sexta-feira, junho 25, 2010

MÍRIAM LEITÃO Sinais conflitantes



O Globo - 25/06/2010

Os países mais poderosos do mundo vão se reunir neste fim de semana em Toronto diante de vários sinais conflitantes. Os Estados Unidos temem retirar os estímulos fiscais pelo risco de nova recessão. A Europa está cortando gastos com medo de que o endividamento dos países resulte em calote, o que abalaria os bancos. A China dá sinais ambivalentes sobre o seu câmbio.

Em entrevista no programa desta semana na GloboNews, a economista Monica de Bolle, da Galanto Consultoria, e o consultor Rodrigo Tavares Maciel, da Strategus, disseram que não acreditam numa valorização grande do yuan.

Eles concordam que é uma volta à política de 2005-2008, mas acham que a mudança será ainda mais lenta.

O medo americano é abortar a recuperação se retirar completamente os estímulos.

De acordo com análise do Bank of America Merrill Lynch, os incentivos dados por George Bush e Barack Obama já estão perdendo efeito. Pelas contas do banco, o pacote de US$ 800 bilhões de Obama deixará de ter influência positiva sobre o PIB este ano.

Em 2009 ele contribuiu com uma alta de 1,6%. Ao mesmo tempo, o programa de corte de impostos aprovado por Bush, se não for prorrogado, pode comprometer em 1,3% o PIB do ano que vem. O banco avalia que um aperto fiscal aumentará as chances de uma nova recessão mundial.

“Continuamos projetando uma recuperação moderada da economia mundial no ano que vem, mesmo que as políticas fiscais endureçam. Entretanto, o risco de um duplo mergulho no próximo ano está maior”, afirma.

O receio da União Europeia, e principalmente da Alemanha, é de que o endividamento dos países leve a reestruturações de dívidas que comprometam o sistema financeiro europeu. Relatório do BIS este mês revelou que bancos alemães e franceses possuíam exposição de quase US$ 1 trilhão em países como Grécia, Irlanda, Portugal e Espanha. Por isso, a líder alemã, Angela Merkel, está intransigente em relação à proposta de Obama para que os estímulos à economia mundial sejam mantidos.

— Obama pode se dar ao luxo de não fazer ajustes fiscais porque possui moeda própria, mas os países europeus têm moeda comum e isso deixa a Zona do Euro mais engessada. Não há espaço para novos estímulos fiscais em países como Alemanha, França, Inglaterra, Itália, Espanha. Obama está falando sozinho — disse Monica de Bolle.

Na terça-feira, o governo britânico anunciou corte de 25% nos gastos públicos para os próximos quatro anos e uma série de aumento de impostos.

É o maior aperto desde a era Margaret Thatcher. O objetivo é reduzir o déficit público recorde de 10,1% do PIB para 1,1% nos próximos cinco anos. No início do mês, a Alemanha disse que fará cortes de C 80 bilhões. A França afirmou que pode ir além da meta de reduzir de 8% para 3% o déficit em 2013.

O déficit da Zona do Euro é menor que o americano: 6,3% na média dos países europeus, no ano passado, contra 9,9%. Por outro lado, o crescimento americano foi menos afetado pela crise. Durante a recessão, a economia americana caiu 3,8%; enquanto a da Zona do Euro recuou 5,3%.

Nos três primeiros trimestres de recuperação, enquanto os EUA cresceram a uma taxa anualizada de 3,5%, os europeus só cresceram 1%.

O problema, segundo Alex Agostini, da Austin Rating, é que a Europa precisa garantir um crescimento sustentado no médio e longo prazo, e não apenas no curtíssimo prazo, que seria o crescimento turbinado por pacotes fiscais.

Ele acha que o discurso de Obama tem foco interno, voltado para as eleições no Congresso, de meio de mandato.

— A preocupação da Alemanha faz sentido porque em caso de problema é ela quem vai pagar a conta, que é o país mais rico. O entrelaçamento é muito alto no bloco, todos são interdependentes. O que a Europa precisa é de ajustes que garantam o crescimento nos próximos anos. O Japão do pós-guerra teve que sacrificar duas gerações para garantir o futuro. Isso também terá que acontecer na Europa — disse Agostini.

Os momentos de aparente tranquilidade nas bolsas podem ser explicados pelo gráfico abaixo. Ele mostra a quantidade de dinheiro que o Banco Central americano colocou no mercado para combater a crise financeira. A liquidez saltou de US$ 800 bilhões, antes da crise, para US$ 2,3 trilhões no final de 2008.

Agora, está em US$ 1,9 trilhão.

Em dias de ausência de notícias ruins, esse dinheiro queima na mão e os investidores aumentam o apetite por ativos de risco.