FOLHA DE S. PAULO
A crise que atingiu os partidos e o Congresso criou condições para mudanças radicais
Os graves escândalos que têm abalado a vida política nacional não podem ser explicados como resultado apenas de desvios de conduta de alguns políticos, mas, sim, como resultado de causas mais complexas, de um processo de deterioração dos valores políticos e éticos que vem de longe.
Na verdade, a conjunção de diversos fatores, somados ao baixo nível moral dos atores da cena política, levou ao afrouxamento de certos princípios fundamentais que devem nortear a ação daqueles que se pretendem representantes do povo. As causas desse afrouxamento serão muitas, tantas que não me acho capaz de identificá-las, mas é inegável que elas atuaram e atuam não apenas no Congresso mas igualmente em todas as áreas em que se desenvolve a ação política. A sensação é de que os políticos, na sua maioria, em vez de servirem à sociedade, optaram por dela se servirem para granjear poder e riqueza.
A perda de valores e princípios, que devem reger a atividade dos políticos, levou-os a apagar os limites entre o interesse público e o privado, tornando-se uma espécie de casta que se apossou da máquina do Estado e a pôs a funcionar em seu próprio benefício.
Essa perda da consciência ética, do compromisso com o povo -que deve nortear toda a atividade política-, contaminou em maior ou menor grau todos os partidos, como o demonstram as denúncias feitas, comprovadas e até mesmo admitidas por quem tergiversou. Das altas falcatruas aos pequenos deslizes, tudo indica que a perda dos valores é mais ampla e grave do que poderia parecer inicialmente.
Como disse, diagnosticar todas as causas desse fenômeno é praticamente impossível, mas uma delas, certamente, é o financiamento das campanhas eleitorais por empresas ou empresários, que passam a influir diretamente nas decisões do legislador e do governante, em detrimento do interesse público. Em lugar de voltar-se para a solução dos problemas, o que determinaria a melhora nas condições de vida da população, o político atua para atender aos interesses da empresa que lhe financiou a campanha. Isso quando não transforma o próprio empresário em seu vice -quando se trata de um governador ou senador-, que, depois, lhe ocupa o lugar, sem ter recebido nem um voto sequer, sem que ninguém o conheça.
Mas há exemplos mais graves, como a aprovação de leis que beneficiam grupos econômicos em prejuízo do interesse da grande maioria do povo. Isso é coisa sabida e já houve mesmo quem tentasse mudar essas leis, o que é praticamente impossível, já que quem poderia fazê-lo são exatamente aqueles que se beneficiam dessa situação. Esses problemas, como muitos outros que exigem a reforma da legislação, não serão resolvidos se a cidadania não obrigar os políticos a resolvê-los.
A coisa, como se vê, não é simples, porque, como disse aquele deputado pilantra que estava se lixando para a opinião pública, pode a imprensa dizer dele o que disser, e seu eleitorado continuará a elegê-lo. Sim, porque, no Brasil, o nível de consciência política ainda é muito baixo, e isso facilita a ação dos demagogos.
De qualquer modo, é preciso fazer alguma coisa, e este é o momento certo para fazê-lo.
Se há políticos safados, há também os honestos, conscientes de seu compromisso com a cidadania. E há de havê-los em todos os partidos. E, se isso é verdade, por que não se unem, por cima dos partidos, se for o caso, para mudar a situação e reorientar a vida política?
Estou certo de que a própria crise que vivemos torna possível a mudança. E os políticos, com raras exceções, desejam e necessitam do respeito e da confiança do eleitor.
Dialeticamente, a crise moral que atingiu os partidos e o próprio Congresso Nacional criou, ao mesmo tempo, as condições propícias a mudanças radicais. Paremos para refletir: se nada for feito, continuaremos todos nas mãos dos pilantras, já que a democracia não pode existir sem a atividade política, nem a própria sociedade sem legisladores e governantes que a ela se dediquem.
É hora de os políticos honestos e idealistas despertarem para esta verdade: uma grande causa nos ajuda a viver porque dá sentido a nossa vida. Ninguém perde nada em lutar por um país melhor, e o sacrifício que faça pouco significará diante da felicidade de respeitar-se a si mesmo e de ter o respeito dos demais. Só os calhordas não entendem isso.
Ih, desconfio que escrevi um manifesto!
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Lula já usa palavrão nos discursos. Quanto mais sobe no Ibope, mais à vontade ele se sente para mostrar quem de fato é.