O Presidente da Câmara, Severino Cavalcanti, teve ontem um dia de euforia: desabafou com um longo improviso por escrito, lido com dificuldades, e foi o principal responsável pela derrota da medida provisória que classificou de propósito de "a do aumento dos impostos". Mas Severino perdeu uma grande chance de tentar se recolocar diante da opinião pública ao não aceitar a proposta do presidente do PPS, deputado Roberto Freire, que queria que o plenário decidisse sobre o aumento dos salários dos gabinetes dos deputados.
Seria uma oportunidade de tentar convencer a sociedade de que o aumento não foi feito para compensar o reajuste dos subsídios dos deputados, e passar a responsabilidade para a totalidade dos deputados. O cientista político Fabiano Santos, do Iuperj, por exemplo, tem uma visão bastante positiva de alguns dos movimentos atuais da Câmara.
Ele classifica a eleição de Severino Cavalcanti como conseqüência de um anseio dos parlamentares por melhores condições do exercício do mandato, o que inclui não apenas condições para que tenham maior visibilidade, como principalmente para que o Legislativo se imponha no processo político.
Para isso, os deputados e senadores têm que ter melhor estrutura, melhor assessoria. Investir na instituição, colocar dinheiro público nela, é importante para o processo democrático, defende Santos. Esses aspectos deveriam estar mais presentes no debate atual, diz Fabiano Santos.
Do ponto de vista político, porém, Santos acha que Severino não vocaliza a opinião dos grandes centros, e nesse caso a atuação contra a medida provisória é uma maneira que ele encontrou de se afinar com os formadores de opinião que estão fora de seu raio de ação.
O governo, derrotado ontem de maneira dramática, ultimamente se dedica a jogar fora a água do banho com o bebê junto. Quando o presidente Lula, justamente irritado com a audaciosa postura do presidente da Câmara de pressionar publicamente pela nomeação de um seu protegido, decidiu mostrar quem manda, escolheu o pior dos caminhos: não fazer a reforma, quando o correto seria ignorar as pressões indevidas de Severino Cavalcanti e deixar o PP de fora da reforma.
Ontem, orientou o PT e seus aliados, de maneira esdrúxula, a votarem contra a medida provisória 232, e acabou anulando não apenas o aumento de imposto dos profissionais liberais, como também o reajuste da tabela do imposto de renda, que já estava em vigor.
Se a reforma ministerial era necessária para melhorar a qualidade do ministério - e esse é um ponto em que existe praticamente unanimidade -, o presidente Lula não poderia deixar de fazê-la. No entanto, a maneira como estava sendo encaminhada a negociação da reforma ministerial fez com que as soluções que estavam sendo discutidas não levassem em consideração a qualidade técnica dos eventuais escolhidos, mas apenas os interesses políticos dos partidos.
Não fosse assim, não haveria espaço para que Severino tentasse impor um protegido completamente desqualificado para o cargo de ministro das Comunicações. E nem haveria político cogitado ao mesmo tempo para ministérios totalmente diferentes, como foi o caso da senadora Roseana Sarney, sondada tanto para a Coordenação Política como para o Ministério das Cidades, Integração Social e até mesmo Planejamento. O que demonstra que o importante para o governo não era encontrar um bom nome para esses ministérios, mas um lugar no governo para a filha do senador José Sarney, que domina uma parte ponderável do PMDB, partido que passou a ser fundamental para o projeto do governo de reeleição do presidente Lula.
Assim também o ministro da Saúde, Humberto Costa, saiu da frigideira em que o jogaram meses a fio para transformar-se em exemplo de ministro na boca do presidente Lula, que com essa declaração deixou claro que não está interessado em ter ministros competentes, mas apenas em fazer política. Diante da intervenção na saúde da cidade do Rio, Humberto Costa, ganhou relevância política, mas continuou com as mesmas deficiências.
Ontem, mais uma vez o governo adotou a postura de negar integralmente uma proposta sua, enviada ao Congresso por medida provisória, teoricamente tratando de medida urgente. A MP 232, que reajustou a tabela do desconto de Imposto de Renda, atendia a um anseio da opinião pública e fazia parte de uma ação do governo de se aproximar da classe média, soterrada pela alta carga tributária em vigor.
Por uma esperteza dos técnicos da Receita Federal, foi incluído sorrateiramente na medida provisória um aumento da tributação dos profissionais liberais, oficialmente para tornar "mais justa" a cobrança de impostos, na prática para compensar a perda de arrecadação que o reajuste da tabela do imposto de renda provocará.
O governo brigou até o último momento para tentar conseguir apoio de sua base aliada no Congresso, mas não conseguiu nem mesmo o apoio do PT, o partido oficial. O aumento da carga tributária é uma medida tão impopular que o governo foi obrigado a "ceder à pressão da opinião pública", como ressalvou um eufórico presidente da Câmara, Severino Cavalcanti, e desistiu de aprová-lo. Se já irritara a classe média e os profissionais liberais com a tentativa de aumentar a cobrança de impostos, o governo agora irrita mais ainda ao colocar em perigo o reajuste da tabela do Imposto de Renda, que já estava em vigor.
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