domingo, março 27, 2005

O GLOBO Miriam Leitão :Função dos números

O Brasil gasta pouco ou muito em educação? As comparações internacionais não trazem respostas simples. Como percentual do gasto, o Brasil perde para a maioria dos países; como percentual do PIB, gasta o mesmo que a média dos países da OCDE e mais do que Coréia, Índia e China. No ensino superior, o Brasil gasta o dobro do que a Coréia como proporção do PIB. No desempenho escolar, é que ficamos bem atrás.
No centro da questão econômica, está a educação. Nós podemos ter uma excelente política macroeconômica, mas, se mantivermos índices educacionais tão ruins, o Brasil perderá todas as corridas com outros países na economia globalizada e competitiva de hoje. Por isso, quem se preocupa com a economia olha insistentemente os dados de educação. E eles são sempre inquietantes.


A dúvida que surge dos números, como estes que estão no estudo da OCDE sobre o Brasil é: por que o nosso gasto é mais ineficiente que os dos outros países. A tabela mostra que, como percentual das despesas, o Brasil é que fornece uma parcela menor para a educação, o que é uma insensatez, dado o nosso passivo. Como proporção do PIB, o Brasil só perde para a Malásia e empata com a média da OCDE. No gasto com ensino superior, o Brasil perde para a Malásia e para a média da OCDE, porém tem uma despesa que é o dobro da despesa de China, Índia e Coréia. Qualquer comparação com a Coréia é sempre dolorosa, mas inevitável. Nós gastamos proporcionalmente ao PIB o dobro com ensino superior e eles têm 82% dos jovens na universidade e nós temos 18%.

O ministro Tarso Genro tem apresentado o que imagina ser a solução para os problemas da educação: aumentar as despesas. E apresentou a proposta da conversão de dívida externa para financiar a educação. A dívida externa pública do Brasil é pequena e tem caído. Hoje ela não é um problema para o país. Tem que se saber a quem apresentar essa proposta de conversão, se aos países ou aos organismos multilaterais.

O representante da Unesco no Brasil, Jorge Werthein, gosta da idéia da conversão e acha que pode ser apresentada tanto a alguns países na dívida bilateral, quanto aos organismos multilaterais:

— Não acho que isso será malvisto pelos credores, porque, afinal, é investimento em educação. O Brasil pode até gastar tanto ou mais que outros países, mas poucos têm um passivo tão alto quanto o Brasil.

Mesmo que seja fácil viabilizar este caminho, uma dúvida permanece: vale a pena aumentar os gastos sem corrigir as distorções do sistema brasileiro? O projeto do Ministério da Educação é aumentar o percentual dos gastos com ensino superior, que sairiam de 70% para 75% dos gastos federais. O Brasil deveria fazer exatamente o oposto: aumentar o investimento no fundamental e médio, e não na universidade. Nos últimos 40 anos, a Coréia concentrou seus gastos no ensino básico e o Brasil gastou mais que a Coréia no ensino superior. Os dados, quatro décadas depois, são eloqüentes em mostrar quem acertou.

Certas comparações com o resto do mundo são dolorosas. Numa lista de 30 países com os quais foi comparado no estudo da OCDE, o Brasil ficou no segundo pior lugar em desempenho dos estudantes em provas internacionais. Ganhamos apenas do Peru.

Antes de decidir aumentar os gastos, ou propor uma fórmula para o financiamento externo para educação, é preciso saber se o país vai alocar os novos recursos no nível educacional certo e se sabe como aumentar a produtividade do gasto. O fato inegável é que o governo não gasta pouco, mas o investimento não rende o que deveria. Em outros países, o capital investido em educação produz resultados melhores que os nossos. O dever de casa do Brasil deveria ser descobrir como aumentar a eficiência de cada real investido em educação.

A ONG Leia Brasil, que promove a leitura, está lançando um programa de educação para 300 mil alunos de 328 escolas públicas. Ele terá o patrocínio de R$ 1,5 milhão da Petrobras. O objetivo é levar às comunidades caminhões-bibliotecas e treinamentos continuados para professores.

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