O ESTADO DE SÃO PAULO - 22/02/10
A portas fechadas, longe dos holofotes e do discurso eleitoral, os petistas que tratam dos problemas da Saúde temem o confronto entre a candidata Dilma Rousseff e o tucano José Serra, governador de São Paulo.
Menos de uma hora depois de o 4º Congresso Nacional do PT aprovar o projeto de governo para a candidata à Presidência, na última sexta-feira, 19, a reportagem do estadao.com.br flagrou uma reunião em que um grupo de petistas revelou temor pela fragilidade com que Dilma discute a Saúde e pela "vulnerabilidade" como estão entrando no debate eleitoral. O programa aprovado, afirmaram, "não vale quase nada".
Reunidos numa sala do segundo andar do Centro de Convenções Ulysses Guimarães, em Brasília, membros do grupo setorial de Saúde do partido queixaram-se da gestão da área no governo Lula e fizeram uma série de comentários críticos à ministra-chefe da Casa Civil. "Quem é a Dilma para nós, do ponto de vista da militância? Não podemos entrar na campanha vulneráveis como a gente está na Saúde", questionou uma das militantes.
Participaram do encontro - que foi gravado pela reportagem -, o ex-ministro da Saúde Humberto Costa (PE), o secretário de Gestão Estratégica e Participava da atual equipe do ministério, Antônio Alves de Souza, e dirigentes de todo o País.
Uma dirigente disse que ficou espantada com a falta de habilidade da pré-candidata durante um debate: "Ela entrou recuada para discutir política social na saúde. Foi um horror. Se o nosso presidente era muito verde quando entrou (para o Planalto), imagina a Dilma! Ela vai ser questionada e vai ter de falar sobre o assunto a partir de abril", acrescentou um dos participantes do encontro de sexta-feira.
"Precisamos nos organizar para influenciar nesse processo. Temos de ganhar a nossa candidata, que não tem o que o nosso presidente tem", afirmou Humberto Costa, que dirigiu a pasta da Saúde entre 2003 e 2005, na primeiro mandato do governo Lula. Parte da preocupação dos petistas deve-se a três fatos: a falta de intimidade da candidata com o setor, o fato de José Serra ter sido ministro da Saúde entre 1998-2002, e porque até hoje a gestão do tucano é uma das mais bem avaliadas.
A capacidade administrativa da ministra na área foi muito questionada durante o encontro. "O José Temporão (ministro da Saúde) já ficou quatro horas conversando sobre saúde com a Dilma", disse um dos participantes. Nem o plano de governo foi poupado: "Acho que não preciso dizer para todo mundo aqui que isso que aprovaram há pouco não vale nada. Esse programa só vai ficar pronto mesmo lá por agosto. Esse encontro é para agradar a militância", avaliou outro dos participantes da reunião.
A distância entre o ministério e o partido é outro motivo de preocupação: "Precisamos marcar encontro com ela e com Lula. O presidente vai sair com essa dívida conosco? Como vamos fazer a discussão do setor da saúde com quem não é do PT se não reconhecemos nossos méritos?". "É essa discussão que temos de fazer, porque o Lula tá pouco se lixando para a gente (petistas)", disse uma filiada. "Acho que a Dilma não representa, nem de perto, o governo Lula."
Para o grupo, o PT não pode entrar na campanha vulnerável como está na Saúde. "É contraditório. Vamos ter de apresentar à população que esses oito anos não significam o que a gente quer de saúde para o Brasil". O histórico de Serra à frente da pasta também foi mencionado. "Serra tem discurso real, (diz) que foi o responsável pela aprovação da Emenda 29 e que não conseguimos regulamentar. Todo mundo acha que ele é o papa da Saúde e tem companheiros que até concordam com isso. Bobagem. Fizemos muito mais, não dá para comparar".
Alguns admitiram que o governo deveria ter aceitado a participação das Organizações Sociais (OS) na gestão de hospitais - o PT costuma dizer que isso é "terceirizar a Saúde". "Eu não quero uma UPA na minha cidade. De que adianta se não consigo pagar os médicos?", disse um secretário. As UPAs, Unidades de Pronto Atendimento, são uma forma de o governo do Rio agilizar o atendimento nas comunidades carentes, longe dos grandes centros hospitalares.
O Fundo de Participação dos Municípios (FPM) também foi criticado: "Essa história de a receita que vem do governo ser a mesma para todos é uma furada. Tem uma cidade ao lado da minha que tem ambulância, estrutura. Eu não tenho dinheiro para nada e ainda vejo prefeito desviando a verba."
Questionado sobre a insatisfação em relação à falta de propostas específicas do programa e condução do assunto pelo partido, o novo presidente do PT, José Eduardo Dutra, negou problemas. "Isso não procede. É comum que alguns termos não sejam especificados e fiquem de fora. Tivemos reclamações de todos os setoriais".