terça-feira, abril 26, 2011

De volta ao palanque - Raymundo Costa

Valor Econômico - 26/04/2011

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva assumiu de fato o comando
das articulações políticas do PT com vistas às eleições de 2012. Lula
pretende viajar por todo o país, na campanha municipal, mas o
principal objetivo do PT é a capital de São Paulo. É hora, segundo
Lula, de o partido recuperar a prefeitura que os tucanos tomaram em
2004 e mantiveram em 2008, mesmo à custa de sua unidade. O avanço
petista na capital é considerado decisivo para acabar com a hegemonia
do PSDB no Estado, que comemora 20 anos no fim de 2014.

Depois de escolher e eleger presidente uma candidata sem tradição
anterior na política, Lula acha que pode repetir a dose em São Paulo.
Atualmente, ele quer como candidato a prefeito o ministro da Educação,
Fernando Haddad. Mas está acessível às demandas dos aliados e mesmo de
líderes partidários situados até bem pouco tempo na oposição. Este é o
caso de Gilberto Kassab, prefeito de São Paulo e mestre de obras da
organização do PSD. A empreitada entrou em banho-maria, mas é uma
hipótese que não deve ser inteiramente descartada dos cenários para a
eleição municipal de 2012.

Numa entrevista ao jornal "ABCD Maior", de São Bernardo do Campo,
município governado por seu amigo Luiz Marinho, o ex-presidente deu a
receita para a vitória em São Paulo. "Só precisamos montar uma chapa
perfeita. O PT tem de encontrar um vice que dialogue com
representantes do setor médio da sociedade, do pequeno empresariado,
do profissional liberal e pessoas que têm um pouco de cisma do PT." O
ex-presidente usa a palavra no sentido de cismar, desconfiança ou
suspeita - sentimentos de que foi vítima em São Paulo, sobretudo, nas
suas primeiras eleições.

No tabuleiro de Lula cabe até Kassab para derrotar o PSDB

À exceção de 2002, quando ganhou de José Serra desde o primeiro turno,
São Paulo sempre foi uma pedra no sapato do ex-presidente. A vitória
na capital chega a ter alguma coisa de pessoal para Lula. Mas na
avaliação de dirigentes do PT paulista, é mera implicância, pois pouco
ou quase nada resta da imagem do líder radical que inspirava o medo da
classe média paulistana em eleições como a de 1989.

Em 1998, quando enfrentou Fernando Henrique Cardoso no cargo de
presidente, Lula teve - no primeiro turno - 1,3 milhão de votos na
capital; quatro anos depois, na onda vermelha que o elegeu, ele
praticamente dobrou seu eleitorado e contabilizou 2,4 milhões de votos
paulistanos.

Em 2006, Lula ainda conseguiu cravar 2,2 milhões de votos na capital,
numa eleição disputada sob as ondas de ressonância do mensalão e do
escândalo dos aloprados. Isso contra um ex-governador de Estado forte,
como demonstrou o massacre de 3 milhões de votos que o tucano Geraldo
Alckmin impôs de frente sobre Lula na disputa presidencial daquele
ano.

Já o primeiro turno da eleição do ano passado foi um pouco mais suado
para os tucanos. José Serra ganhou de Dilma no Estado por menos de 1
milhão de votos de diferença e a candidata do PT teve 2,5 milhões de
votos na cidade de São Paulo - pouco mais de 100 mil votos que Lula
teve em seu melhor desempenho na cidade, em 2002.

A prova dos nove, para Lula, será a eleição de 2012, na qual está
engajado em tempo integral. Nem sempre no mesmo leito em que navegam
os demais líderes petistas da capital. Na mesma entrevista ao "ABCD
Maior", Lula afirma que costuma dizer que o PT vencerá em São Paulo
quando encontrar o seu José Alencar, numa referência ao que seu
vice-presidente representou nas vitórias em 2002 e 2006 ao juntar
trabalho e capital na mesma chapa.

Convenientemente, Lula "esquece" que a hoje senadora Marta Suplicy se
elegeu prefeita em 2000 na cabeça de uma chapa que tinha como vice o
deputado Rui Falcão, da ala esquerda do PT. É verdade que Marta se
beneficiou do voto antimalufista, no segundo turno, quando recebeu o
apoio inclusive do PSDB. Apesar de uma gestão bem avaliada, Marta
perdeu a reeleição para Serra em 2004, mas está viva no que se refere
à eleição de 2012.

Embora negue publicamente a intenção de concorrer, Marta trabalha
ativamente no bastidor. Quando - e se - definir que será candidata,
ela imediatamente deve receber o apoio de outros nomes do PT. Os
pré-candidatos declarados Jilmar Tatto e Carlos Zarattini apenas
cuidam de manter aquecida a cadeira da senadora. Os cálculos do PT
paulista são feitos entre Marta e Aloizio Mercadante, ex-senador e
atual ministro da Ciência e Tecnologia.

Nos planos do PT paulista estava aguardar por uma definição dos dois,
antes de procurar um "nome novo" para trabalhar. Lula, pelo visto,
quer pegar o atalho. Haddad é o nome, mas não é consenso no PT de São
Paulo. O ministro Alexandre Padilha (Saúde) trata como "inimigo" quem
o considera para a prefeitura. Ele quer "arrumar" a saúde e então
pensar em novos saltos na sua já meteórica carreira.

A ofensiva de Lula, a médio prazo, é tomar o arraial tucano de São
Paulo, sem dúvida o reduto eleitoral mais poderoso do PSDB, seguido de
Minas Gerais. Petistas mais entusiasmados acreditam que o próprio Lula
poderá ser o candidato em 2014, se a reeleição de Dilma estiver bem
encaminhada nacionalmente.

"Não tem como esconder, embora ela não possa e nem deva falar, mas
Dilma será a candidata do PT em 2014", disse Lula na entrevista ao
"ABCD Maior".

Só não disse o que não pode - e nem deve - falar agora: que será
candidato a presidente em 2014, se em algum momento a reeleição de
Dilma Rousseff parecer ameaçada.

O projeto para tomar São Paulo do PSDB passa pela eleição para a
prefeitura da capital, e Lula, embora tenha suas preferências
pessoais, está empenhado em costurar um amplo leque de alianças
políticas. Espectro nem sempre do agrado do PT. O que o ex-presidente
já dá como certo é a aliança preferencial com o PMDB. Ele assegura que
os dois partidos estarão juntos em todos os municípios.

Há outras jogadas menos heterodoxas possíveis no tabuleiro de Lula.
Sem nenhuma "cisma" daqueles até bem pouco tempo postados no campo
adversário, como gosta de dizer o ex-presidente quando defende no PT a
necessidade de reunir os "diferentes" para vencer os "antagônicos"
(leia-se PSDB e o que restar do DEM).

Raymundo Costa é repórter especial de Política, em Brasília. Escreve
às terças-feiras