sexta-feira, outubro 31, 2008

VINICIUS TORRES FREIRE O porrete e o tapinha do BC




Governo vai tirar dinheiro de banco que não emprestar o compulsório liberado. É um tapinha, mas não é solução


"O BC FEZ isso para que os bancos emprestem. Se os caras não emprestarem, toma de volta. Faz um compulsório diferenciado para os que cumprem as regras e eleva para os que não emprestarem", dizia a economia Maria da Conceição Tavares, no dia 17, a respeito da relutância dos bancos em emprestar o dinheiro que o BC liberara de seus cofres. Isto é, aquela parcela do dinheiro depositado e aplicado em bancos mas recolhida pelo BC a fim de, em tese, controlar o excesso de moeda na praça, o chamado compulsório.
"O BC deve agir com um porrete", dizia Conceição, madrinha dos "desenvolvimentistas". Bem, o BC agiu ontem com um porrete. Bancos que não usarem dinheiro liberado pelo BC para irrigar a praça com crédito vão perder uma quantia razoável. O porrete não chega a ser do tamanho de um bastão de beisebol nem de uma borduna, para ser nacionalista. Mas vale bem uma palmatória, um tapinha que dói e que havia sido preanunciado pelo governo. Na Índia, no dia 15, Lula ameaçara "tomar de volta" tal dinheiro. No dia 19, o ministro Paulo Bernardo praticamente antecipara a medida à repórter Sheila D'Amorim, desta Folha. O BC havia permitido que os bancos deixassem de recolher 70% do compulsório sobre depósitos a prazo desde que usassem o dinheiro para irrigar o mercado (um CDB é um depósito a prazo). O dinheiro deveria ser dirigido para a compra de empréstimos concedidos por bancos menores, de títulos de empresas e recebíveis (crédito a receber, direitos creditórios) que estivessem em fundos de investimento. Era uma mãozinha indireta para desafogar o crédito para empresas e para dar água a fundos de investimento que sangravam.
Segundo o último dado oficial disponível, do dia 24, os bancos deixavam no BC uns R$ 42 bilhões de compulsório sobre depósitos a prazo. O dinheiro era remunerado pelo BC por uma taxa equivalente à Selic (os bancos depositavam títulos federais, não dinheiro). Agora, 70% do depósito será em dinheiro, sem remuneração. Fica parado, sem render, a menos que os bancos utilizem tais fundos para aquelas finalidades definidas pelo BC. Quanto os bancos "perderão" se deixarem o dinheiro parado por um ano? Se a remuneração fosse equivalente à taxa média do CDB (num chute ponderado), deveria dar uns 11% ao ano (o custo médio de remuneração de todo o compulsório está em torno de 8%, conta que inclui compulsórios não remunerados). Ou seja, uns R$ 3 bilhões por ano, no caso extremo. Uma mordida, mas não um desastre.
É "intervenção dirigista no mercado"? É. Os bancos não estão emprestando dinheiro por "maldade"? Não, pois banco não rasga dinheiro. Se não emprestam é porque temem perder, pois a praça está confusa, empresas perderam muito com os derivativos malucos (oferecidos pelos bancos) e vem desaquecimento econômico forte pela frente. Mas entre a cautela e a cautela excessiva ou até malandra há espaço para uma cutucada governamental. Foi isso que o governo fez. Nem é um deus nos acuda nem solução para o crédito -para compensar a perda, os bancos podem elevar juros. É só um tapinha.