O Globo
Não foi por acaso que o presidente do Senado, José Sarney, convidou o vice-presidente Michel Temer para participar da instalação da comissão do Senado encarregada de propor uma reforma política. Temer tem grande influência na Câmara e pode ajudar a desobstruir canais quando chegar a hora de negociar os termos da reforma com os deputados, que sempre ficam melindrados quando uma reforma política começa pela definição pelo Senado das regras que os elegem.
Na verdade, o centro da reforma que está sendo discutida é o sistema proporcional de escolha de deputados federais, deputados estaduais e vereadores, considerado por boa parte dos políticos o responsável pela falta de representatividade das bancadas partidárias.
O vice Michel Temer tem uma visão bastante objetiva da questão, acusando o voto proporcional de distorcer o conceito básico da democracia, que é o respeito à vontade da maioria.
Trazendo a discussão para o conceito de regime democrático, o vice abre caminho para uma ampliação do horizonte dos debates, acusando ao mesmo tempo o voto distrital, utilizado na maior parte dos países democráticos desenvolvidos, de apequenar o processo político.
Temer chama a atenção para o fato de que o argumento mais utilizado a favor do voto distrital, o de que ele aproximaria o candidato do eleitor e permitiria uma fiscalização maior de sua atividade, traduz uma visão mesquinha do papel de um deputado federal, que existiria, na sua concepção, não para representar os cidadãos do estado pelo qual foi eleito, mas sim os brasileiros de maneira geral.
Quem representa os estado são os senadores, insiste Temer, para quem o papel do deputado tem dimensão nacional e não regional.
Defensor do chamado "distritão", em que cada estado elege pelo voto majoritário seus representantes para a Câmara, Temer chama de "distritinho" o voto distrital tradicional, que transformaria os deputados em vereadores, subvertendo a função de cada um.
Por esse raciocínio, os vereadores, sim, poderiam ser eleitos pelo voto distrital.
O PSDB, aliás, que apoia o voto distrital, já fez uma proposta, através do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, de implantar o sistema gradativamente, começando pela eleição de vereadores.
O vice Temer considera que o "distritão", ao contrário do que o acusam, vai fortalecer os partidos políticos, pois o candidato eleito estará comprometido com a fidelidade partidária, com seu mandato pertencendo ao partido, como é hoje, ou podendo mudar de legenda apenas seis meses antes das eleições, como está proposto na reforma.
O partido também teria, na sua visão, mais importância na definição dos candidatos, não necessitando sair à cata de tantos nomes para juntar votos na legenda, como acontece agora.
No voto proporcional, a definição de quantas vagas cada partido ocupará na Câmara é feita pelo quociente eleitoral, o número mínimo de votos que um candidato tem que ter para ser eleito.
Na recente eleição, apenas 35 deputados foram eleitos por seus próprios votos, enquanto o restante dos 513 teve a ajuda da soma dos votos de outros candidatos para chegar à Câmara, isto é, apenas cerca de 7% dos candidatos atingiram o quociente eleitoral no país inteiro.
Esse fenômeno, juntamente com as coligações proporcionais, leva a distorções na representação partidária no Congresso.
Um partido que tenha um puxador de votos forte, como foi Enéas no PRONA em 2002, leva para a Câmara deputados com 275 votos, enquanto outro candidato, com mais de 127 mil votos, não se elege porque seu partido não conseguiu atingir a soma de votos suficiente para eleger um deputado.
Esse exemplo é real: em 2002, o candidato Vanderley Assis, do PRONA, foi eleito, enquanto Jorge Tadeu, do PMDB, ficou de fora.
Já as coligações proporcionais, que só existem para ajudar os partidos a aumentar as chances de atingir o quociente eleitoral, podem fazer com que um eleitor do PT acabe ajudando a eleger um candidato do PMN, muitas vezes de ideologia política distinta da que ele queria ver na Câmara.
O voto majoritário acaba com as coligações e também, na opinião de Temer, com a necessidade de procurar puxadores de votos do tipo Tiririca.
Esses, aliás, seriam rejeitados pelos partidos, pois ocupariam uma vaga dos políticos tradicionais.
E os bons de voto também não levariam no seu rastro candidatos mal votados.
De qualquer maneira, Temer não vê clima no Congresso hoje para aprovar apenas o "distritão" ou o voto em lista fechada, como advoga o PT.
Esta modalidade, por sinal, tem a rejeição da maioria dos políticos, que teme a chamada ditadura partidária, e também da opinião pública, que rejeita a ideia de não votar diretamente em seu preferido.
Há um movimento no Congresso por um acordo pela adoção do "distritão misto" como maneira de conseguir a maioria de apoio.
Para agradar à Câmara, há até a proposta de acabar com o suplente de senador e em seu lugar entrar o deputado mais votado do partido.
Não parece muito lógico, mas tudo é possível , principalmente não acontecer nada.
A informação de que o governo retomou os estudos da reforma previdenciária e estaria disposto a definir uma idade mínima para a aposentadoria - 65 anos para homens e 60 para mulheres - é um bom sinal.
Ainda mais se também enviar para o Congresso a regulamentação da previdência complementar do serviço público.