ÉPOCA
Presentes práticos são os que menos entusiasmam. E fuja de liquidações!
Adiei
o que pude. Xinguei o sistema de consumo. Agora tenho de tratar dos
presentes de Natal. Nem preciso ir à academia. Gastarei minhas calorias
andando por lojas, atravessando shoppings e mergulhando em multidões
exaltadas em torno de caixas lentos.
Tenho uma teoria a respeito
de presentes, ótima para o Natal. Presentes se dividem entre: de luxo,
práticos e criativos. De forma geral, a regra é a seguinte: quanto menor
a caixinha, mais rico quem ganha ou quem dá. Quanto maior, menos grana
no pedaço. Claro, há exceções. Mas brincos de brilhantes, gargantilhas
de rubis exigem embalagens pequenas. Uma máquina de lavar é um pacotão.
Se você tem muito dinheiro, está fácil. Um relógio de marca famosa,
champanhe Dom Perignon, Veuve Clicquot ou Cristal sempre são bem
acolhidos, assim como bons vinhos, charutos cubanos, bolsas de grife
exclusivas, lanchas, carros zero. Todo mundo adora rico que bota
presente bom na mesa. Aquele adágio que milionários e mestres de
etiqueta adoram declamar – “ser elegante é ser simples” – é mentira. Se
alguém tem um amigo rico, odiará um presentinho qualquer. Quer que o
rico mostre quem é, dando algo de luxo. Confesso: recentemente ganhei um
conhaque Louis XIII. Já falei dele aqui, custa mais de R$ 12 mil a
garrafa. Meu coração tremeu de emoção.
– Como alguém pode gastar tanto comigo? – pensei, com os olhos faiscando de autoestima.
Depois,
é claro, escondi a garrafa. Sou filho de pobre. Não correrei o risco de
que algum amigo bebum enxugue meu conhaque. Eu mesmo o beberei de gota
em gota. Mais tarde, quando a preciosidade acabar, encho a garrafa com
um conhaque comum e sirvo a quem vier, para parecer generoso.
A
categoria luxo impressiona. Mas o criativo funciona para ricos e pobres.
Tem toda a chance de se tornar inesquecível. Por exemplo, um pacote de
argila fresca dado a uma criança na noite de Natal é inesquecível. Para a
mãe e a dona da casa. Mas a criança vai adorar! Fuja de filhotes de
cães ou gatos. Bichos a gente só dá a quem realmente quer. Já ganhei um
presente criativo e inesquecível, entre muitos, de minha amiga Lucilia
Diniz. Quando fiz 60 anos, ela me ofereceu uma caixa com DVDs de todos
os filmes que ganharam o Oscar do ano em que nasci até meu aniversário.
Para meu orgulho, também já fiz sucesso em um aniversário da Bethy
Lagardère, que hoje vive no Rio e já foi casada com o homem mais rico da
França. Bem, o que se dá para alguém assim? Roupa de grife, para uma
das mulheres que melhor se vestem no planeta? Encontrei um livro sobre
os pássaros do mundo. A cada página, as ilustrações subiam em relevo e
ouvia-se o som dos pássaros cantando. Ela adorou! Para ser criativo, é
preciso também ser surpreendente. Conheci uma mulher que preparava
biscoitos e oferecia em vidros personalizados aos amigos. Uma
delicadeza. Aviso: estou cultivando abelhas. Ano que vem me safo
engarrafando potes de mel e oferecendo com um “eu mesmo produzi”.
Presentes criativos, ou as pessoas adoram ou disfarçam. Mas, se fingem
que gostam, é o que realmente conta no Natal.
Presentes práticos
são os que menos entusiasmam. Mães costumam ser vítimas dessa categoria.
Ganham coisas para a casa: pratos, panelas, eletrodomésticos. Minha
mãe, que não era boba, a certa altura da vida implorou: “Neste Natal,
quero um presente para mim”. Foi o único jeito de se livrar dos
liquidificadores, dados ano após ano por mim e meus irmãos. A gente
nunca sabe exatamente o que dar a pai e mãe, que parecem ter tudo. O
segredo: pense em algo que, na imaginação, eles nunca usariam. Tipo um
estojo de maquiagem transado, para ela se sentir uma mocinha; shorts
colorido para ele; material de pintura, caso não pintem; ou inscreva seu
velho num curso de culinária; ou ofereça um pacote de seis meses numa
academia. Se insistir num presente prático, fuja de liquidações. Certa
vez dei uma camisa a um amigo secreto no trabalho. Não serviu. Tentei a
troca, não aceitaram. Na época, eu estava durango. Nunca mais toquei no
assunto. O amigo secreto virou inimigo público.
A não ser que
tenha certeza absoluta, fuja do presente prático. Senão, um dia
encontrará uma pilha de eletrodomésticos na área de serviço de sua mãe,
tia ou sogra, acumulados ao longo do tempo. Surpresa ainda é o melhor no
Natal. E, quem sabe, você ofereça um vale salto paraquedas a seu primo,
e ele te agradeça eternamente?