O GLOBO - 20/09/11
A semana começou com as bolsas caindo na Europa e o dólar subindo no Brasil. Nada de novo no front, exceto a crise mesmo que se repete a cada dia com as suas oscilações. O motivo imediato importa pouco, o mais importante é encarar as tarefas inescapáveis: a Grécia dará o calote, o euro precisa ser reformulado, o mundo terá que encontrar formas de criar emprego.
A impossibilidade de a Grécia sair da crise atual sem um calote é matemática. Aquela dívida não se paga; negocia-se, na melhor das hipóteses. Os números não confortam nenhum outro caminho. A Grécia terá um déficit de pelo menos 7,6% do PIB este ano; tem uma dívida de 155% do PIB; paga juros 26 vezes mais altos que a Alemanha; o seguro contra o calote grego custa 55% do valor da dívida; e o país está em recessão de 7% com taxa de desemprego de 16,3%. Portanto, os credores terão que perder dinheiro e negociar uma saída para o país. O problema é que a Europa não construiu, na sua arquitetura monetária, uma porta de saída.
Ontem, o presidente do Banco Central da Alemanha, e membro do conselho executivo do BCE, Jens Weidmann, disse exatamente isso: que as reformas do euro precisam incluir a possibilidade de um país entrar em moratória e não conseguir cumprir com as exigências. Ele acha que o "pacto de estabilidade e crescimento" precisa ser fortalecido, para que possam ser punidos mais facilmente os países que o descumprirem. Disse que, do jeito que está, quando os estados estão em dificuldades por erros fiscais cometidos eles recebem ajuda da União mas são eles próprios que decidem se cumprem os requisitos ou não. Para ele, nenhum socorro pode ser concedido se as condições para a ajuda não forem cumpridas.
O governo alemão está sentindo a pressão dos eleitores em derrotas regionais sucessivas, que consideram que o governo tem feito excessivamente pelos cidadãos de outros países; ao mesmo tempo, tem sido cobrado por supostamente fazer menos do que o necessário para socorrer os países em dificuldade. De quebra, tem enfrentado a insinuação de que quer, através da moeda comum, ser a dona da Europa. Isso sem falar em brigas internas no governo. O ministro da Economia, Philipp Roesler, afirmou no fim de semana que um calote grego não deveria ser descartado e levou uma bronca pública do ministro das Finanças, Wolfgang Schaeuble, que alegou que ele, Schaeuble, e a chanceler Angela Merkel é que são responsáveis pelos assuntos do euro.
A crise da Europa permanecerá conosco por muito tempo e o que os países precisam saber é como lidar com isso, fazendo a sua política local que reduza os efeitos do impacto.
No Brasil, a lista de tarefas inclui manter a inflação baixa, os gastos públicos sob controle, para que os juros possam ser reduzidos sem impacto inflacionário. O governo tem adiado medidas de ajustes, sob argumento de que em comparação com o mundo estamos bem; e tem recriado políticas de protecionismo explícito. A ideia de adiar o ajuste e fechar o mercado para criar emprego já foi testada aqui no passado e só agravou o problema.
Emprego é um dos desafios atuais, principalmente para os jovens, que sofrem com o desemprego alto no mundo inteiro. No Brasil, está em torno de 14%, num bom momento. A tentação de proteger o mercado nacional para garantir que haja vagas para os trabalhadores de cada país é enorme, mas isso cria mais distorções.
Mas é uma tentação na qual muitos vão cair porque os dados são impressionantes. Na semana passada, a revista "Economist" trouxe como reportagem de capa o tema do desemprego de jovens, que tem sido assunto desta coluna e de notas no blog. A revista inglesa registrou os seguintes dados para o desemprego em geral: 44 milhões são os desempregados do Ocidente, um país do tamanho da Espanha. E por falar nela: a Espanha tem 21% de desemprego, a maior taxa do mundo. Se fossem reunidos numa só cidade, os espanhóis sem trabalho representariam a soma das populações de Madrid e Barcelona. Lá, 46% das pessoas com menos de 25 anos estão desempregadas. Nos Estados Unidos, cuja taxa continua firme em torno de 9%, alta para um mercado de trabalho flexível e dinâmico que reage rapidamente às crises, o total de pessoas procurando emprego é de 14 milhões.
A dor social da crise - e das transformações atuais - se reflete exatamente numa juventude com maior nível de escolaridade mas sem perspectiva de futuro, como a personagem entrevistada pela revista Maria Gil Ulldemolins, que tem um diploma universitário da Inglaterra, está concluindo outro na Espanha, mas afirmou que se qualificou para um mundo que não existe mais. O mundo perdido é o da ideia de que quem estuda muito consegue ter um futuro melhor do que o dos seus pais. É a mola da mobilidade social pela educação. Se isso se quebra, o desalento é assustador.
O futuro esperado que não veio explode hoje em vários lugares. O jovem que se imolou na Tunísia em protesto tinha feito universidade, mas estava sendo achacado por policiais na sua banca de verduras. Se na África isso tem sido, apesar de todos os pesares, uma força renovadora, pode ser a fonte de vários conflitos sociais.
O desemprego de jovens não foi inventado por esta crise, mas num contexto recessivo mundial ele se agrava. Essa é uma das tarefas inescapáveis dos tempos atuais. Talvez a mais crucial.