O Estado de S. Paulo - 28/02/2010
Enquanto países de alta renda, especialmente os Estados Unidos, afundam em seus próprios rombos, desta vez o Brasil está relativamente bem na foto como a tabela está mostrando. E isso tem boas consequências políticas.
Os resultados das contas públicas divulgados na semana passada pelo Banco Central apontaram para um excelente janeiro, o melhor resultado em 15 meses, quando foi apurado um superávit primário (antes de deduzidas as despesas com juros) de R$ 2,2 bilhões.
Por algumas razões, não é ainda um resultado que garante a meta prometida de um superávit de 3,3% do PIB (cerca de R$ 115 bilhões ao final do ano).
Basta pinçar duas dessas razões. Primeira, o governo empurrou para fevereiro e março despesas que, em princípio, teria em janeiro e esse procedimento dificilmente poderá se repetir.
E, segundo, este é o último ano da administração Lula, circunstância que torna mais complicado o controle sobre a máquina gastadeira de sempre.
O superávit primário, mesmo num país de enormes necessidades sociais e carente de investimentos, não é capricho de economistas turrões. Não é só a melhor maneira de pavimentar a economia em direção ao crescimento futuro, da produção e do emprego. É também a melhor condição para que um governo possa conduzir suas políticas.
Embora a atual administração fiscal do governo federal esteja cheia de buracos por onde se perdem os recursos públicos, neste particular a situação do Brasil é bem mais confortável do que era há alguns anos e especialmente melhor do que a de um grande número de países que eram apontados como paradigmas de boa administração.
Um dos principais fatores pelos quais o presidente Obama vem tendo tanta oposição para aprovar seu projeto de universalização dos planos de saúde é o rombo fiscal do governo federal projetado para 2010, de 10,7% do PIB, e o crescimento insustentável da dívida pública, que vai para 65,2% do PIB.
Grécia, Portugal, Espanha, Irlanda, Reino Unido e Itália estão com suas finanças vulneráveis e sujeitas a enormes ataques de predadores porque gastaram demais, endividaram-se demais e agora têm suas gestões públicas paralisadas pela crise.
Houve um tempo em que, no Brasil, a austeridade fiscal era considerada imposição dos países centrais e do Fundo Monetário Internacional (FMI). Ou, então, um objetivo inútil e politicamente descabido. Em 1986, por exemplo, o presidente José Sarney pôs a perder a estabilização temporária obtida pelo Plano Cruzado porque acreditou mais em mágicas e no voluntarismo do controle artificial de preços do que na disciplina fiscal sugerida por seus assessores. No ano seguinte, o País já estava quebrado, decretou a moratória, ficou patinando e não se reergueu a não ser em 1994, com o Plano Real.
Pela primeira vez depois de tantos anos de vida dura e complicações de todo tipo, a sociedade brasileira (e não só o governo) está em condições de perceber que a preservação do equilíbrio orçamentário não é um capricho de ortodoxos; é o único caminho que garante independência e o pleno exercício do poder. E, contra a mentalidade de tantos gastadores, é também precondição para o sucesso eleitoral duradouro.