numa loja, o consumidor pode topar com a inscrição: "Não aceitamos cheques de contas com menos de um ano".
Como se não bastasse, para abrir uma nova conta, o interessado terá de fotocopiar documentos, autenticá-los em cartório e enfrentar filas. Depois, precisa transferir os seus débitos automáticos para o novo banco.
O que fez ou faz o governo para minimizar esse calvário? Nada. Encastelado no Planalto, Lula perdeu vários pontos de contato com a realidade. Na eleição do ano que vem, esse descolamento pode ser fatal.

FOLHA DE S.PAULO

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