sexta-feira, outubro 21, 2011

Em jogo, o futuro do euro CELSO MING



O ESTADÃO - 21/10/11

É imprevisível o resultado das reuniões de cúpula dos chefes de Estado da área do euro, agendadas para domingo e quarta-feira, em Bruxelas, Bélgica. Foram convocadas para encontrar uma saída permanente para a crise. Mas são tantos interesses paroquiais que solapam uma solução que não dá para apostar em que o impasse será, finalmente, superado. (Veja, ainda, o Confira)

Ninguém espera pelo fim dos problemas dos fundamentos do euro. O objetivo é atacar emergências: ameaça de crise bancária sistêmica (quebras em cadeia); e falta aguda de recursos para provável suspensão de pagamentos pela Grécia e, eventualmente, por outras economias à beira do colapso. Esta Coluna tratará do que está em questão no sistema financeiro do bloco.

A novidade é a perspectiva de calote de Estados soberanos. Em julho ficou acordado que credores privados (bancos, fundos de pensão, etc.) seriam induzidos a aceitar corte (haircut) de 21% no valor dos créditos que detêm sobre a Grécia. Foi admitido o princípio de que dívida soberana (de Tesouros nacionais) pode, sim, ser caloteada. E isso implica assumir riscos, antes, negligenciados.

A primeira reação do presidente da França, Nicolas Sarkozy, foi dizer que o corte da Grécia não era exatamente calote, por ser aceito "voluntariamente" pelos bancos. E, também, porque os adicionais de juros cobrados na venda dos títulos já supunham possível inadimplência.

Esse ponto de vista não foi acatado por dois motivos. Primeiro, no caso de corte das dívidas, os credores teriam direito ao "seguro" previsto nos contratos de Crédit Default Swap (CDS). Ou seja, ficaria caracterizado o default (quebra). E, segunda razão, esse calote não está sendo engolido "voluntariamente", mas por imposição. Fora isso, já se viu que não será de só 21%; terá de ser de cerca de 50%.

O reconhecimento de que a exposição dos bancos a títulos soberanos acarreta riscos levou à necessidade de adequação do patrimônio bancário à proporção dos ativos. Especialistas entendem que a dimensão de capital para blindar os bancos deverá corresponder a 9% dos créditos em carteira ponderados pelo risco. Os cálculos do Fundo Monetário Internacional apontaram pouco mais de 200 bilhões de euros. É volume muito alto para ser disposto pelo mercado, hoje muito resistente a subscrever ações novas de bancos cujo passivo real se desconhece.

Esse nível de secura empurra as instituições financeiras para a venda de parcelas dos seus ativos (créditos). Mas uma forte desova nos mercados poderia provocar duas graves consequências: desvalorizar os títulos pelo efeito procura maior do que oferta, o que pode exigir mais reforço de capital; e abrupto estancamento do crédito nos mercados, o que geraria recessão, desemprego e a piora da crise.

A outra opção seria determinar que os próprios Tesouros provessem capital novo para os bancos. Uma saída algo abstrusa, à medida que Tesouros altamente endividados tivessem de salvar com ainda mais dívida os créditos da própria dívida.

Uma das propostas sobre a mesa é alavancar o Fundo Europeu de Estabilidade Financeira, cujo patrimônio, agora de 440 bilhões de euros, também serviria para reforçar os bancos. O problema é que esse Fundo não foi criado para capitalizá-los e já é cobertor curto demais para salvar os Estados nacionais.

Ficam para a próxima Coluna os outros problemas a serem equacionados nas reuniões de domingo e quarta-feira.

O interesse maior. No evento de despedida de Jean-Claude Trichet na quarta-feira, em Frankfurt, Helmut Schmidt, de 92 anos, ex-chanceler da Alemanha, advertiu de sua cadeira de rodas os críticos do euro: "Quem considera interesses de seu país mais importantes que os da Europa comum prejudica interesses fundamentais do próprio país". Assim relatou, nesta quinta-feira, o New York Times.

Novo adiamento. Também desta vez, boatos estavam certos. Nota oficial confirmou segunda reunião de cúpula no bloco do euro para a próxima quarta-feira. Nessa etapa posterior, será batido o martelo sobre questões ainda sem consenso.