sábado, setembro 27, 2008

Dicionário da crise

Especial ABC das finanças
O dicionário da crise

Alguns termos em inglês, idioma oficial do mundo das
finanças, têm tradução satisfatória para o português. Outros 
nem tanto. Para entender a crise, é bom conhecer todos


Cláudio Gradilone

Alavancagem – É a operação em que bancos de investimento fazem apostas no mercado cujo valor é até quarenta vezes seu patrimônio – quando o limite máximo de segurança recomendado internacionalmente é doze vezes (12:1). A fórmula mais simples de medi-la é L = D / E, em que L é leverage (alavancagem), D édebt (dívida) e E é equity (patrimônio).

Bail-out – Pronuncia-se "beil aut". É o socorro financeiro que o governo dá a empresas falidas ou a setores inteiros da economia – no caso atual, o financeiro. Começou a ser usado em economia nos anos 50. Antes se referia principalmente ao ato de o piloto de caça acionar os foguetes que ejetam seu assento quando o avião é abatido (foto abaixo)– ele se salva, mas Deus sabe onde cairão os destroços em chamas. O paralelo com o pacote de salvação do governo americano é imediato: os ousados pilotos financeiros vão se salvar, mas os destroços cairão na cabeça dos contribuintes mais sensatos e que se recusaram a entrar na ciranda de Wall Street.

Bennie Davis/AP

Banco comercial – Sua atividade básica é captar dinheiro mais barato de quem tem, emprestar mais caro para quem precisa e ainda cobrar uma taxa pela operação. É mais seguro, mais controlado e mais tedioso, e paga aos seus ases bônus anuais muito menores do que os pagos pelos bancos de investimento. Morgan Stanley e Goldman Sachs, os dois mais reputados bancos de investimento dos Estados Unidos, viraram bancos comerciais para tentar escapar da crise.

Banco de investimento  É a variedade selvagem do banco comercial. Capta dinheiro de pessoas e empresas, mas ganha dinheiro mesmo fazendo investimentos ousados no mercado. É alavancado (veja o verbete alavancagem) e, por isso, mais arriscado. Não deve sobreviver ao terremoto de Wall Street. Um banqueiro de investimento com quinze anos de casa e salário de 300 000 dólares por ano podia ganhar bônus anuais de 3 milhões de dólares.

Bankruptcy – Em português, é falência ou bancarrota, e seu significado é o mesmo. Refere-se à incapacidade de um banco ou uma empresa de pagar seus credores, o que leva à interrupção das atividades. Bankruptcy e bancarrota têm origem comum nas palavras latinas bancus(banco) e ruptus (quebrado) e se referiam ao hábito dos comerciantes da Idade Média de quebrar a loja do comerciante que dava o cano no mercado.

Credit Default Swap (CDS) – Instrumento financeiro muito arriscado lançado pelos bancos americanos e europeus para se proteger da inadimplência. Um banco que emprestou muito dinheiro para uma empresa recorre a outro banco e "troca" (swap, em inglês) parte do seu direito de receber por uma garantia. O duro é descobrir que essa garantia também se evaporou, como agora nos Estados Unidos.

Chapter 11 – É o capítulo 11 do Código de Falência dos Estados Unidos, cujo equivalente no Brasil é a recuperação judicial. Menos grave que a falência, permite que a empresa (ou pessoa física) se recupere e pague os credores. O processo de recuperação é supervisionado por um dos tribunais de falências.

Depressão – Situação de grave crise econômica, em que o crédito desaparece, o desemprego explode, as falências se multiplicam, o comércio internacional e o investimento encolhem e as moedas se desvalorizam por longos períodos. Uma depressão é uma forma grave de recessão.

Derivativos – Instrumentos financeiros que servem para diluir o risco de um investidor. É mais ou menos como pagar alguém (um especulador) para correr riscos em seu lugar em troca de uma remuneração. Tornaram-se tão complexos a ponto de ninguém saber exatamente com quem está o risco. Difícil mentalizar? Imagine uma família tão heterodoxa a ponto de alguém descobrir que é seu próprio avô.

Desalavancagem – É o processo de diminuir a relação D / E, em geral aumentando o patrimônio (E), mas também diminuindo a dívida (D) – veja o gráfico de um exemplo real, o da Goldman Sachs.

Federal Deposit Insurance Corporation (FDIC) – Seguradora Federal de Depósitos. É uma estatal americana encarregada de defender o dinheiro dos pequenos poupadores das peraltices dos banqueiros. Quando um banco quebra, os depósitos até 250 000 dólares estão protegidos.

Federal Reserve (Fed) – O Sistema Federal de Reservas (Federal Reserve System, mais conhecido como Fed) é o banco central dos Estados Unidos. Seu dever principal é garantir o valor do dólar controlando a inflação, mas nas duas últimas semanas o Fed concentrou-se em salvar o sistema bancário.

Foreclosure – É o despejo de um comprador inadimplente de imóvel, algo muito mais fácil nos Estados Unidos que no Brasil. O vendedor encerra unilateralmente o contrato de compra e venda antes do prazo (foreclose) e despeja o morador.

Bennie Davis/Erin Siega/Reuters

Hedge funds – São fundos que diversificam investimentos e fazem pesadas apostas em ações, títulos de dívida, matérias-primas básicas, as commodities, moedas e até ouro, jóias e obras de arte de modo a ganhar com as oscilações relativas de preços. O nome é quase uma ironia porque quem busca hedge (proteção, em inglês) quer segurança, algo que esses fundos têm estado muito longe de oferecer.

Mortgage – É a hipoteca, um empréstimo garantido por um imóvel. As hipotecas foram o principal produtor de riqueza financeira dos Estados Unidos. Com 1 trilhão de dólares de hipotecas, os bancos criaram, por meio de derivativos e outros instrumentos financeiros, cerca de 10 trilhões de dólares (mais ou menos dez PIBs do Brasil) por ano.

Panic selling – É o movimento irracional de venda que ocorre quando os investidores entram em pânico e acham que as cotações vão cair muito. Por isso vendem o que possuem a qualquer preço. Bom momento para os grandes investidores (carinhosamente chamados de "tubarões") ganharem dinheiro comprando ações de boas empresas muito barato. O movimento contrário é chamado de panic buying, a compra irracional.

Recessão – Uma situação em que a atividade econômica diminui seu ritmo por um período (para alguns economistas, mais de três trimestres consecutivos). Uma recessão é menos grave do que uma depressão.

Securitização – Emissão de títulos garantidos por um fluxo de pagamentos que ainda será recebido –.ou seja, uma dívida. O emissor desses títulos (em inglês, securities, daí o termo securitization) antecipa os recursos vendendo os papéis para investidores. A crise explodiu quando muitas dívidas não foram pagas e o sistema se convenceu de que muitas outras também não seriam.

Subprime – A atual situação caótica dos mercados será conhecida para sempre como a Crise do Subprime. Prime (pronuncia-se "praime"é o título emitido por um devedor com vontade e capacidade de pagar sua dívida. Subprime é o contrário. A malandragem que deu a confusão toda foi justamente empacotar títulos prime junto com subprime e usá-los no processo de securitização com ajuda de derivativos – uma versão de alta tecnologia da venda de gato por lebre.

Istockphoto.com

Tesouro – O Departamento do Tesouro é o órgão encarregado de administrar as finanças públicas dos Estados Unidos, mais ou menos a atribuição do Ministério da Fazenda no Brasil. Mais recentemente, virou também o responsável por tributar os pobres para ajudar os bancos.