PANORAMA ECONÔMICO
Se o governo quer é confundir, espantar investidores e derrubar ações da Petrobras, está fazendo um grande trabalho no atabalhoado debate do PréSal! Os investidores estão arrepiados com o aparecimento da idéia da desapropriação. As empresas têm que investir agora. Cada campo precisa de mais três a quatro perfurações para avaliar o potencial de exploração, e cada furo custa US$ 100 milhões.
Se os investimentos não forem feitos agora, não haverá respostas para dúvidas técnicas, nem mesmo se saberá a real dimensão das jazidas. A notícia dada pelo GLOBO de sábado de que o governo chegou a discutir a desapropriação dos campos já licitados é um terremoto. O governo tentou, ainda no fim de semana, recolher o que o ministro Edison Lobão havia dito confirmando a notícia.
“Será uma desapropriação justa. Não é justo é que uma empresa chupe o petróleo que também é da União.” O efeito corrosivo desta palavra, desapropriação, espalha-se para além das jazidas de petróleo. Os avanços dos últimos anos, o investment grade, o investimento direto estrangeiro, a queda do risco, tudo isso foi conseguido lentamente com a confirmação, no diaadia, de que o Brasil respeita regras do jogo e não fará as maluquices que são feitas na Venezuela, por exemplo. Como me disse hoje um investidor da área produtiva no Brasil: — Quem desapropria um campo de petróleo, desapropria um banco, uma mineradora, qualquer coisa. E o que soubemos é que uma desapropriação foi cogitada numa reunião interministerial.
Há muita coisa complexa a ser discutida e definida. Melhor não complicar mais. O governo precisará saber o que dizer, por exemplo, à Petrobras diante da sua proposta de aumento do capital.
A idéia da Petrobras não é receber o aporte de capital da União em dinheiro, como chegou a ser entendido. Ela quer receber isso em reservas de petróleo que estejam nas áreas contíguas às licitadas.
É um debate à parte. É necessário mesmo? É justo com os contribuintes? Como os outros investidores da área de petróleo verão isso? Quanto ao risco, levantado por Lobão, de que “uma empresa chupe o petróleo que é da União”, é simples evitá-lo. Basta fazer o trabalho de unitização das reservas, ou seja, a definição de quanto da jazida cabe a cada bloco, na eventualidade de que o petróleo daquele campo extrapole o bloco licitado.
A unitização já foi feita no Brasil nos campos de Albacora e Albacora Leste, que eram de consórcios diferentes.
Nunca foi feita entre empresas e a União.
Para se saber o tamanho das reservas e se elas vão além dos limites das áreas licitadas, é preciso retomar o trabalho de perfuração. Exxon e Amerada Hess estão se preparando para perfurar, em setembro, outra área, ao sul de Carioca e Guará e ao lado de Caramba. A informação desse furo será fundamental para a questão se os campos se interconectam ou não. Tupi tem dois poços perfurados. Outros campos como Carioca, Guará, Parati, Bem-Te-Vi precisam de dois ou três novos poços para se confirmarem os dados sísmicos.
Neste exato e delicado momento, inicia essa confusão mental vinda de Brasília, deixando os investidores com os nervos à flor da pele e uma insegurança sobre a estabilidade de regras no Brasil, a qual pensavam que não ocorreria mais. Para completar o desastre, a palavra-fantasma é pronunciada: “desapropriação”.
— Isso seria o desastre do Brasil no momento em que o país mais precisa de aporte de recursos — disseme ontem um executivo do setor de petróleo.
Justamente quando o país precisa de, pelo menos, US$ 600 bilhões para conseguir transformar toda essa riqueza em fato concreto e palpável, o fantasma da quebra de contratos e da violência, muito comum em certos países vizinhos, reaparece. A palavra irresponsabilidade é a mais suave que consigo encontrar para definir esse tipo de proposta.
— O Brasil precisa atrair competência em todas as áreas: tecnológica, financeira, de recursos humanos, industrial — concluiu o executivo.
Levará de seis a oito anos para o governo colher os frutos desse petróleo. Na melhor das hipóteses, a produção começará em 2014. Se houver um atraso nos investimentos por confusões regulatórias, será mais adiado ainda.
Essa proposta da Petrobras tem que ser bem pensada.
Pela Lei das S.A., o controlador pode fazer um aporte de um bem dentro do escopo da empresa, mas, neste caso, a empresa tem que abrir aos acionistas privados a possibilidade de acompanhar esse aporte de capital. Se eles não acompanharem, vão ter seu capital diluído; se acompanharem, a União disporá de um ativo, mas não terá uma participação maior na empresa.
Pela Constituição, artigo 177, a União é detentora do monopólio do petróleo, mas pode “contratar” empresas para fazer a pesquisa e lavra.
Cabe a dúvida: pode a União dispor de um bem que é de todos os brasileiros e transferir para uma empresa, mesmo sendo uma controlada pelo governo? Nada é simples neste debate, por isso ele não pode continuar sendo feito dessa forma improvisada.
Está na hora de o governo superar o estado de euforia e ter mais sobriedade nesta questão.
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COM DÉBORA THOMÉ