sexta-feira, janeiro 29, 2010

Luiz Garcia - Aposentados em Brasília


O Globo - 29/01/2010
 

Mandato parlamentar é emprego? Representação partidária é profissão? Com certeza, não. Um cidadão pode passar toda a sua vida útil fazendo política, sendo sustentado por seu partido, por dinheiro próprio ou alguma atividade não política que o ocupe nas horas vagas. E que deve ser informada ao eleitor. Ele tem o direito de saber que seu deputado ou senador, por exemplo, tem mesada de alguma empresa da família, e decidir, se for o caso, que isso não prejudica o espírito público e a dedicação com que, presumese, o representante exerce o mandato.

Mas mandato de senador, deputado ou vereador não é emprego, e sim exercício de função política. Não é por acaso que a remuneração dos representantes tem o nome de subsídio. Ou seja, ajuda de custos. Nem foi sem razão que, em 1999, extinguiu-se o Instituto de Previdência dos Congressistas. No entanto, curiosamente — ou inevitavelmente, diriam os cínicos — o fim do órgão não representou a aposentadoria, digamos assim, das pensões.

Um levantamento do vigilante "Congresso em Foco" mostrou outro dia que este ano vamos pagar um total de R$ 87 milhões (R$ 71 milhões na Câmara e o resto no Senado) em remuneração de exparlamentares, dependentes e servidores associados ao extinto IPC. São beneficiados 550 ex-deputados, 80 ex-senadores e cerca de 600 viúvas de parlamentares falecidos.

No lugar do IPC, criou-se o menos discutível Plano de Seguridade Social dos Congressistas, que garante uma pensão mensal de R$ 16.500 ao parlamentar com 60 anos de idade e 35 de mandato. Diferentemente do que acontecia com o IPC, a pensão não pode ser acumulada com qualquer outro benefício pago pelo Estado.

Como não é escandalosamente generoso como o IPC, só aderiram ao novo plano 160 dos 513 deputados federais. Ou seja: lamentavelmente, o pessoal gostava muito mais do sistema anterior.

O que não é nada bom: define a situação do congressista como algo muito próximo de uma relação de emprego. Não que esta sugira, por si mesma, qualquer relaxamento da postura ética: a grande diferença está na perda de ênfase no caráter representativo do mandato parlamentar. Senadores e deputados não estão no Congresso, pelo menos em princípio, para cuidar de seus próprios interesses: são eleitos para agir exclusivamente em nome de quem os elegeu. Têm mandato, não emprego.

Se precisam garantir tranquilidade na velhice — e é o que acontece com políticos honestos, sem fortuna de família — cabe às organizações partidárias montar planos de previdência privada. É problema dos partidos, não dos poderes públicos. Muito menos, do bolso do eleitor.