Não houve surpresa, mas há novidade na decisão do Fed, banco central americano, de elevar em 0,25 ponto a taxa básica de juros nos EUA. A novidade, sentida na terça-feira, dia da reunião do Fed, é que Greenspan alerta pela primeira vez para a existência de pressões inflacionárias, sinônimo de juros mais altos. Isso foi logo sentido pelo mercado financeiro internacional. Pode-se dizer que houve uma superação, afinal a medida era prevista, embora não os sinais de um aumento maior dos juros, no futuro.
A frase exata do comunicado do banco central americano é bem clara e contrasta com aquela linguagem sibilina sempre utilizada por Greenspan: :Embora as expectativas de inflação no longo prazo permaneçam bem contidas, as pressões sobre a inflação aceleraram nos últimos meses e o poder de preços é mais evidente”. Em seguida ele ameniza: “Contudo, o aumento dos preços da energia não tem aumentado de forma considerável os preços ao consumidor”.
Mas o recado já estava dado. É o primeiro, nestes termos, desde que o Fed começou a elevar em 0,25 pontos a taxa básica de juros, que passou de 1% para 2,75%. Ontem, muitos analistas no mercado financeiro internacional já estavam prevendo uma taxa de 4% ou 4,5% no fim do ano. Exagero? Quem sabe? Por enquanto, qualquer hipótese é temerária.
Conseqüências para o Brasil - Mas, o que significa essa alta para o Brasil? Quais são as repercussões, e como isso nos afeta? Vão entrar menos recursos, vai emigrar mais? Ao em vez de falar com os analistas do mercado, envolvidos nesse burburinho todo, Economia Internacional preferiu conversar com o ex-presidente do Citibank, no Brasil, Alcides Amaral, hoje colunista do “Estado”, que tem uma longa experiência acumulada de 46 anos intensamente vividos no mercado.
“Há dois efeitos. Um sobre o custo da dívida externa e dos papéis brasileiros colocados no mercado externo. Os juros desses, e de praticamente quase todos os papéis dos países emergentes, são calculados com base na taxa de juro do tesouro americano. É o que se chama de taxa de referência. Ora, se o rendimento dos títulos do tesouro americano aumentarem, o custo dos papéis do governo e das empresas brasileiras no mercado internacional aumentarão também”. O segundo efeito é que, na medida em aumenta a taxa de juros no mercado internacional, reduz o apetite do investidor para títulos de papéis de países emergentes.
Juro não afeta dinheiro de curto prazo - E no caso de vinda de investimentos de curto prazo para o Brasil? “Este é um ponto interessante”, diz Alcides Amaral. “Por enquanto, um aumento dos juros americanos, 0,25 pontos, e mesmo que alcancem 4,5% no fim do ano, como muitos estão prevendo, não chega a afetar o fluxo desses capitais de curto prazo”.
Por que? “Os juros brasileiros, 19,25%, são elevadíssimos, os maiores do mundo. Dessa forma, mesmo com o Fed chegando a 4,5%, há ainda uma forte margem de lucro para quem traz dólares para o Brasil e os aplica a 19,25%. É uma grande diferença. Mas, vamos deixar bem claro, são investimentos, aplicações de curto prazo extremamente líquidas”.
Como as que estão entrando agora? E Alcides Amaral responde: “Sim, estão e podem continuar entrando, mesmo que o rendimento dos papéis do tesouro americano, ou outros, aumente ainda mais. Continuará havendo, ainda, uma grande margem para os aplicadores que estão vindo para o mercado brasileiro. E isso enquanto o Brasil mantiver a atual linha econômica o atual nível de risco”.
O que falta é investimento - Quer dizer, então, que não devemos ficar muito preocupados com esse aumento de 0,25 pontos, nos Estados Unidos? “Não é bem isso. Esses capitais de curto prazo são bons, têm uma função importante de manter o fluxo de recursos externos para o país. Mas são muito líquidos, podem sair a qualquer momento. O que está faltando neste momento para o Brasil, em termos de atração de recursos externos, não é entrada de ’dólares’ (entre aspas) de curto prazo, mas de investimentos diretos, mais permanentes, que geram produção, emprego e exportação. O Banco Central estima hoje que deveremos receber, neste ano, US$ 16 bilhões, e não US$ 14 bilhões de investimentos diretos do exterior. É pouco, pois já atraímos mais de 30 bilhões em apenas um ano”.
Resumindo, para o experiente ex-presidente do Citibank no Brasil, Alcides Amaral, “o aumento dos juros nos Estados Unidos preocupa mais pelo que ele pode representar em termos de desaceleração da taxa de crescimento do imenso mercado americano, que vem sustentando a expansão da economia mundial. Isso preocupa não apenas a nós, mas a todos os demais países do mundo. Um aumento em 0,25 pontos da taxa do Fed e seu alerta oficial sobre um aumento das pressões inflacionárias nos EUA são sinal de que o cenário econômico americano está mudando. E isso, sim, preocupa. E muito”.
Inflação confirmada - Um dia após o alerta do banco central americano, o Departamento do Comércio dos Estados Unidos divulgou ontem que os preços pagos pelo consumidor americano, em fevereiro, aumentaram 0,4%, excluindo os preços “voláteis”, energia e alimentos. Essa alta chega a 2,4% em doze meses. É o mais alto, anualizado, desde agosto de 2002. Ainda de acordo com o Departamento do Comércio, o aumento global, em fevereiro, não se limitou apenas aos derivados de petróleo, mas a outros itens como viagens aéreas, medicamentos, gastos com saúde e educação. (Steven Wood, do Insite Economics, informa que pesquisa realizada recentemente revela que esses sinais vêm se confirmando ultimamente, o que levou o banco central a mudar sua linguagem a respeito dos sinais de inflação. “Não mais que os riscos (de inflação), estão “equilibrados”, afirma ele).
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